Leonardo Jardim, treinador do Cruzeiro
Leonardo Jardim, treinador do Cruzeiro - Foto: IMAGO

Leonardo Jardim e Rui Duarte: a liderança portuguesa que está a redefinir clubes brasileiros

O futebol brasileiro tem assistido à afirmação de uma nova vaga de treinadores portugueses capazes de transformar clubes não apenas nos resultados, mas na identidade, na organização e na ambição. Há técnicos que chegam para resolver o imediato - e outros que chegam para mudar a estrutura. Leonardo Jardim, no Cruzeiro, e Rui Duarte, no Athletic Club, pertencem claramente à segunda categoria: líderes que unem competência, rigor tático e capacidade de inspirar grupos de trabalho

A trajetória de Leonardo Jardim ajuda a explicar o treinador que é hoje. Nascido na Venezuela, filho de emigrantes portugueses, cresceu entre recomeços e talvez por isso tenha desenvolvido a resiliência e a clareza de processos que sempre o distinguiram. Aos 27 anos já treinava a Camacha e, desde então, construiu um percurso marcante: subidas com Chaves e Beira-Mar, afirmação no SC Braga, impacto imediato no Sporting, semifinal da Champions com o Mónaco, títulos no Al Hilal e no Shabab Al-Ahli, e passagens relevantes no Qatar e nos Emirados. Por onde passou, deixou a mesma assinatura: exigência, organização e coragem para liderar.

Desde fevereiro de 2025, no Cruzeiro, Jardim enfrentou turbulência inicial - eliminação no Mineiro, irregularidade no Brasileirão e na Sul-Americana - mas manteve o que sempre o definiu: serenidade, método e capacidade de ajustar a equipa sem perder identidade. A vitória por 3-0 frente ao Bahia marcou o ponto de viragem e revelou um Cruzeiro com pressão seletiva, linhas compactas, mobilidade ofensiva e equilíbrio entre setores. O que se seguiu foi ainda mais impressionante: candidatura ao título do Brasileirão, eliminação autoritária do Atlético Mineiro na Taça do Brasil e entrada garantida na fase de grupos da Libertadores 2026 após triunfo por 3-0 diante do Corinthians. Kaio Jorge destacou-se como goleador, mas a força do coletivo é a verdadeira marca do trabalho de Jardim.

Mais do que resultados, Leonardo Jardim devolveu ao Cruzeiro orgulho, identidade e uma visão de longo prazo. Rotinas de treino, integração de jovens, valorização da formação e atenção ao bem-estar físico e mental dos jogadores revelam um projeto estruturado e sustentável. O próprio treinador resume essa ambição:

«O Cruzeiro não é equipa para jogar a Sul-Americana. Queríamos a Libertadores, porque o nome do Cruzeiro merece.»

E completou:

«Este grupo conseguiu retomar o orgulho dos cruzeirenses e colocar a equipa no seu devido patamar.»

Rui Duarte, por sua vez, está a escrever no Brasil um dos capítulos mais importantes da sua carreira. Assumiu o Athletic em junho de 2025, primeiro treinador da era Vinícius Júnior, e encontrou um cenário de fragilidade competitiva – penúltimo lugar na Série B - e pressão elevada para evitar a queda à Série C. A missão era ingrata, mas Rui Duarte respondeu com aquilo que melhor o caracteriza: liderança sóbria, leitura tática apurada e capacidade de unir o grupo. Reorganizou a equipa, resgatou confiança e, no último fim-de-semana, garantiu a manutenção na Série B, um feito determinante para estabilizar o projeto e dar início a um plano de crescimento sustentável.

A sua história explica a consistência que hoje transmite. Como jogador, somou mais de 160 jogos na Primeira Liga por Belenenses, Estrela da Amadora e Olhanense, onde foi capitão e campeão da Liga de Honra. Como treinador, conduziu Farense e Trofense à promoção, trabalhou no Casa Pia e subiu dos sub-23 ao comando principal do SC Braga. Rui Duarte chega ao Brasil com método, cultura tática, experiência e, está a provar que tem o perfil certo para liderar projetos em contextos competitivos exigentes.

Tanto Jardim como Duarte são exemplos claros de que o sucesso no futebol moderno nasce de equipas técnicas fortes, multidisciplinares e altamente coordenadas. No Cruzeiro, o modelo de intensidade, posse estruturada e mobilidade ofensiva reflete um laboratório de excelência. No Athletic, o foco no equilíbrio defensivo, na coesão emocional e na resiliência competitiva devolveu identidade e esperança ao clube mineiro. Em ambos os casos, a liderança portuguesa exporta rigor, profissionalismo e capacidade de gerar impacto imediato, mas também estrutural.

E há um denominador comum na ascensão deste contingente português: Hugo Cajuda, o empresário que tem sido peça-chave na projeção internacional dos treinadores lusos. Com três Libertadores no currículo - duas com Abel Ferreira no Palmeiras e uma com Artur Jorge no Botafogo. Mais do que gerir carreiras, Cajuda constrói condições para que treinadores de excelência implementem projetos sólidos, competitivos e sustentáveis.

Em suma, a presença de Leonardo Jardim, Rui Duarte e Abel Ferreira reforça o prestígio da escola portuguesa no Brasil. São treinadores que combinam estratégia, método, humanidade e que, apoiados por uma estrutura de confiança, elevam a fasquia da liderança no futebol sul-americano. A competência nacional está a transformar clubes, potenciar jogadores e, acima de tudo, a redefinir o que significa liderar ao mais alto nível.

«Liderar no Jogo» é a coluna de opinião em abola.pt de Tiago Guadalupe, autor dos livros «Liderator - a Excelência no Desporto», «Maniche 18», «SER Treinador, a conceção de Joel Rocha no futsal», «To be a Coach», «Organizar para Ganhar» e «Manuel Cajuda – o (des)Treinador».