E de repente Portugal virou rubro-negro, a final da Libertadores tornou-se o centro do mundo para o país desportivo, que passou ao lado da jornada da Taça, alimentado pela comunicação social que se mudou de armas e bagagens para o outro lado do Atlântico, numa febre de cobrir um acontecimento internacional ao minuto, que não se via desde o cortejo fúnebre de Ayrton Senna, já lá vão 25 anos.

No centro da ação, um nome, Jorge Jesus, português, nascido há 65 anos na Amadora, que foi capaz de transformar-se não só num treinador de excelência, mas também numa personagem incontornável nos dias que correm. Quando partiu para a aventura no Rio de Janeiro, percebeu-se imediatamente que o desfecho desta nunca conheceria meio termo, ou havia de correr muito bem ou muito mal.  E, independentemente dos méritos do treinador português, o que acabou por ser um conto de fadas poderia ter sido um filme de terror, não tivesse o Flamengo eliminado, de virada, o Emelec. Ora, como não correu muito mal, só podia correr muito bem, e o que se viu no sábado em Lima, um remake do Bayern-Manchester United de 1999, em Barcelona, mostra como nada, nem ninguém, no futebol, pode ser tomado por garantido. Mas não nos dispersemos e regressemos à atenção dispensada em Portugal à saga do Flamengo. O triunfo, deste calibre, de um português no futebol brasileiro é a vingança servida a frio de anos a fio a dizerem que jogávamos de tamancos e com bola quadrada (sem esquecer 1966...); é a suprema ironia, depois de todas as piadas contadas sobre o Manuel e o Joaquim nos últimos cem anos; é um banho de humildade dado a quem sempre se mostrou renitente a abrir-se a conhecimento vindo de fora. Mas é também outras coisas, desde a proximidade que sentimos em relação ao Brasil, à afetividade com que partilhamos a alegria de milhares e milhares de brasileiros que acolhemos, hoje em dia, no nosso País. A vitória do Flamengo na Libertadores, fosse quem fosse o treinador, sempre seria um motivo de satisfação para os portugueses. Com a introdução do fator-Jesus, passou a ser causa de júbilo, traduzido nas audiências altíssimas e na celebração, de norte a sul, da vitória de um treinador como não há (nem houve) outro igual, com defeitos e virtudes mas sempre genuinamente genuíno.