António Nobre e Hjulmand no dérbi da Luz — Foto: IMAGO
António Nobre e Hjulmand no dérbi da Luz — Foto: IMAGO

Hjulmand é o dono do jogo

Não há médio em Portugal com tanto conhecimento do que se passa em campo e com tanta capacidade de agir nos momentos certos para, assim, controlar decisões e emoções de companheiros, adversários e árbitros. Este é o 'Segura a bola', espaço de opinião de Nuno Paralvas

Morten Hjulmand não precisaria que José Mourinho o considerasse intocável para justificar atenção mediática. Joga o suficiente, e muito bem, para que dele não tiremos os olhos — é uma força da natureza, tem um raio de ação enorme, corta linhas de passe, não deixa respirar os adversários, faz faltas quando é necessário e até quando não é preciso, comanda movimentos e posicionamentos da equipa, é mais prático que elegante a entregar a bola, gere a velocidade do ataque, corre que se farta.

Para que não haja dúvidas, deixo claro, desde início, que sou dele admirador desde que chegou ao Sporting (nem vou fingir que o conhecia antes) para se tornar, tão depressa quanto inquestionavelmente, a fundação da equipa bicampeã. Há qualquer coisa nele que me transporta para o compatriota Soren Lerby, que adorava imitar quando corria com a bola pela rua e tentava fintar os meus amigos. Só isso já seria bom.

Talvez seja difícil encontrar alguém que o considere o melhor jogador da equipa, até nesta temporada, quanto mais nas das épocas anteriores marcadas por um fenómeno chamado Gyokeres. Mas Hjulmand, para mim, é apenas a fundação da equipa do Sporting, sobre a qual foi possível construir todo o sucesso.

Mourinho, depois do dérbi, considerou que Hjulmand manda no jogo e faz as faltas que quer. Não foi preciso esperar muito para que alguém espremesse alguns números para ajudar outros a chegar à conclusão de que, afinal, não, Hjulmand não é intocável, menos ainda quando se compara com Otamendi. Junte-se a isso um julgamento barato da intenção de Mourinho a falar sobre o assunto — esconder o empate, por exemplo — e o assunto está resolvido. Até dá para esfregar na cara dos outros. É assunto resolvido sempre para quem quiser.

Hjlumand, em absoluto, não é intocável, ninguém é, até Mourinho, obviamente, sabe. Mas não há médio em Portugal com tanto conhecimento do que se passa em campo e com tanta capacidade de agir nos momentos certos para, assim, controlar decisões e emoções de companheiros, adversários e árbitros.

Objetivamente, Hjulmand tira proveito do relacionamento com os árbitros — pela forma como e quando conversa com ele, como e quando os pressiona, como e quando faz faltas, como e quando faz cara feia ou um sorriso bonito, como e quando faz um gesto agressivo ou conciliador. Não há como ele. E, atenção, não é crítica negativa — é apenas a constatação de ver alguém que sabe jogar o jogo, que percebe o que o jogo lhe pode dar em cada momento e que sabe como espremer tudo o que dele pode tirar. Vai tirando muito porque muitos árbitros em Portugal são fracos. Ignorar isso é que me parece difícil.

Hjulmand é dono do jogo nos momentos certos. É, até, dono dos árbitros às vezes, quando permitem. E nem precisa de ser assim tantas para ter grande influência. O que, na perspectiva do adversário, é irritante. Mas seguramente adorável para quem o tem na equipa. Estou seguro qualquer treinador, mesmo Mourinho, gostaria de tê-lo na respetiva equipa. O mesmo vale para os adeptos.