«Não é tempestade, é mesmo furacão», a crónica do Sporting-Farense

Taça da Liga «Não é tempestade, é mesmo furacão», a crónica do Sporting-Farense

NACIONAL02.11.202323:41

Fenómenos extremos sucedem-se e Gyokeres terá de ser batizado. Leão cada vez mais autoritário porque ele faz dos outros melhores

Os fenómenos extremos do clima estão ordenados por ordem alfabética. Por enquanto vai na letra C, mas haverá o dia em que a letra G terá de ser batizada com o nome de Gyokeres. Mais que uma grande lufada de ar para o futebol português, este sueco é um furacão que promete arrancar as raízes mais profundas de qualquer defesa.

Esta noite, em Alvalade, não foram apenas três golos (o primeiro hat trick pelos leões) apontados ao Farense; foi mais uma demonstração de que com ele toda a equipa cresce em confiança. Porque as suas capacidades físicas convidam os colegas a subirem mais uns metros em campo e, consequentemente, pressionarem os adversários. Em resumo, permite um Sporting muito mais autoritário. 

É certo que tudo está ligado. Gyokeres pôde mais uma vez expressar os seus atributos porque a equipa está sistematizada, respira muita saúde e sente-se muito confortável neste jogo feito de muita largura, variações rápidas de flanco, mobilidade e, acima de tudo, muita intensidade quer na procura de linhas de passe quer na reação à perda da bola. 

Esta última característica esteve bem evidente na nova dupla de médios, feita de dois esquerdinos, com a particularidade de um deles ser Gonçalo Inácio, que já havia experimentado o lugar na pré-época. Numa equipa desconfiada de si mesma, uma adaptação destas poderia representar um engulho, mas não no atual líder do campeonato. O central foi um peixe na água, a fazer lembrar a mutação com sucesso de Miguel Veloso. Adicionalmente (e não numa ordem inferior) assistiu-se ao regresso da melhor versão de Trincão. Confiante, determinado, beneficiou da profundidade e linhas de passe longas que Gyokeres oferece. O primeiro golo nasceu assim, num contra-ataque em que o antigo jogador do Barcelona tirou Artur Jorge com requintes de malvadez e colocou a bola no espaço para a finalização, na passada, do ponta de lança. 

Noutras circunstâncias (e com outros jogadores), a aceleração e passe na hora certa não teria o mesmo desfecho e provavelmente o esquerdino até faria mais contenção, procurando uma tabela ou entrando para dentro, aumentando as probabilidades de perder a bola. Não houve lance mais paradigmático do que este durante o jogo sobre o que é jogar com ou sem Gyokeres — o sueco faz emergir o melhor que há nos outros, no caso um jogador fantasista que beneficia de um referencial que ganhe metros e abra brechas no terreno para lançadores como Trincão ganharem mais objetividade. 

Encher ou não a baliza

Apesar de o jogo ter terminado com seis golos, o resultado não resume a diferença entre duas equipas que tinham proporcionado um ótimo espetáculo na última vez que se encontraram, em Faro (vitória por 3-2 dos verdes e brancos). O Sporting foi sufocante na primeira parte (Israel só tocou na bola aos 38’ para receber um atraso de Matheus Reis) e não deu assim tanto espaço aos algarvios em todo o jogo. Mas em três remates perigosos os leões de Faro fizeram dois golos, com dois potentes remates de Matheus Oliveira (terceiro golo frente à antiga equipa em duas partidas) e Vítor Gonçalves, que apesar de todo o mérito na execução deixam algumas dúvidas sobre a capacidade de Franco Israel ser um daqueles guarda-redes que enche uma baliza. 

Seja como for, e mesmo quando o Farense reduziu para 1-2, nunca o Sporting tremeu, ao contrário de outras ocasiões no passado. Porque, ato contínuo, lançou-se numa torrente ofensiva que teria uma conclusão óbvia: numas vezes a bola bateu nos defesas, noutras no guarda-redes. O 3-1 até nasceu num lance caricato, mas o marcador iria sofrer alterações de uma maneira ou de outra. Com as defesas do opositor já em baixo, ainda houve tempo para o golo que retrata este leão renovado: passe de 40 metros de Pedro Gonçalves para colocar Gyokeres no um para um contra Artur Jorge. É escusado contar o resto: para ele é como se fosse um penálti.