Artur Lara Ramos - Foto: A BOLA/Carlos Vidigal Jr.
Artur Lara Ramos - Foto: A BOLA/Carlos Vidigal Jr.

Há homens que passam pelo desporto. E há outros que ficam no desporto, mesmo depois de partirem. Artur Lara Ramos pertence, de forma inequívoca, ao segundo grupo. Liderou servindo e sendo exemplo. Foi, ao longo de décadas, um desses exemplos silenciosos e decisivos no desporto português, em particular no atletismo, que nas últimas horas se despediu de um dos seus grandes obreiros.

O seu desaparecimento, aos 78 anos, vítima de doença súbita, deixa o desporto português mais pobre, não apenas pela perda de um dirigente, treinador ou professor, mas pela ausência de uma figura estruturante, daquelas que constroem alicerces onde outros mais tarde erguem resultados, medalhas e histórias de sucesso.

Natural do Porto, Artur Lara Ramos viveu o desporto com uma paixão transversal. Foi atleta do FC Porto e do Sporting, num tempo em que representar grandes clubes significava, acima de tudo, compromisso e identidade. Praticou atletismo, mas também ténis de mesa, râguebi, futebol e hóquei em patins, revelando desde cedo uma visão ampla e humanista do fenómeno desportivo, algo que marcaria toda a sua vida.

Licenciado em Educação Física, encontrou no Algarve o território onde viria a deixar a sua marca mais profunda. Professor em várias escolas de Faro e Olhão e, professor universitário em Loulé soube ligar, como poucos, a docência à prática desportiva, a formação académica à formação humana. Para muitos alunos e atletas, foi mais do que um técnico: foi um educador no sentido pleno da palavra.

Como treinador, os resultados falaram por si. Conduziu o Liceu de Faro e a Farauto a múltiplos títulos nacionais e foi determinante no desenvolvimento de atletas como Ezequiel Canário, entre muitos outros que alcançaram patamares elevados a nível nacional e internacional. Mas, mais do que vitórias, deixou método, exigência e valores.

Enquanto dirigente, o seu impacto foi estrutural. Vários mandatos à frente da Associação de Atletismo do Algarve, funções como diretor técnico nacional e selecionador nacional, e um papel decisivo na descentralização do atletismo português. Foi um dos grandes impulsionadores da primeira pista de atletismo fora de Lisboa e do Porto, nas Açoteias, em Albufeira, bem como da pista de Faro, infraestruturas que mudaram definitivamente o mapa da modalidade no país.

Eventos como o Cross Internacional das Amendoeiras e tantas outras provas que ajudaram a projetar o Algarve além-fronteiras são também parte do seu legado. Não por acaso, a Associação de Atletismo do Algarve eternizou o seu nome no circuito regional 'Prof. Artur Lara Ramos', uma homenagem justa em vida, agora carregada de ainda maior significado.

Num tempo em que o desporto vive muitas vezes refém da urgência, do resultado imediato e da espuma mediática, a vida de Artur Lara Ramos recorda-nos algo essencial: o verdadeiro progresso constrói-se com visão, persistência e serviço. O atletismo português deve-lhe muito. O desporto nacional também.

Despedimo-nos de Artur Lara Ramos com tristeza, mas sobretudo com gratidão. Porque os homens que fazem tanto pelo desporto nunca partem verdadeiramente. Permanecem em cada pista, em cada prova, em cada atleta que correu e corre, graças ao caminho que ajudaram a abrir.

Obrigado por tudo, professor.

Sinceras condolências a toda a família.

«Liderar no Jogo» é a coluna de opinião em abola.pt de Tiago Guadalupe, autor dos livros «Liderator - a Excelência no Desporto», «Maniche 18», «SER Treinador, a conceção de Joel Rocha no futsal», «To be a Coach», «Organizar para Ganhar» e «Manuel Cajuda – o (des)Treinador».