Luís Barry pendurou as botas, mas arrependeu-se: «O bichinho é tramado»
Quem não se lembra de Luís Barry? É o 8.º melhor marcador da história da II Liga, com 70 golos em 253 jogos distribuídos por emblemas históricos como Atlético, Oliveirense, Chaves, Aves e Académico de Viseu.
À frente do ponta de lança de 43 anos natural de Corroios estão apenas Bock (71 golos), Platiny (71), Paulo Vida (80), Marcão (82), Artur Jorge (91), Roberto (99) e Jorge Pires (114).
Barry chegou à II Liga em 2011/12, pela mão do Atlético. Nas oito épocas seguintes, manteve-se naquele escalão, onde confessa ter vivido momentos muito especiais: «Os pontos mais altos da minha carreira foram as duas subidas à I Liga, pelo Chaves e Aves.»
Em entrevista a A BOLA, o jogador faz uma retrospetiva da carreira… que ainda não acabou. É verdade. O avançado voltou recentemente ao ativo, aos 43 anos, para jogar no Mangualde, depois de se ter reformado, em dezembro do ano passado, quando estava no Lusitano Vildemoinhos.
«Estava em casa a coçar-me todo e a arreliar-me com a mulher…»
Barry assume que a escolha de se retirar do futebol foi necessária, mas precipitada: «Tinha aceitado o projeto de treinar a equipa B dos sub-19 do Académico de Viseu no campeonato nacional e não estava a conseguir conciliar.»
Mas nem tudo correu bem naquela aventura: «Percebi que não estava tão bem preparado como pensava. Nos sub-19, a exigência e os desafios já eram diferentes. Tive de colmatar essas deficiências que tinha, através de formações e outras coisas que vou fazendo, para estar mais bem preparado para o passo seguinte, que é treinar a sério.»
Entretanto, uma nova época desportiva começou e Barry, que tinha já metido os papéis da reforma, começou a sentir saudades do jogo jogado: «Comecei a ver o pessoal a ir para os jogos e a falar sobre jogos. E eu, ao domingo, em casa a coçar-me todo, às voltas. Arreliava-me com a mulher, a mulher arreliava-se comigo… e eu disse: não, falta-me o balneário e o convívio com o pessoal.»
«O bichinho do futebol é tramado e tive de regressar», contou.
Regresso em grande: «É como se não tivesse parado»
Entre várias propostas, Barry voltou ao futebol pelo porta do Mangualde da 1.ª divisão da AF Viseu. A ajuda do «amigo» Bruno Loureiro, com quem partilhou balneário do Académico de Viseu, foi preciosa: «Fui influenciado pelo Bruno Loureiro. Apresentou-me o clube e, em contacto com a direção e treinador, senti-me acarinhado, gostei do projeto e não estou nada arrependido.»
Quase um ano após a despedida, o ponta de lança voltou no passado mês de novembro. E em grande, com dois golos em quatro jogos. Aos 43 anos vai ganhando forma e minutos de forma gradual: nos dois primeiros confrontos, entrou no decorrer da segunda parte. No terceiro jogo, foi titular e saiu aos 70'. Na última partida, já cumpriu os 90 minutos.
«Estive parado quase um ano e, quando voltei, os níveis físicos não eram os melhores, mas rapidamente adquiri. Agora, apesar da idade, está a correr bem. É como se não tivesse parado. Vim para o Mangualde para marcar golos, adicionar alguma experiência e ajudar o clube a crescer», revelou.
«O objetivo do Mangualde é garantir a manutenção e consolidar-se. É um clube que está a passar por uma reestruturação. Tem uma direção e uma administração nova, com malta jovem que quer potenciar o clube. Vim para ajudar, fazer crescer a estrutura e potenciar os miúdos que estão lá da formação», sublinhou.
Do Alentejo a Trás-os-Montes, sempre com pessoas especiais
Nascido em Corroios em 1982 e agora estabilizado em Viseu, não se pode dizer que Barry seja apenas desses dois lugares. É também de todos os sítios por onde passou, na sua larga carreira de futebolista. E é mesmo isso que o craque afirma levar para a vida: «Do futebol, levamos as pessoas que vamos conhecendo, os sítios por onde vamos passando, as marcas que vamos deixando… Eu comecei a jogar, em criança, no clube da minha terra. Depois percorri o país quase todo. Mas, em todos os sítios por onde passei, do Alentejo a Trás-os-Montes, mantive ligações com pessoas que conheci no futebol.»
«Mesmo passado tantos anos, as pessoas felicitam-me no aniversário, na altura no Natal, por exemplo, mandam sempre uma mensagem ou fazem uma chamada… É mesmo isto que levo do futebol», agradece o jogador que, depois de ter cumprido formação no Corroios e no Vitória de Setúbal, representou, ao longo da sua vasta carreira, 12 clubes de norte a sul: Samouquense, Redondense, Atlético de Reguengos, Lusitano de Évora, Atlético, Oliveirense, Chaves, Aves, Académico de Viseu, Castro Daire, Lusitano Vildemoinhos e Mangualde.
Barry andou sempre rodeado de pessoas especiais, mas, melhor do que isso, andou sempre com os ainda mais especiais atrás: «A minha família sempre me acompanhou. Quando fui para a II Liga, já com quase 29 anos, o meu filho ainda não tinha um ano e a minha esposa fez questão de me acompanhar.»
«Quando fui para o Académico, entrou aquela fase de o miúdo ir para a escola e estabilizámos em Viseu.» Desde então, Luís Barry jogou sempre em clubes daquela zona: de 2019 a 2021, esteve no Castro Daire do Campeonato de Portugal; e, de 2022 até à presente temporada, no Lusitano Vildemoinhos e Mangualde, ambos da distrital de Viseu.
As subidas à I Liga e as saudades de Vítor Oliveira
Barry recordou os tempos de II Liga, onde conseguiu alcançar duas subidas seguidas à I: «Primeiro pelo Chaves em 2015/16, com o mister Vítor Oliveira, que infelizmente já não está entre nós… e, no ano seguinte, com o Aves.»
Sobre o eterno Vítor Oliveira, «que muita falta nos faz», Barry recorda-o como uma pessoa fantástica e verdadeiramente marcante: «Tinha uma excelente relação com o ele. Nomeou-me capitão de equipa no Chaves.»
«Aliás, ele tinha uma relação muito próxima com todos os jogadores. Uma das características do mister Vítor Oliveira era que se notava que gostava e tinha um carinho especial por todos os jogadores. Não é fácil gerir um plantel de II Liga com 20 e tal jogadores, em que muitos não são utilizados. Mesmo assim, não havia ninguém que não gostasse dele», lembra.
«Pessoas como o mister Vítor Oliveira é que fazem falta no futebol português. Não só como treinador, mas como pessoa», considera.
Tal como o ídolo Vítor Oliveira, Barry também quer se treinador de futebol, mas, para já, é dentro das quatro linhas que vai continuar a fazer os adeptos felizes: «Já estou com 43 anos, mas ainda dá para fazer mais uma ou duas épocas. O próximo passo será mesmo ser treinador.»