Festa maior
É verdade que o tempo nos trouxe uma UEFA Champions League mais seletiva e, por isso, cada vez menos democrática. Se formos realistas, o sonho de chegar à final é cada vez mais longínquo para os clubes nacionais, tal a diferença de poder existente.
Enquanto o milagre não se dá, pelo menos fica o orgulho de sermos o país que mais representantes teve no onze inicial do novo campeão europeu. João Neves, Vitinha e Nuno Mendes, aos quais se juntou Gonçalo Ramos, foram as jovens estrelas portuguesas participantes e que fizeram história. O brilho parisiense ante a impotência italiana.
A tendência do jogo inclinou cedo de mais, tirando a emoção e incerteza que falta em qualquer final. A rara goleada deu a justa consagração do PSG e de Luis Enrique, enorme exemplo de carisma e humanidade.
Mesmo ídolo
Faço a minha vénia, de adepto do bom futebol e das boas maneiras, a Luka Modric, verdadeiro craque recentemente retirado. O verdadeiro ídolo faz-se de conquistas e capacidades, mas muito da humildade que mantém, indiferente à fama criada e ao estatuto público alcançado. Sem o suporte físico da maioria dos astros atuais, mas com a simplicidade, classe e equilíbrio que o fizeram um médio muito especial, diferente e inesquecível.
Os jogadores de maior sucesso não têm de ser exemplos, como muitos exigem, mas também podem sê-lo, se o conseguirem ou quiserem. Modric foi esse modelo de arte técnica e educação, e certamente assim será, seja qual for a continuação da sua vida. Que venham mais como ele.
Golos aos pares
Antes de coroado o PSG, defrontaram-se Betis e Chelsea, na final da UEFA Conference League. Jogo desigual. Betis em vantagem e bem, na primeira parte, obra de Isco na assistência, outro fenómeno baixinho que desafia e contorna o poderio físico alheio. Uma segunda parte em tudo diferente. Um golo encaixado, seguido logo depois de outro, derrubou a equipa espanhola, que sentiu e desapareceu sem deixar rasto, de um jogo que ainda há pouco comandava. Impressionantes as diferenças que se vivem num só jogo, com equipas dominadoras à vez.
Cole Palmer é um dos melhores médios ofensivos da atualidade e a volta ao marcador e obtenção do troféu é iniciada pela sua refinada capacidade de passe, descobrindo a desmarcação de Enzo Fernández.
Quando se joga com um avançado, a diferença pode acontecer pelo aproveitamento da velocidade que o médio que entra de trás consegue, face a defesas mais estáticos e distraídos com o nove contrário. Na realidade do Benfica atual, este princípio foi replicado, por vezes, por Kokçu, mestre no passe e Aursnes ou Akturkoglu, fortes na desmarcação vertical.
Voltando à reviravolta inglesa, duvido que a esmagadora maioria dos treinadores trate o fenómeno dos golos sofridos consecutivos com a seriedade que esta realidade justifica. A frequência com que acontece sofrer-se um golo e outro logo de seguida merecia uma intervenção específica das equipas técnicas, mesmo aquelas que não integram um profissional da psicologia desportiva.
Durante esta época fui assinalando nesta crónica alguns destes episódios. A euforia positiva de um golo marcado que leva a conseguir o seguinte. A frustração e desorientação que um golo sofrido provoca, que nos torna mais maleáveis e inseguros. Exemplo ainda mais recente chegou do Palmeiras de Abel Ferreira — dois golos consentidos em somente quatro minutos deram em derrota frente ao Cruzeiro. Vamos ignorar ou considerar?
Cabeça
Querer racionalizar as análises dos adeptos é uma guerra perdida, já sabemos. Haverá sempre dúvidas, queixas e teorias opostas, sobre os mesmos lances, que o clubismo determina. Arbitrar é dificílimo num mundo complexo de intensidades e interpretações, impossível de mudar.
Pela última vez de volta ao Jamor e ao lance capital: mostrar as imagens em câmara lenta ou andamento normal não muda o que aconteceu. Uma pisadela na cabeça será sempre uma pisadela e, neste caso, impossível de esconder. Mais depressa ou mais devagar, não há como mudar o que as imagens mostram, lamento.
Ao contrário, num plano bem diferente, está o julgamento das faltas normais, que deve ser feito primeiro em velocidade normal. Neste caso, a câmara lenta também faz sentido, mas para detetar a existência ou não de contacto, muitas vezes duvidoso, tal a arte teatral de quem cai. Concluindo: não se confunda a análise de toques, com o visionamento de agressões. Claro mais claro não há.