«O Benfica sempre foi a minha segunda casa»
— Quando foi eleita MVP da final disse que foi uma época muito difícil. Mais do que nos outros anos?
— Foi muito desafiadora. Tivemos muitos altos e baixos dentro da equipa, algumas lesões que nos impediram de estar no nosso melhor, mas no fim tudo foi compensado com essa vitória. Acho que tudo valeu a pena.
— O que fez a diferença?
— O crucial mesmo foi a derrota contra os [Quinta] Lombos. Lá no primeiro jogo da semifinal. Tivemos de mudar a chave. Porque se não mudássemos a chave, íamos perder de novo. Então, como grupo, a equipa reuniu-se e falou: 'É a hora de juntar os pontos, lavar a roupa suja e ir com tudo o que temos.' Esse foi o ponto de viragem. Mudámos de atitude dentro de campo. A partir dali, pensei: 'Agora vai!'
— Não é inédito o troféu de MVP, mas é um reconhecimento para o esforço de uma época inteira?
— Por acaso, em casa, a minha mãe tem mesmo a estante com os troféus de MVP [sorri]. De vez em quando, ela manda umas fotos. É bom lembrar esta trajetória... O MVP é uma consequência do trabalho em equipa, de uma equipa que trabalha forte para vencer. E que acredita em ti. Porque se elas não acreditassem em mim, eu não seria capaz de alcançar os títulos individuais. Fico muito feliz, claro, porque é um reconhecimento do meu trabalho e eu dedico-me inteiramente ao basquetebol há anos. Sou profissional, vivo disto.
— Está no Benfica há quatro anos, depois de um no Quinta dos Lombos e dois na União Sportiva. Como se sente cá?
— Fora os anos que eu quase faço no Brasil também! Faço uma temporada aqui e sigo para a temporada no Brasil. Vivo praticamente assim. Praticamente não, é mesmo 100%. É um desgaste grande, toda a minha vida é à volta do basquetebol. Agora quero começar a estudar para buscar outros horizontes. Quando alguém se dedica 100% a uma coisa, os resultados aparecem.
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— Basquete Brasil - CBB (@basquetebrasil) May 31, 2023
— Começou a jogar basquetebol aos 13 anos, mas antes passou pelo atletismo, futebol, ballet e capoeira. Qual é que preferia?
— No início eu queria ser jogadora de futebol. O Brasil é um país de futebol e a influência é muito grande. Mas, naquela altura, não tinha muito apoio no futebol feminino, então fui para o ballet também, que era uma área que minha mãe gostava muito, só que não gastava tanta energia. Voltei ao futebol, entrei para o atletismo e fazia capoeira! Acho que as crianças têm de descobrir o que querem fazer. E com 13 anos conheci o basquetebol e fiquei indecisa entre o basquetebol e o atletismo, na altura fazia salto em altura. Entretanto, fui chamada para uma seleção de base com 15 anos e desde então apaixonei-me pelo basquetebol, pelo trabalho de equipa, por estar com as minhas colegas. Nunca mais parei [sorri].
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— Mas, nessa altura, era distante a ideia de ser profissional?
— Sim, sim. Não estava a pensar nisso, nem procurava. Mas pensava :'Agora eu vou levar isso a sério.' Os treinadores diziam-me que tinha potencial e talento, só que só o talento e o potencial não chegam, e que é preciso trabalhar. E foi isto até entrar na minha cabeça.
— E quando é que percebe que o basquetebol vai ser a sua vida?
— Acho que quando saí de casa a primeira vez, com 17 anos, e fiquei longe da minha família, tive a minha primeira lesão muito séria. Nessa altura, pensei: 'Agora tenho de levar isso a sério, se eu quero realmente isso, se quero mudar a vida dos meus pais.'
— E depois chegou a seleção do Brasil.
— Acabou por acontecer e tive anos incríveis na seleção. É mesmo viver um sonho, é uma coisa que todos os atletas querem viver, representar o seu país... Tirando os Jogos Olímpicos, onde ainda não consegui estar presente, são os pontos mais altos da carreira. Acho que não tem, não sei... no desporto, alguma coisa maior.
— Esteve no Panamericano.
— Sim, estive no Panamericano, estive na Copa América, fomos campeãs na Copa América, frente aos Estados Unidos, também um momento indescritível... Não tem como descrever esse sentimento, não?! [sorri]
— Portanto, Los Angeles-2028 seria perfeito?
— Seria! Seria perfeito, claro. Todos os atletas querem estar nos Jogos. Não trabalho focada só nisso, trabalho para melhorar todos os dias. Essas coisas são consequências e momentos. Depende de muitas coisas. Mas, o meu trabalho, a minha parte, eu tenho feito.
— Para jogar aqui, depois no Brasil, quase sem férias, é preciso muita disciplina?
— Acho que é mesmo dedicação, levar isto a sério, acreditar naquilo que se está a fazer.
— Treino, descanso, alimentação, tudo conta?
— Tudo, tudo isso está incluído. Alimentação, descanso, treino, treinar a sério, dar o máximo. Tudo isso faz parte para alcançar, como os atletas dizem, o sucesso. Todo o cuidado que tenho ajudou-me a chegar até aqui.
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— A área da psicologia é aquela em que gostava de trabalhar?
— Gosto muito. É uma área que gosto desde pequena, da época do ballet. Tínhamos apoio de psicólogos, eu era criança e não entendia muito bem. Mas, conforme foram passando os anos, percebi que para atletas profissionais a psicologia é muito importante, porque lidamos com um cansaço mental, um esforço mental muito grande. Não é só o físico, mas o mental. Temos de lidar, superar situações em menos de segundos, e como é que isso se faz? Sozinho, com a sua cabeça. O caso da Simone Biles foi um caso muito importante para as pessoas terem um olhar mais... Não digo piedoso, mas mais cuidadoso, e perceberem a importância que tem. Se ela que é a Simone Biles está a contar-nos isto, nós, os outros atletas, sentimo-nos representados por ela, porque ela trouxe uma questão que era uma pauta que muitas pessoas, muitos treinadores, talvez não levassem a sério. É precisa saber lidar com aquilo, entende? Quando comecei a fazer terapia individual, percebi o quanto melhorei, o quanto evoluí como pessoa, o quanto poderia perceber as coisas de uma outra janela. Às vezes, as pessoas falam, ouvem um amigo, os pais... Não é igual, gente! O psicólogo estudou para isso. Então, percebi, com os meus amigos, que consegui escutar bem e pensei: 'Quem sabe?!' Vou começar a estudar e ver se pode ser uma profissão. Comecei a amar e agora pretendo começar a estudar a sério.
— Quando recebeu o troféu era o Dia da Mãe no Brasil, portanto, a Dona Lúcia teve direito a dedicatória especial.
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BRASIL X ARGENTINA
Débora Costa
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— Sim, sim. A minha mãe, tenho aqui tatuada [mostra o braço], ela e o meu pai, são tudo para mim, meus pais são tudo para mim, meu irmão. É por eles, tudo isto é por eles.
— Algum era ligado ao desporto?
— O meu pai foi jogador de futebol, no Vasco da Gama. A minha mãe mais ligada à dança, o meu irmão fez judo. Todos gostavam muito de desporto, toda a gente ia para a praça, todo mundo jogava. Meus pais são tudo para mim, é o que me motiva. Esse dia foi muito especial porque era o Dia das Mães no Brasil e eu dediquei-lhe o troféu, a vitória. Não poder estar com ela nesse dia é doloroso, mas tudo valeu a pena por ter sido campeã. Agora vou para casa, e isso é que importa.
— D. Lúcia dizia ‘se eu quero, eu preciso fazer’, porque não eram ricos. Uma lição de mãe?
— Sim, acho que começamos a valorizar as coisas quanto mais difíceis elas são de conquistar. Vim de uma família humilde e os meus pais sempre valorizaram muito trabalhar para ter as suas coisas. Foi o que eu fiz. Trabalhar para conquistar as minhas coisas, pouco a pouco. E ainda tenho muito para conquistar, porque tenho 30 anos, sou nova [risos]. Acho que a minha mãe, os meus pais, foram o pontapé inicial, e são os que me motivam até hoje para os momentos mais difíceis, quando penso: 'Ai meu Deus, acho que não vai dar.' Eles estão ali para me mostrar que vai dar sim, que as coisas passam, os momentos difíceis passam.
— Eles têm noção do que alcançou em Portugal?
— Têm noção, eles seguem os jogos e os comentários, dizem, por exemplo, que os comentários estão falar bem de mim [risos]. Acredito que têm noção e, às vezes, até mais do que eu, porque como estou aqui, nem sempre percebo.
— Aterrou nos Açores, no Sportiva, uma aventura?
— Foi! Foi uma aventura. Com o sotaque! No início, não entendia nada, mas fomos campeãs nesse meu primeiro ano, foi uma equipa incrível, uma luta também, porque só tínhamos cinco ou seis jogadoras e foi duro, mas no fim fomos campeãs e tudo valeu a pena. Ficou guardado no meu coração, essa ilha tem o meu coração.
— E depois, Quinta dos Lombos.
— Sim, Quinta dos Lombos também foi muito. Bem recebida, o treinador José Leite que ainda está lá... Muito querido o pessoal, adorei ter passado por lá.
— O Benfica foi mais perto daquele profissionalismo que ambicionava?
— Sim. Trouxe a estrutura, mais próximo do que estava habituada na seleção, quando se trabalha a alto nível. O Benfica entrega tudo isso, todos estes anos. Foi incrível, porque dentro daquilo que era possível e que eu pedi, eles trouxeram. O Benfica sempre foi a minha segunda casa em Portugal, desde que aqui cheguei.
— Teve uma experiência terrível em Itália antes?
— Sim, muito difícil. O clube não cumpriu com o que estava acordado e fui-me embora. Foi a melhor opção pela minha sanidade mental, porque se fosse contar em receber aquilo, receber outra coisa... Até a forma como me trataram. As pessoas comunicavam muito mal. Mas as experiências ruins servem para aprender alguma coisa e depois consegui vir para cá, fomos campeãs [no ano passado]... As coisas acontecem como têm de acontecer.