A noite em que os plebeus se tornaram reis da Europa
PAULO ESTEVES

FC PORTO A noite em que os plebeus se tornaram reis da Europa

NACIONAL26.05.202409:41

Em dia de Taça, celebra-se a conquista da Champions em 2004; Mourinho ‘vs.’ Deschamps, quando se davam a conhecer ao mundo; Dragões cilindraram Mónaco sem apelo nem agravo

Neste dia, há precisamente 20 anos, o FC Porto escreveu mais uma bela página da sua história europeia. Em Gelsenkirchen, berço do Schalke 04, cidade que uma maioria de portistas ainda hoje pronuncia sem atropelar a língua alemã, o FC Porto comandado por José Mourinho venceu o Mónaco por 3-0, golos de Carlos Alberto (39), Deco (71) e Alenitchev (75), e sagrou-se campeão europeu pela segunda vez. Uma final improvável entre duas equipas que não eram apontadas como favoritas. Um duelo entre dois jovens técnicos que se mostravam aos grandes europeus, José Mourinho e Didier Deschamps. Finalmente, uma batalha entre plebeus e príncipes, porque, caro leitor, aquele Mónaco de 2004 tinha um timaço pago a peso de ouro (ver ficha).

Num onze com nove portugueses e dois brasileiros, os dragões cilindraram um adversário que tinha eliminado o Real Madrid, nos quartos de final, e o Chelsea, na meia-final. O FC Porto, por seu turno, tirou o tapete ao Man. United nos oitavos de final com um golo salvador de Costinha no último minuto (1-1, com a inesquecível corrida de Mourinho em OId Trafford, depois de vitória por 2-1 no Dragão) e eliminou o Lyon e o Deportivo da Corunha até chegar à final.

Na fase de grupos, os portistas ficaram em segundo lugar, com 11 pontos, logo atrás do Real Madrid (14 pontos), mas bem à frente de Marselha e Partizan.

Mesmo tendo vencido no ano anterior a então Taça UEFA — atual Liga Europa —, não recaía sobre o FC Porto favoritismo de nenhuma ordem. A equipa tinha talento e uma solidez notável, mas muitos dos jogadores que faziam parte do onze foram descobertas surpreendentes. Carlos Alberto era um adolescente, Paulo Ferreira (mais utilizado nessa época, com 52 jogos) e Marco Ferreira foram contratados ao V. Setúbal, Pedro Emanuel e Bosingwa ao Boavista, Derlei e Nuno Valente ao UD Leiria. Maniche fora proscrito no Benfica, mas a colar todas estas peças havia a liderança de Baía e Jorge Costa, o talento de Ricardo Carvalho, a magia inigualável de Deco, o sentido de golo de McCarthy, um suplente de luxo como Alenichev, e por aí fora.

Era uma equipa excecional, sustentada por um plantel extenso e diversificado sob a liderança de um treinador muito especial — e que se tornaria o Special One no ano seguinte, quando assumiu o comando do Chelsea. Dessa equipa técnica dos azuis e brancos faziam parte André Villas-Boas, atual presidente do FC Porto, António Dias, Ricardo Formosinho, Silvino Louro, Aloísio, António André, Baltemar Brito e Rui Faria. Deco foi eleito o melhor jogador da Liga dos Campeões (e homem da final) e Ricardo Carvalho o melhor defesa.

FOTO: PAULO ESTEVES

Uma música muita em voga na época — Os Filhos do Dragão —  foi a banda sonora de um estrondoso título europeu numa campanha  em que o FC Porto foi campeão nacional com 82 pontos, mais oito que o Benfica, com apenas duas derrotas fora (Rio Ave, 1-0 e Gil Vicente, 2-0) e o pleno de triunfos em casa, 17. Ganhou ainda a Supertaça — 1-0, ao UD Leiria

Uma última nota, de certo modo irónica: a primeira abordagem europeia dos dragões não correu bem. Na final da Supertaça europeia, disputada a 29 de agosto de 2003, no Estádio Louis II, no Mónaco, os dragões foram derrotados pelo Milan de Carlo Ancelotti, com golo de Shevchenko, aos 10 minutos. Começou o FC Porto em lágrimas, acabou também, em lágrimas, mas de alegria.

FOTO: PAULO ESTEVES