Os sinais que saíram do clássico
Sérgio Miguel Santos/ASF

Opinião Os sinais que saíram do clássico

OPINIÃO01.10.202311:28

«Mercado de valores», o espaço de opinião de Diogo Luís no jornal A Bola.

Numa época tão determinante, como a que estamos a atravessar, os jogos entre os candidatos ao título ganham uma dimensão especial. Para se ser campeão, a média de pontos perdidos situa-se entre os 15 e os 20. Tendo em conta o nível competitivo do nosso campeonato, os confrontos diretos podem ser determinantes para a definição do campeão. 

Benfica: Estratégia individual 

Estes são os jogos que todos os treinadores querem ganhar, porque são os que ficam na memória. A preparação para um jogo desta dimensão implica conhecer muito bem o adversário e tentar antecipar como vai ser a sua abordagem ao jogo. No confronto de sexta- feira, os dois treinadores surpreenderam-nos. Roger Schmidt colocou, pela primeira vez em campo, Di María, Neres e Rafa juntos. Tentando entrar na cabeça do treinador encarnado, parece-me que quis sobretudo apostar no excelente momento de forma que os três estão a atravessar. Desde o ano passado que todos identificámos qual o principal problema no jogo do Benfica. A equipa, coletivamente, permite inúmeras vezes que os adversários tenham espaço para explorar as costas dos médios encarnados, ou seja, o Benfica não é uma equipa sincronizada no momento de reação à perda de bola. Assim, quando os rivais conseguem ultrapassar a primeira zona de pressão encarnada, têm a possibilidade de desenhar ataques rápidos com os seus avançados de frente para os defesas do Benfica, muitas vezes, em igualdade numérica. Esta fragilidade da equipa de Roger Schmidt continua bem patente e ainda não foi reparada. O que pretendo realçar é que o problema maior do jogo do Benfica não se resolve com a entrada ou saída de um jogador, mas sim com trabalho, com treino, com mais organização e melhores posicionamentos coletivos. Por este motivo, a entrada de Neres não veio criar o tal desequilíbrio que tanto se fala, veio sim dar maior vertigem ao jogo encarnado e demonstrou que Roger Schmidt apostou muito mais no desequilíbrio individual do que na estratégia coletiva.

Porto: Estratégia coletiva

Por norma, Sérgio Conceição (S.C.) prepara muito bem os jogos grandes. Identifica os pontos fortes dos adversários e encontra uma estratégia para os anular, tentando posteriormente explorar as mais valias dos seus jogadores. Até chegar à Luz, a época da equipa azul e branca vinha sendo marcada por exibições com pouca qualidade (com exceção do jogo contra o Shakhtar), demonstrando algumas debilidades que S.C. identificou. Em primeiro lugar, a dificuldade em superar adversários que joguem com uma defesa muito recuada e povoada, os denominados blocos baixos. Em segundo lugar, e talvez o principal problema deste Porto 2023/2024, a incapacidade do seu meio campo ser agressivo no momento de recuperar a posse de bola, e o espaço que deixa entre si e a linha defensiva. Tendo em conta que um dos pontos fortes do Benfica é a forma como encontra espaço para potenciar a velocidade e qualidade técnica de Rafa, Di María ou Neres, S.C. definiu um onze que lhe desse mais garantias e solidez. Assim, com a inclusão de Romário Baró e a saída de Iván Jaime, procurou dar maior consistência e ocupação de espaços no momento de transição defensiva. Em simultâneo, colocou Pepê nas costas de Taremi, de forma a poder explorar a debilidade da equipa encarnada (espaço nas costas dos médios). Em termos concretos, o treinador azul e branco abordou o jogo pensando mais na estratégia coletiva do que no desequilíbrio individual.

Miguel Nunes/ASF

Benfica: Expulsão, indicações e futuro

Aos 19 minutos o jogo, que até então estava equilibrado, muda por completo. Com mais um em campo o domínio do Benfica acentuou-se. O Porto readaptou-se às circunstâncias, entregando a iniciativa de jogo ao adversário, aguardando pacientemente o momento de se esticar no campo. Ao longo da primeira parte, ficaram bem patentes as fragilidades (já identificadas) da equipa encarnada. Mesmo em superioridade numérica permitiu que os jogadores do Porto conseguissem encontrar espaços nas costas dos seus médios, ficando de frente para defesa encarnada com espaço para decidir. Com o desenrolar do jogo, e sobretudo na segunda parte, o Benfica melhorou neste capítulo, por alguns motivos: maior proximidade das linhas (defesa, meio campo e ataque) e maior proximidade do portador da bola; cansaço físico e mental da equipa azul e branca. O Benfica foi um justo vencedor num jogo atípico. Para o futuro, será importante que Roger Schmidt perceba que é fundamental trabalhar para ultrapassar ou esconder a grande debilidade que a sua equipa apresenta. Este aspeto será determinante para que o Benfica consiga ter um bom desempenho frente ao Inter de Milão, com quem vai disputar um jogo que tem um elevado grau de importância para as aspirações encarnadas na Liga dos Campeões.

Porto: falta de líderes em campo

No final de jogo, Sérgio Conceição referiu: “ganhámos muito mais do que perdemos”. Percebo perfeitamente a sua afirmação. No jogo da Luz, apesar de uma boa reação à expulsão na primeira parte, na segunda faltou mentalidade à Porto. Essa mentalidade não se cria de um dia para o outro. As saídas de Uribe e Otávio deixaram o Porto refém da liderança de Pepe e Marcano e é nestes jogos que os líderes são necessários. Nos momentos mais complicados, frente a adversários com mais qualidade, a presença de uma voz de comando faz a diferença dentro do campo. A segunda parte da equipa azul e branca demonstra isso mesmo: a ausência da alma portista, aquela alma que faz com que os adversários nunca estejam confortáveis e que desconfiem de si mesmos. É por este motivo que entendo as palavras de S.C., porque são precisos momentos destes para que os jogadores mais novos ganhem dimensão e percebam o contexto onde estão inseridos. O jogo com o Barcelona será mais um teste muito difícil e pode ser mais um degrau de aprendizagem para muitos dos jogadores que estão no plantel portista. Uma coisa é certa, em alta competição, não existe muito tempo para gerar líderes e este pode ser um problema para a equipa de S.C. nos jogos de maior dimensão. 

João Pinheiro – segurança

Não sendo um especialista em arbitragem, não posso deixar passar esta oportunidade de elogiar o árbitro da partida. Esteve seguro e fez o seu papel de moderador. Teve lances de difícil análise mas interpretou-os (praticamente) todos com eficácia. Foi chamado pelo VAR para reverter uma decisão que tomou e teve personalidade para a manter. Realço esta decisão porque no VAR estava Artur Soares Dias. João Pinheiro pensou pela sua cabeça, não se deixou influenciar pelo ambiente, e soube manter a calma e a estabilidade no jogo. Fica aqui o elogio a um árbitro que fez apenas aquilo que é a sua função, com segurança, autoridade e competência. 

A valorizar: Artur Jorge, Pizzi e Ricardo Horta

Artur Jorge, IMAGO

No final do jogo com o Estrela da Amadora assistimos no relvado a um momento delicioso: um apanha-bolas pediu para tirar uma fotografia com Pizzi e Ricardo Horta. Artur Jorge foi o fotógrafo de serviço. Isto também é futebol. Estes comportamentos valorizam a competição. Este jovem adepto vai recordar este momento para sempre.

A desvalorizar: Fábio Cardoso

Miguel Nunes/ASF

Um corte imperfeito e o derrube de Neres geraram um cartão vermelho que condicionou, e muito, a sua equipa no jogo frente a um adversário direto. Foi imprudente. Em alta competição estas falhas pagam-se caras.