«Vai ser mais difícil ser agente Proeleven do que agente FIFA»
- Carlos, qual o sentimento de ver a agência que fundou completar 25 anos?
Carlos Gonçalves (CG): É um sentimento de orgulho, ao fim de 25 anos, atingirmos a notoriedade que a empresa criou ao longo destes anos. Se me dissessem, no início, que ao fim de 25 anos estaríamos neste patamar, seria um sonho realizado. Não o consegui sozinho, consegui com a ajuda de muitas pessoas - o Vítor foi e é uma peça fundamental na empresa -, mas é um motivo de orgulho pensar que comecei sozinho e, ao fim deste tempo, a empresa estar com esta força, com esta dinâmica e com esta implementação no mercado.
- O que o levou a seguir rumo profissional?
- CG: Acima de tudo foi a paixão que sempre tive pelo futebol. É uma área em que se fala muito dos negócios, mas se não houver também paixão por aquilo que se faz, dificilmente nos mantemos muito tempo. Isso foi, sem dúvida, o principal motivo. Achar que, apesar da minha pouca experiência na altura, mas com enorme vontade, poderia tentar ajudar alguns clubes, alguns atletas a fazerem uma carreira um pouco diferente, ajudar algumas intermediações, e foi isso que me fez começar.
- Qual foi o negócio que marcou, então, o arranque da agência?
- CG: Foi muito curioso, porque eu não tinha nenhuma experiência - não fui jogador de futebol, não era conhecido no meio -, comecei a fazer algumas intermediações e houve um jogador, brasileiro [Silas Liberato da Silva], que foi a minha primeira intermediação, para o Brunei. Foi um negócio completamente atípico, pequeno, mas para mim foi sinal de realização pessoal, perceber que estava a entrar no meio e fazer algo que tanto me orgulhava.
- O Vítor entrou alguns anos depois....
- Vítor Gonçalves (VG): Entrei já com o comboio em andamento, com velocidade considerável. Fui acompanhando desde o início, estive presente nas primeiras reuniões, mas acabei por não entrar logo. Era o sonho do meu irmão. Conseguiu chegar onde chegou, obviamente com a ajuda de todos, mas eu, no início, tive algumas dúvidas que fosse possível, sinceramente tive, mas fui acompanhando, participando pontualmente naquilo que era possível, e em 2008 juntei-me.
- Para termos noção da evolução da Proeleven, com quantas pessoas começou a empresa, e quantos colaboradores tem atualmente?
- CG: Comecei sozinho, mais tarde tive uma secretária, e passados dois anos, talvez, entrou o Carlos Coelho, que ainda está connosco. Hoje o número vai variando, já fomos 25, neste momento 23. É uma estrutura com alguma dimensão para esta área da atividade, mas que muito me orgulha.
- Esse crescimento da empresa reflete também a evolução do negócio em si?
- CG: Sem dúvida. Os tempos eram completamente diferentes, até na velocidade da informação. Comecei com as cassetes VHS, a informação chegava aos clubes dois, três, quatro, seis meses mais tarde, e, portanto, a abordagem era completamente diferente. Também a própria dinâmica e gestão dos clubes. Hoje a informação circula em segundos, praticamente toda a gente tem acesso ao mesmo tempo. Houve momentos em que clubes, em Portugal principalmente, trabalharam muitíssimo bem, porque se antecipavam ao mercado, precisamente por causa disso, porque tinham a informação mais cedo e decidiam com mais rapidez, hoje torna-se um pouco mais difícil, pela conjetura económica. A decisão é que muitas vezes faz a diferença, é a rapidez com que se toma as decisões faz a diferença.
-Já vamos falar do franchising... que outras valências estão pensadas?
- VG: A agência é dividida por departamentos. Tem uma centralização de decisão, mas depois é dividida por especialidades, e cada vez mais as agências devem trabalhar como os clubes, ou seja, com os mesmos departamentos. Também fazemos recrutamento, scouting, acompanhamento de carreiras, promoção dos atletas, tudo isso é muito idêntico. O que falta ainda? Ter um departamento de performance, que os clubes já têm, e ajudar esses jogadores a serem melhores atletas. Acho que isso nos falta.
- Qual foi o maior negócio da história da Proeleven?
- CG: Não gosto de classificar, o maior negócio às vezes nem sequer é o mais difícil, mas houve alguns marcantes para a empresa, sem dúvida. Como disse, o meu primeiro negócio foi muito importante, sendo que não teve expressão absolutamente nenhuma na trajetória da empresa, mas marcou-me. Mas depois houve vários atletas: o Eliseu foi alguém que fomos acompanhando durante muito tempo, o Zeca foi um atleta que saiu da terceira divisão, na altura do Casa Pia. Houve muitos, e eu não quero ser injusto.
- O que levou a agência a avançar para o franchising?
- VG: Fomos acompanhando o que tem acontecido no mercado das agências e chegámos à conclusão de que tem havido uma concentração, fusões, porque as agências têm de ser maiores para funcionar e conseguir impacto no mercado, têm de trabalhar em network. Já estávamos a trabalhar com parcerias, tivemos algumas, mas achámos que não era suficiente. Queremos uma identidade muito presente, e a única forma, no nosso entender, sem investimento muito avolumado, seria através do modelo de franchising. Foram quatro anos a preparar a ideia, porque não existe nenhum tipo de organização de franchising nesta indústria. Houve dúvidas iniciais, procurámos aconselhamento com especialistas, houve muitas perguntas que tiveram de ser respondidas internamente e finalmente, também para assinalar os 25 anos da agência, arrancámos com o projeto. Queremos, em 10 anos, estar presentes na maior parte dos mercados, com identidade própria e nome próprio.
- Existiam dois caminhos, o das fusões e o franchising. A questão, no vosso caso, foi mesmo preservar a identidade?
- CG: Quando as pessoas ouvem falar no nome da Proeleven, rapidamente identificam uma forma de ser, de estar, de negociar. Isso foi construído com a ajuda de todas as pessoas da empresa, ao longo de 25 anos, e é a nossa grande mais-valia, portanto, não queríamos abdicar disso. Respeito todas as estratégias, não é isso que está em causa, mas quando vejo exemplos internacionais, como duas grandes empresas inglesas que se fundiram através da compra de uma empresa norte-americana, e os donos dessas duas empresas não falavam entre si, havia uma guerra latente entre as duas agências... não pode vir daí uma coisa boa. Acho que não era isso que queríamos, procuramos alguém que venha colaborar connosco, que nos ajude a crescer, e para isso temos de ser fortes localmente, ter conhecimento profundo em termos locais, e sem estar enraizado localmente seria difícil. Foi a ideia que tivemos e achamos que tem margem para crescer bastante. Não temos pressa de dizer que vamos abrir 20, 30, 40, 50... não é isso que nos motiva, acima de tudo queremos que as pessoas se revejam em nós e que vejamos nelas capacidade de levar a nossa mensagem, a nossa forma de atuar.
- A Proeleven oferece a sua experiência de 25 anos e recebe uma contrapartida financeira?
-VG: É isso, o modelo já existe, está mais que experimentado, nesta área realmente vai ser uma inovação, mas é isso. Nós concedemos o nome, o know-how e a forma de trabalhar da Proeleven. Vamos ser muito restritivos no recrutamento dessas pessoas, vamos dar formação e vamos ter ferramentas globais, exclusivas dentro da rede, para podermos trabalhar na mesma forma. Teremos serviços centralizados, o master vai ser o órgão capaz de centralizar determinados serviços e de controlar determinadas operações - o que é muito importante para mantermos a qualidade e o controlo que nós queremos – e, portanto, estamos preparados. Todos os obstáculos que fomos encontrando, lombas no caminho, acho que conseguimos ultrapassar, e neste momento já temos um modelo bem sólido para começar.
- Que cuidados é preciso para encontrar os parceiros certos e não manchar uma reputação de 25 anos?
- CG: É fundamental, porque construir uma reputação demora muitos anos, destruí-la é muito fácil e isso para nós é ponto assente. A questão das relações com as pessoas, com os clubes, é fundamental. Perceber que isto é uma corrida, uma maratona, não é uma corrida de 100 metros, e quem vier para esta área tem de perceber que não é fazer de um negócio o negócio da vida, é fazer desta vida aquilo que se quer para os seus negócios. Evidentemente que é sempre importante fazer bons negócios, mas não pôr os negócios à frente das relações, porque isso, a médio prazo, vai minar todo o trabalho.
- VG: No fundo, o mesmo cuidado que temos neste momento a recrutar para a Proeleven, vamos ter os mesmos cuidados a recrutar fora da Proeleven, mas dentro da rede. Os cuidados são os mesmos: vai haver uma análise curricular, obviamente, várias entrevistas, ter a certeza que o candidato reúne todas as condições, e depois, ainda assim, condicionado a uma formação que pode durar até seis meses, para conhecer bem a pessoa, para que a pessoa nos conheça bem, para termos a certeza que, para ambos, é o passo certo. Portanto, não vai ser uma decisão leve, vai ser algo ponderado. Eu já disse isso várias vezes, vai ser muito mais difícil ser agente Proeleven do que agente FIFA.
- O setor tem a regulação adequada, agora, ou ainda há um caminho grande a percorrer?
- VG: Acho que a FIFA ainda não acertou com o modelo. Se formos olhar para o percurso da FIFA nos últimos 25 anos, houve avanços e recuos. Há uns anos, os agentes eram empresários, compravam passes, direitos económicos que os clubes detinham, ou diretamente ao jogador, porque, acima de tudo, o direito económico é um direito do próprio. Isso foi considerado, ao longo deste caminho, uma terceira parte, e foi proibido. Depois a FIFA criou o regulamento para intermediários, ou seja, olhando para esta figura apenas como um consultor e um intermediário, e agora voltou à forma do agente e à exigência do exame. Foram criados conselhos consultivos, com uma pequena amostra dos agentes mais influentes, mas tudo aquilo que disseram foi em vão, porque, no fundo, a FIFA não fez nem 10%, se calhar, daquilo que foi pedido, e, portanto, eu acho que ainda falta regulamentação, não acho que seja demasiado regulamentado. Ainda há muito por fazer.
- Carlos, o empresário de futebol, o agente de futebol, ainda é visto, hoje em dia, no mundo do futebol, quase como um mal necessário, por assim dizer?
- CG: Eu acho que, evidentemente, em todas as atividades, há bons profissionais e maus profissionais. Eu acho que alguns agentes também se colocam a jeito, não ponho isso em causa, mas eu acho que os agentes foram e são importantes nesta indústria. O jogador não deixa de ser um artista, e é uno, per si. É irreplicável, não se pode clonar. Nem todos os clubes olham para os jogadores da mesma maneira. Eu acho que os agentes têm aqui um papel importante e, principalmente, em Portugal, eles tiveram um papel muito importante naquilo que foi a divulgação e a ajuda dada, pela qualidade que têm os clubes, jogadores e os treinadores. Acho que os agentes também foram importantes para internacionalizar esses ativos e fazer com que entrassem grandes receitas em Portugal, a tornar o modelo sustentável para os clubes. Vamos ser sempre um país exportador. A nossa economia a nível mundial está em 46° ou 49°, no futebol somos o 6° no ranking da FIFA. Isso quer dizer que alguma coisa estamos a fazer bem. Se em todas as nossas atividades em Portugal estivéssemos a este nível, seria um país único. Há sempre coisas para melhorar. Os agentes também terão de melhorar, como é evidente, mas acho que, muitas vezes, é mais fácil atacar os agentes do que, propriamente, as más práticas de alguns clubes.
- Hoje em dia é mais importante fazer intermediações do que ter propriamente uma boa carteira de jogadores?
- VG: Qualquer intermediação começa com uma necessidade e, portanto, em vez de só olhar para o jogador, eu acho que os agentes têm de olhar para os clubes e para as suas necessidades. E, dessa necessidade, nasce um perfil e os agentes têm de ir atrás desse perfil para tentar fazer um match e para tentar fazer a intermediação. Tem de ser a conjugação destes dois elementos, retratar essa necessidade e depois ir à procura de um jogador, que faça sentido também na carreira dele, e que preencha esses requisitos desportivos e financeiros. Nós construímos pontes, temos de estar no meio destes dois caminhos.