Tiago Silva: «O nível é bom, não é tão mau como talvez as pessoas pensem»
Médio português, de 32 anos, falou sobre o campeonato do Qatar, a sua escolha pelo Al-Rayyan e das principais dificuldades na sua adaptação. Também revelou um episódio insólito que ocorreu logo nos primeiros dias que passou no país.
Agora que já fizeste dois jogos, como é que avalias a Qatar Super League?
- É diferente do nosso campeonato, o jogo parte-se mais e é um pouco mais lento, sendo que o calor também não ajuda nesse aspeto.
E como é o jogador qatari?
- O nível é bom, não é tão mau como talvez as pessoas pensem na Europa. Eu próprio, antes de vir, julguei que ia notar uma grande diferença e não aconteceu. Obviamente que o jogador português é muito técnico e inteligente, estando acima de vários países e por vezes não se valoriza tanto quanto se devia. Mas, aqui há qualidade e os estrangeiros que cá estão também ajudam.
Como é que os adeptos do Al-Rayyan te têm recebido?
- Sente-se um enorme carinho. No final dos jogos ficam à espera dos jogadores para darem apoio, tal como acontecia no Vitória.
O Qatar recebeu o Mundial 2022, como é que vês o desenvolvimento do futebol do país após ter organizado essa grande competição?
- Falando mais concretamente do Al-Rayyan, o centro de treinos é incrível. Têm vários campos, condições de excelência para os jogadores, como o departamento médico, os ginásios e não há grande diferença para Portugal. Os estádios também são incríveis, sendo que ainda só joguei em dois, mas ambos são muito bons. O país está a crescer, não só o seu futebol, porque há aqui pessoas que já estão aqui há alguns anos e dizem que não era assim há uns anos que está a crescer a um ritmo elevado e o futebol vai acompanhando.
Em novembro, o país vai receber mais um Mundial, desta feita o de sub-17. Como é que estas competições podem ajudar no desenvolvimento e como é que é o futebol de formação por aí?
- Cheguei há pouco e ainda não deu para perceber muito bem, mas aqui o Al-Rayyan aposta muito nos jovens, pois temos constantemente miúdos da equipa B a treinar connosco. O campeonato tem limitação de estrangeiros e tem de se utilizar jogadores sub-23 e isso é bom. A organização de mais um Mundial é sempre de salutar.
Quais os objetivos do clube para esta temporada?
- Aqui no Al-Rayyan é para conquistar títulos, é um clube grande que exige isso. Estamos a trabalhar nesse sentido.
Estava na sala a brincar com o meu filho e ouvi as bombas a cair
Como estão a ser estas primeiras semanas no Qatar?
- O grande desafio tem sido o calor. Quando cheguei foi difícil treinar, porque nos estádios têm condições, com ar condicionado e é tranquilo. Agora, treinar com 40 graus é complicado. O corpo sente muito!
Tiveste que realizar algum trabalho específico de preparação?
- Não. Estava a competir e tinha feito a pré-época no Vitória, portanto fisicamente estava bem, até porque estava a jogar, com exceção do último jogo. A maior dificuldade foi mesmo a adaptação ao calor. Estava a custar muito, não conseguia respirar. Dava dois piques e abafava. Confessei mesmo ao André Amaro, se era uma coisa só minha, pois estava a ser complicado. Ele disse que nas primeiras semanas a dificuldade é geral, mas que ia habituar-me rápido e agora já não sinto tanto. As temperaturas também baixaram e ajudou ainda mais.
Já sentiste algum choque cultural ou passaste por alguma situação inédita?
- A coisa que mais mexeu comigo até agora foi o ataque de Israel, porque foi muito perto do hotel onde estávamos. Tinha chegado com a família no dia anterior e foi um choque grande para todos, especialmente para a minha mulher e para o meu filho. Mas, tirando isso, aqui as pessoas são muito amigáveis, boas a receber, um pouco como nós. Por isso, não senti dificuldades, fui muito bem recebido e estou a sentir-me em casa.
Mas, como é que foi assistir in loco a um ataque bélico?
- Não vou mentir. Não foi nada bom. Foi muito perto do hotel e estava na sala a brincar com o meu filho e ouvi as bombas a cair. Ele perguntou logo o que era e procurei amenizar um pouco, disse-lhe que deviam ser foguetes, porque onde vivíamos lançavam várias vezes e ele já estava habituado. Mas dei conta que coisa boa não era, fui à janela um pouco assustado, para tentar perceber se havia alguma coisa a acontecer na rua, porém não vi nada. Tudo normal e foi a minha esposa que ao ver as notícias, cinco minutos depois, me disse que tinha sido um ataque que eram bombas. Fiquei à espera para perceber se havia treino ou não e lá disseram que estava tudo seguro. No entanto fiquei um pouco receoso ao deixar a família no hotel, tão perto de onde tinha sido o ataque.