João Simões brilhou antes e durante o jogo — mas uma derrota é uma derrota. Foto IMAGO
João Simões brilhou antes e durante o jogo — mas uma derrota é uma derrota. Foto IMAGO

Sporting: vale mais ter azia ou afagar o ego?

O Livro de desassossego é uma rubrica de opinião semanal

Não creio que seja do interesse dos jogadores do Sporting ouvirem o treinador falar em grande jogo, em orgulho pela exibição, em exibição corajosa, tudo elogios rasgados no rescaldo da derrota em Munique, com o Bayern. Em última análise, pode até ser tudo verdade, mas não ajuda nada para o futuro. De facto, o Sporting jogou sem vários titularíssimos, chegou a enervar o colosso, teve bons momentos, mas... perdeu. Logo, cuidado com os elogios.

Em primeiro lugar porque coloca o jogo no patamar das vitórias morais. Não creio que exista uma única taça moral no rico museu do Sporting. Em segundo lugar, é uma questão de treino mental. Ninguém é gigante sem se imaginar primeiro gigante. Se não incorporar uma linguagem, verbal e até corporal, de gigante. Mesmo que possa soar a exagero. Até a fanfarronice... Morre-se mais por falta de fé do que por garganta a mais.... David nunca teria entrado na história se não se imaginasse maior do que Golias. Mesmo não o sendo. Mesmo que em cada dez tentativas apenas por uma vez acertasse em cheio em Golias. E essa vez bastou para entrar na história.

Mesmo que ninguém, de bom senso, pudesse exigir uma vitória ao Sporting em Munique, mesmo na máxima força, quanto mais tão limitado, há coisas que se treinam sempre: a aversão à derrota, qualquer que seja o contexto e o adversário. O Sporting perdeu, não teve os mesmos argumentos, talvez nunca os venha a ter. Os jogadores têm de sentir que foi uma derrota, têm de tentar mais e melhor da próxima vez que jogarem em Munique. E tentar de novo... E de novo... A derrota pode não atrapalhar uma consciência tranquila. Mas não justifica, independentemente dos contornos, massagens aos egos. A linguagem, a atitude, a aversão profunda à derrota e a superação de adversários bem superiores, uma vez que seja, também se treina. Um pouco de azia será mais útil ao Sporting do que um ego massajado. E quem fala do Sporting fala de todos os clubes, não sabendo eu ainda, à hora a que escrevo, qual o resultado do jogo do Benfica.

Isto não invalida que alguns jogadores leoninos se tenham destacado mais do que outros. Um dele, um menino de 18 anos, foi até eleito o melhor dos leões para A BOLA: João Simões. E tem tudo para que os adeptos gostem dele, em especial, claro está, os do Sporting. Sente e vibra com o Sporting, mais expansivo até quando está no banco...; começou aos 11 anos um percurso que já o guiou à titularidade; tem muita qualidade; enorme garra; sudável irreverência e até alguma irresponsabilidade de se guiar pelas emoções e não pelo medo. De resto, não esqueço a conferência de imprensa, na Alemanha, de antevisão ao jogo com o Bayern. Repostas curtas, mas sentidas. Colocação de voz. Convicção. Arrojo. E Rui Borges, a seu lado, a sorrir, achando piada ao miúdo a quem já aponta o trilho das estrelas. Assim o senhor estudante universitário — que bom se puder continuar a conciliar — saiba tornar-se um homem honoris causa.