Rui Borges teceu elogios ao jovem central, que marcou o golo que garantiu os três pontos diante do Gil Vicente

Sporting: como Quaresma se transformou no 'menino coração de leão'

Mudança de comportamento profissional na base do sucesso. O descarregar de emoções no golo com o Gil Vicente pelos anos de pressões, dúvidas e sacrifícios. A BOLA falou com jogadores e treinadores que tiveram responsabilidade numa afirmação que esteve muito perto de não acontecer. «Sempre quis vingar no Sporting», conta Rafael Barbosa, que partilhou balneário com o central leonino na Academia e em Tondela

Um final de cinema. Que ficará, por certo, gravado na memória desta Liga. Independentemente da forma como terminará. Uma explosão de anos de trabalho, altos e baixos, pressão constante, dúvidas e muito sacrifício. São episódios como aquele que Eduardo Quaresma viveu, naquele remate certeiro aos 90+3’ que deixou Alvalade em ebulição diante do Gil Vicente (2-1), que podem constar de todos os manuais motivacionais de um aspirante a profissional. Um jovem nascido e criado na casa, made in Alcochete, a provar que todos os sonhos se podem tornar reais.

O talento evidenciado em tenra idade levou-o para Alcochete há 14 temporadas. Uma viagem curta, deixando o Fabril Barreiro, com apenas 10 anos. Por ali cresceu e se fez homem. Um crescimento sempre aliado a um talento que nunca lhe deixou de ser reconhecido. Mas foi no derradeiro degrau, na subida aos seniores, que surgiram os primeiros problemas. Um menino que nunca deixou de ser criança. A falta de maturidade competitiva sempre foi a justificação para o afastamento dos grandes palcos. E os empréstimos, mal sucedidos ao Tondela e Hoffenheim, não auguravam bons sinais. E o fim de linha, com os leões, o clube onde cresceu, esteve mesmo perto de acontecer no início da época passada...

«EM TONDELA ERA FRÁGIL»

Mas afinal o que tem Eduardo Quaresma de tão especial? A BOLA esteve à conversa com Rafael Barbosa, outro jogador com formação leonina, que teve a particularidade de partilhar o balneário com o central na Academia e em Tondela. Amigos de longa data, portanto. E que foi partilhando de perto todas as expectativas e frustrações.

Rafael Barbosa também cresceu na Academia com Quaresma e partilhou balneário com o central em Tondela (IMAGO)

Ele não era muito fã de treinar e acho que foi isso que o ajudou a crescer, no Sporting tens de treinar no limite para jogar, então em Tondela chegava aos jogos mesmo a não fazer grandes treinos e era muito bom o que fazia, não sei como conseguia mas tinha essa virtude

«Quando marca o golo a primeira coisa que faço é mandar lhe uma mensagem e expressar a felicidade que tenho por ele. Aquelas lágrimas foram de um miúdo que tem a noção do que aquele golo pode significar. Em termos emocionais, o Edu, pelo menos em Tondela, era frágil. Acho que o grande segredo dele, do salto e da afirmação no Sporting, se deve muito a isso, porque o talento, a irreverência, esteve sempre lá. Ele fez coisas e ainda agora faz que fico a pensar ele é diferente, tem tudo», diz o extremo que atualmente joga na Polónia, no Radomiak Random. «Na altura, em Tondela, o objetivo dele sempre foi voltar ao Sporting e eu sempre lhe disse que tinha tudo para chegar lá, dei-lhe muitos conselhos, ele sabe, ajudei-o em tudo o que consegui. Fico muito feliz por ele, é uma pessoa com bom coração, amigo, brincalhão, sempre prestável, transparente, notava-se quando não estava nos seus dias e merece tudo o que está a viver», destaca o extremo, revelando:

«Ele não era muito fã de treinar e acho que foi isso que o ajudou a crescer, no Sporting tens de treinar no limite para jogar, então em Tondela chegava aos jogos mesmo a não fazer grandes treinos e era muito bom o que fazia, não sei como conseguia mas tinha essa virtude. Tenho a certeza de que com o pensamento certo, com a qualidade dele pode ser uma mais-valia num futuro na Seleção Nacional.»

Leonel Pontes foi o treinador que estreou Eduardo Quaresma como profissional (IMAGO)

Todos os treinadores tiveram uma luta com o Quaresma. Primeiro porque tinha algo de especial: sua a qualidade. A relação com a bola, capacidade de progredir com ela, do desarme, mas era um pouco preguiçoso, um pouco desleixado com o rigor do treino. O facto de ter sido emprestado e ver que existia um caminho a percorrer fez com que pudesse aproveitar o processo diário de trabalho. Hoje está a colher essa mudança

«MAIS SÉRIO E PROFISSIONAL»

Leonel Pontes, treinador do Shanghai Shenhua (China) e que tem passado rico na formação leonina, foi quem estreou Quaresma como profissional: em agosto de 2019, numa vitória sobre o SC Braga nos sub-23.

«Todos os treinadores tiveram uma luta com o Quaresma. Primeiro porque tinha algo de especial: sua a qualidade. A relação com a bola, capacidade de progredir com ela, do desarme, mas era um pouco preguiçoso, um pouco desleixado com o rigor do treino. O facto de ter sido emprestado e ver que existia um caminho a percorrer fez com que pudesse aproveitar o processo diário de trabalho. Hoje está a colher essa mudança. Porque é um jogador que está a ser aposta e isso é sinal que melhorou o seu comportamento profissional. Mais sério e profissional. É cativante porque é um bom miúdo, tem um sorriso fácil, é comunicativo, não é um rapaz tímido, que dá luta para qualquer treinador, porque é necessário ter alguma inteligência para lidar com o Eduardo», conta o técnico a A BOLA e termina... «São estes jogadores que dão identidade a um clube. Tem muitos anos de Sporting e é importante que o clube saiba preservar estes jogadores», avisa.

Nuno Campos foi quem trabalhou com Quaresma na primeira experiência fora de Alvalade, em Tondela (IMAGO)

Precisava de ter um clique, porque talento nunca lhe faltou. Tem todas as ferramentas para continuar a evoluir, tornar-se uma peça preponderante no Sporting e não deve tardar a chamada à Seleção

«TEM UMA FORTE LIGAÇÃO AO SPORTING»

Nuno Campos, técnico português de 50 anos que trabalha na formação do Flamengo (sub-20), foi um dos que trabalhou de perto com Eduardo Quaresma no Tondela. O técnico, em conversa com A BOLA, lembrou o período em que trabalhou com o central nos beirões. «Precisava de ter um clique, porque talento nunca lhe faltou. Tem todas as ferramentas para continuar a evoluir, tornar-se uma peça preponderante no Sporting e não deve tardar a chamada à Seleção», disse, prosseguindo, pouco depois, com os elogios.

«É um central diferente, que trata bem a bola e tem depois estes momentos decisivos. Tem forte ligação ao Sporting, percebe -se que sente o clube e tem empatia muito especial com os adeptos, que o adoram. Isso é fantástico, porque ou se tem ou não se tem», diz o treinador português.