Os novos estatutos do Benfica
Conseguir, em democracia, o acordo de pelo menos 75 por cento dos votantes nunca é fácil, mais a mais quando a escolha não é fulanizada, mas sim assente as alteração dos parâmetros reguladores da vida de uma instituição, ou de um País, no caso dos textos constitucionais.
Quando mobilizou mais de oito mil sócios para a votação de uma nova proposta de estatutos, o que, porque não se tratava de uma eleição presidencial, é altamente significativo, depois de um processo discutido e participado, controverso e por vezes fraturante, independentemente do resultado, o Benfica teve uma grande vitória. Teve-a Rui Costa, que prometeu e cumpriu, e na hora do desfecho teve a grandeza de elogiar não só o atual presidente da Mesa da Assembleia Geral, José Pereira da Costa, que com coragem levou a missão a bom termo, mas também o antecessor, Fernando Seara, absolutamente decisivo pelo inestimável trabalho político realizado numa das fases mais críticas do processo.
Teve-a, também, a chamada ‘oposição’, que não deve ser confundida com os agitadores que a páginas tantas atiraram areia para a engrenagem, pelo contributo que deu e pela qualidade de muitas das intervenções realizadas, mostrando que, em nome de um bem maior, é possível ser fiel ao lema do Benfica.
Do que foi aprovado, e que passará a constar da nova ‘Magna Carta’ encarnada, vários pontos merecem realce, por terem sido, até agora, considerados ‘vacas sagradas’ no universo benfiquista:
1 - A nova ponderação do número de votos atribuídos a cada associado em função do tempo de filiação, que empodera as gerações mais recentes de sócios;
2 - O facto de as Casas do clube deixarem de ter direito a voto (o que não tem nada a ver com os associados ‘per si’).
3 - O fim da necessidade de 25 anos de sócio para ser presidente do Benfica, baixando essa fasquia de fidelização para a década e meia;
4 - E, ‘last but not least’ a garantia de que, à imagem do que sucede na República, só será presidente quem tiver a maioria absoluta dos votos, o que em muitas circunstâncias poderá levar a uma segunda volta. Apesar de saber que as eleições nos clubes têm muito a ver com as conjunturas criadas pelos resultados desportivos da equipa principal de futebol, e que há exemplos de presidentes eleitos com 90 por cento dos votos não terem durado mais de um ano, não deixa de ser democraticamente justo e clubisticamente agregador aprovar esta alteração.
Pena é que não tenha sido contemplada a criação de uma Assembleia Delegada, que fosse mais representativa do universo de sócios, que acaba de atingir os 400 mil. Até porque, nos novos estatutos, o atual modelo de AG, que muitas vezes não acolhe mais do que um milhar de associados, passa a ter um peso maior na manutenção e queda das Direções, através da aprovação das contas. O que pode vir a transformar-se num foco de desestabilização.