O nosso futebol vive momentos decisivos

É tempo de percebermos se a urbanidade veio para ficar, ou se não resiste a um penálti; de percebermos se os assuntos sérios, centralização e requalificação dos quadros competitivos, têm pernas para andar; e se os árbitros querem dar o passo em frente em segurança, ou se procuram o abismo...

O futebol profissional português continua a enviar-nos sinais contraditórios. 

Por exemplo, o mero facto de Rui Costa e Frederico Varandas terem presenciado o dérbi lado a lado, no camarote presidencial da Luz, teve laivos civilizacionais, a que faço referência apenas por não estar habituado a ver manifestações públicas de que quem está do outro lado é adversário, e não inimigo. Neste preciso momento, nada me garante que a situação volte a repetir-se, sendo de tal forma fino o gelo que se pisa que pode não resistir ao peso de um qualquer penálti mal assinalado. Mas seria altamente positivo se o vírus de urbanidade que infetou os líderes de Benfica e Sporting se transformasse em pandemia, que alastrasse a todo o futebol nacional, podendo (e devendo) cada clube manter a sua identidade, defender as suas posições, debater e discordar, sem que para tal tenha de haver relações cortadas e criação de um clima que degrade a imagem do futebol, e coloque portugueses contra portugueses. 

Mas, ao invés, os clubes, embora se sentem à mesa da Liga, tardam em entender-se quanto a matérias estruturais de que depende o futuro do nosso futebol, como a centralização e a reformulação dos quadros competitivos. Sei que Ricardo Teixeira está a fazer os possíveis e impossíveis para desatar o ‘Nó Górdio’ que ata a proporcionalidade da distribuição, pós-centralização, dos proveitos da venda dos direitos televisivos dos clubes, e para ser absolutamente franco continuo altamente cético quanto à chegada a bom porto nesta matéria. O que haverá para dividir não é muito, não me parece que qualquer clube aceite receber um euro a menos que seja (isto olhando para trás, porque se olharmos para a frente o otimismo passa de residual a nulo), e a verdade é que o produto que temos para vender (e internacionalizar) é desinteressante e fraço. Aqui chegados, temos duas hipóteses: vamo-nos enganando uns aos outros, dizendo que temos jogos fantásticos, por que se babam as principais cadeias televisivas internacionais; ou então tomamos as medidas que devem ser levadas avante, e que passam, inevitavelmente, pela requalificação dos quadros competitivos, substituindo espetáculos intragáveis por confrontos com outro nível de competitividade. Sem isso, por mais voltas que sejam dadas, nada feito, e mesmo assim, relativamente a outras realidades, já vamos com um atraso muito significativo. Ou seja, para ontem já era tarde...   

Na órbita do futebol profissional ainda temos o protesto dos árbitros, contra a violência verbal, e uma ameaça de parar as competições? Mas o que querem, afinal, os árbitros? Nunca foram tão bem pagos, nunca tiveram tão boas condições para desenvolverem o seu trabalho, nunca se sentiram tão seguros e nunca, como agora, receberam tanto apoio tecnológico que os ajuda a minimizar os erros. Então, perante tudo isto, ainda querem ser imunes à crítica, mesmo que vinda dos protagonistas? Desde que estes se mantenham em níveis de urbanidade, insurgindo-se contra decisões concretas, estão, simplesmente, a exercer um direito que constitucionalmente lhes assiste, e devem revoltar-se contra toda e qualquer lei da rolha que queiram impor-lhes. 

É assim que os árbitros querem caminhar para a constituição de uma organização autónoma, que lhes aprofunde o profissionalismo?