Banco de suplentes onde se sentava a equipa da casa do Dellbrucker (MIGUEL MENDES)

A BOLA no banco onde tudo começou para Roger Schmidt

Uma viagem às origens onde o técnico iniciou a carreira de treinador; Dário Figueiredo foi o primeiro português orientado pelo alemão e o guia desta visita ao Dellbrucker Sport-Club; As histórias do aspirante engenheiro mecânico que se tornou num herói desta aldeia

DELLBRUCK — Foi no modesto DSC, Delbrucker Sport-Club, que o caminho de Roger Schmidt como treinador começou a desenhar-se. Uma das mais belas histórias do rapaz da aldeia que vingou a nível internacional. Um emblema ainda distante de Kierspe, a sua terra natal, mas o ponto de partida para o desvio como engenheiro mecânico, área onde se formou. Dellbruck foi berço do futebol do técnico alemão. Onde terminou a carreira de jogador e iniciou a de treinador. Conciliou até ambas num primeiro ano.

A viagem às origens de Roger Schmidt conduziu A BOLA até este clube que pretendia conhecer, de forma mais pormenorizada, a personalidade do alemão. Para tal, tivemos a ajuda de Dário Figueiredo, que foi, tão somente, o primeiro jogador português orientado pelo germânico. Um testemunho especial do que existe atrás deste treinador que, em Portugal, raramente se deu a conhecer.

Este foi o primeiro banco utilizado pelo treinador do Benfica (MIGUEL NUNES)

São 10 horas e à entrada do Stadion Laumeskamp já nos aguardava Dário Figueiredo. Devidamente equipado com a camisola da Seleção. A última vez que havia estado no local já passavam mais de 10 anos. «Isto para mim é especial. Era avançado, tinha talento e marquei golos em todas estas balizas. Tenho pena porque há 20 anos as redes sociais ainda não existiam. Tenho pouca coisa guardada…», começa por nos dizer o antigo avançado que, em 2004, era uma das promessas deste emblema que nunca passou das ligas regionais.

Dário Figueiredo foi o primeiro jogador português orientado pelo técnico germânico (MIGUEL NUNES)

Na memória estão guardadas todas as boas recordações. Onde Roger Schmidt tem, obviamente, um lugar especial. Pois foi quem o promoveu da formação para o plantel principal. Com apenas 17 anos: «Foi um salto enorme. Treinava sempre com a primeira equipa e nos fins de semana jogava com a equipa secundária. Ele nos primeiros anos jogava, e dava uns bons toques, mas depois dedicou-se a 100 por cento como treinador. Sabia lidar com os jovens. Sabia de tudo. O que queria e como queria. Nos treinos tinha uma obsessão pelo passe, a forma como tinham de ser feitos. Se não saía bem repetia umas 20 ou 30 vezes se fosse preciso. Era perfecionista.»

A pressão no Benfica

Dário Figueiredo acabou por nunca jogar apesar das três pré-épocas com Schmidt. Não por falta de oportunidades. A justificação prende-se com a mentalidade.

«Muitos diziam que era talentoso, mas depois acho que me faltou a disciplina… os meus amigos tornaram-se mais importantes do que o futebol e levava muito na cabeça de Schmidt por causa disso. Tinha conversas contigo, puxava-te para o lado, dizia que tínhamos de fazer assim… era muito comunicativo. E pegava em todos. Falava muito com os jogadores e era algo importante para todos se sentirem importantes no grupo», conta-nos Dário, hoje com 36 anos, estranhando a ideia generalizada que existe em Portugal sobre o alemão.

A notícia que dava conta da 'promoção' de Schmidt ao jovem português (MIGUEL NUNES)

«Nunca achei que fosse uma pessoa fechada e fria, sinceramente. Acho que isso, com a pressão que tem agora no Benfica, também conta. E muita coisa vem de fora. Ele não era assim. Brincava com os jogadores, andava muito bem disposto, Acredito que longe das câmaras ainda seja esse o Roger Schmidt. Quero acreditar que sim», atira.

Alemães são mais certinhos

Após alguns telefonemas conseguimos encontrar alguém para nos mostrar o balneário onde Schmidt se equipava.

«Por norma já vinha equipado, mas gostava de vir sempre aqui. E nunca esqueceu as raízes. Como vê estão aqui lembranças do Paderborn e PSV, clubes também marcantes no seu percurso», mostra o ex-jogador, recordando uma das primeiras conversas que teve.

Este o relvado onde Roger Schmidt terminou a carreira de jogador e iniciou a de treinador (MIGUEL NUNES)

«Eu sentava-me ali no cantinho e estava sempre com medo porque achava que os outros eram muito melhores. Ele dizia-me para esquecer isso e que o resto viria sozinho. ‘Pensa menos e joga futebol’, dizia-me. Passamos muitas horas juntos…», diz, procurando explicar as suas razões para alguns jogadores alemães não terem vingado no Benfica: «A mentalidade é muito diferente. Nasci na Alemanha mas tenho apenas nacionalidade portuguesa. Os germânicos são mais certinhos, está tudo treinado, tudo em ordem, enquanto os portugueses são mais descontraídos, simples e abertos. E foi essa mentalidade que se calhar não fez com que pudesse fazer carreira aqui…»

O Benfica é uma equipa muito difícil de treinar. Se perdes um ou dois jogos... o treinador já não presta. Quando começou era o melhor, foi campeão, e depois já nada vale… No Benfica e em Portugal procuram sempre o mais fácil que é culpar o treinador e para mim é uma estupidez

Dário Figueiredo em conversa com a equipa de reportagem de A BOLA (MIGUEL MENDES)

Benfica como o Bayern

Foi com agrado que Dário recebeu a continuidade do técnico na Luz. E acredita que a melhor versão de Schmidt voltará a aparecer.

«O Benfica é uma equipa muito difícil de treinar. Se perdes um ou dois jogos... o treinador já não presta. Quando começou era o melhor, foi campeão, e depois já nada vale… No Benfica e em Portugal procuram sempre o mais fácil que é culpar o treinador e para mim é uma estupidez. Na Alemanha existe mais paciência, com exceção ao Bayern Munique que tem uma dimensão muito diferente dos outros», constata Dário Figueiredo, agora afastado do futebol, estando a liderar, com o pai, uma das maiores empresas de exportação de produtos portugueses na Alemanha.