A beleza do futebol
1- Algo que creio que a enormíssima maioria das pessoas que se dedicam a comentar o fenómeno do futebol em Portugal ainda não terá compreendido é que aquilo que nos mantém agarrados a este desporto, além da sua espetacularidade, é sem dúvida a sua imprevisibilidade. Há naturalmente a dimensão do sentimento de pertença, tanto a um local como a uma comunidade - os clubes projetam os emblemas a que nos associámos e nos representam como membros de uma comunidade - mas além disso há o sonho, a possibilidade, o saber-se que, apesar de tantas diferenças entre orçamentos, plantéis e tudo o que mais diferencie, quando o árbitro apita para o início do jogo são sempre 11 atletas de cada lado.
Vem a isto a propósito de apenas o futebol permitir que depois de um Vitória/Porto, para a Taça de Portugal a meio da semana, onde o meu clube talvez tenha tido a exibição menos conseguido da época no período Álvaro Pacheco, passados apenas quatro dias vai à casa do clube que o derrotou na quarta-feira vencer sem apelo nem agravo.
E, de facto, é esta imprevisibilidade, esta possibilidade de acontecer o que ninguém apostaria, este totobola da vida real que torna este desporto uma coisa especial.
2- O Vitória venceu o F.C.Porto em sua própria casa por 1-2. Com isso igualou o Sp.Braga em termos pontuais no 4.º lugar e ficou a apenas dois pontos de distância do adversário que derrotou este domingo. Depois das vitórias 2-3 em 1995/96 e em 2018/19, a época 2023/24 trouxe-nos uma nova vitória no Dragão, mais saborosa que as anteriores por nos colocar aritmeticamente a disputar as mesmas posições. Algo impensável no início da época e mais ainda após o início titubeante com muitos maus resultados e mudanças de treinador.
Com este resultado o Vitória atinge 5 vitórias consecutivas (desde a derrota em Guimarães contra o Casa Pia em 24.fev que para o campeonato o Vitória só sabe vencer) e alcança os 56 pontos, mantendo na mira o recorde de 62 pontos que é máximo de pontos que o meu clube conseguiu obter desde que a vitória vale três pontos (o que atingiu em 1995/96 e em 2016/17). Se tenho aqui repetido algumas vezes que está época tem sido da mais absoluta superação, já começam a faltar os adjetivos para a qualificar, jornada após jornada. E logo após duas qualificações europeias consecutivas, nas duas épocas anteriores. Estabilidade classificativa, finalmente!
3- Agora falta o resto da época. Faltam 6 jogos com 18 pontos em disputa; se o Vitória obtiver 40% dos pontos que disputará terá alcançado a melhor pontuação de sempre. Além de uma meia final da Taça de Portugal, novamente contra o F.C.Porto, onde disputaremos o acesso à que poderá ser a oitava final da nossa História. Assinalável.
E para o remanescente da época, não há como não nos inspirarmos nas declarações do Jota Silva que, com a sua humildade desconcertante, à pergunta sobre se foi especial marcar ao F.C.Porto respondeu que "o golo contra o Moncarapachense, para a Taça vale o mesmo que este aqui, no Dragão" e à pergunta sobre até onde pode ir este Vitória respondeu "para o Complexo preparar o próximo jogo".
É com esta postura de não agigantamento, de manutenção da humildade que tem caracterizado esta equipa, que o Vitória atingirá o que houver de atingir. Com ambições mas sem perspetivas. Com vontade mas nunca perdendo a humildade.