Taremi festejou golo anulado com Galeno / Imago - Foto: IMAGO

O ruído dos inocentes

Mais gente nos estádios, jogos competitivos, grandes golos e mais golos que na época passada. Isto até estava a correr bem

Isto até nem estava a correr mal de todo. Mais gente nos estádios a assistir aos jogos da Liga nas quatro primeiras jornadas, partidas com índices muito interessantes de competitividade com os clubes mais fortes a terem muitas dificuldades em vencer os seus jogos (4-0 do Benfica ao V. Guimarães foi uma exceção à qual não é alheia a expulsão precoce de um jogador vimaranense), grandes golos numa torrente significativa e não apenas nos encontros em que os clubes mais ricos em Portugal participam e uma média de golos marcados por partida superior à da época passada.

É bom focarmo-nos neste número: nas quatro jornadas realizadas até agora foram apontados 105 golos (e faltando ainda jogar-se o Moreirense-SC Braga, adiado para dar descanso aos bracarenses que tinham um decisivo play-off da Champions diante do Panathinaikos), mais 12 que há um ano. 26,25 golos por jornada em vez dos 23,25 de 2022/2023. Pode parecer pouco, mas era um sinal. Um bom sinal.

Quando se fala tanto da necessidade de exportar o nosso campeonato para lá de Badajoz, todas as tentativas de aproximação ao primeiro mundo são bem-vindas e dignas de aplauso. Tem havido um evidente esforço de fazer passar outra imagem quer no plano organizativo quer no das instituições, ao que se enquadra nestes novos ventos as futuras justificações do VAR para público ouvir.

Mas o que aconteceu no Estádio do Dragão no FC Porto-Arouca voltou a mostrar que o rei continua nu. Não falo do muito alongado tempo de compensação (justificado), nem sequer da avaria do VAR e da decisão tomada pelo árbitro Miguel Nogueira de reverter (e bem) um penálti com base numa chamada telefónica, procedimento previsto no protocolo do videoárbitro. Falo do que aconteceu depois e que tem muito a ver com aquele que é, provavelmente, o maior problema do futebol em Portugal: uma endémica sensação de suspeita. 

Talvez seja por esta razão que até agora ainda não se ouviu um único pedido de desculpa e só se lê comunicados de passa-culpas pelo insólito momento que serviu para exportar o campeonato português em modo meme. A culpa não é do clube promotor do espetáculo (FC Porto), nem da Cidade do Futebol, nem do Conselho de Arbitragem ou da empresa que presta o serviço ao VAR (Altice). Provavelmente iremos saber em breve que a culpa foi dos hackers do grupo Wagner que, à míngua de trabalho e à espera de conhecer o seu novo líder, vão-se entretendo em piratear sistemas informáticos de campeonatos situados na orla dos big5

É este caldo cultural que promove novelas com guião repetitivo, onde a gritaria se sobrepõe à razoabilidade em que a trapaça (sim, o que Taremi faz de forma repetida é social e desportivamente condenável) é promovida a virtude. Sejam bem-vindos ao passado.