Pouco depois de assumir o cargo nos azuis, o técnico falou com A BOLA sobre a sua carreira e os objetivos que quer alcançar no Restelo
0 seconds of 27 minutes, 44 secondsVolume 90%
Press shift question mark to access a list of keyboard shortcuts
A Seguir
SNTV Amorim
01:36
00:00
27:44
27:44
 

ENTREVISTA A BOLA João Nuno: «Não podemos deixar que os adversários dominem o Belenenses na Liga 3»

NACIONAL01.03.202511:45

Nesta segunda parte desta entrevista, o treinador da equipa de Belém recorda a sua carreira enquanto jogador, a ligação que forjou com Fabrício Garcia, agora jogador do Estoril, e a influência que o professor Manuel Sérgio teve na sua vida

— Com uma carreira de jogador feita em clubes da Margem Sul, como foi crescer nesse mundo das divisões inferiores do futebol, sendo que ainda chegou a jogar no Campeonato de Portugal?

— Eu fiz a minha formação sempre ligada aos estudos, que nunca deixei de parte, fiz a faculdade e a partir de um certo momento comecei a pensar muito como treinador. Depois, fui jogando em clubes, é verdade, de divisões baixas, mas muito importantes. O Barreirense, o Fabril, são clubes com história, com adeptos, com um passado muito grande do nosso futebol, não estão hoje ao nível que deviam estar, mas são clubes muito importantes e, portanto, orgulho-me desse passado, principalmente no Barreirense, onde foram 10 anos e cheguei a ser capitão da equipa sénior.

— Que curso tirou na faculdade?

— O curso de desporto, de educação física, ciências do desporto, onde me cruzei com a pessoa mais importante da minha formação, que é um belenense que faleceu recentemente, que é o professor Manuel Sérgio, e que esteve muito presente na minha vida. Foi orientador da minha tese final, foi professor, foi uma pessoa muito importante na minha carreira e esta foi uma semana dura por isso e nós queríamos muito dedicar-lhe a vitória [contra o Sporting B] e conseguimos, porque ele era uma pessoa que gostava muito do Belenenses. Eu fiz questão que estivesse uma foto do professor dentro do nosso balneário logo assim que chegámos. Foi uma semana dura por isso, fiquei muito triste com a partida de alguém tão importante na minha formação, um amigo e uma pessoa que eu recordo muito dos meus tempos de faculdade.

Tal como José Mourinho e Jorge Jesus, o treinador do Belenenses João Nuno também teve no professor uma pessoa emblemática na sua carreira
0 seconds of 1 minute, 21 secondsVolume 90%
Press shift question mark to access a list of keyboard shortcuts
A Seguir
SNTV Amorim
01:36
00:00
01:21
01:21
 

— Que posição desempenhava quando era jogador?

— Era médio-centro, era alguém que tinha boa perceção do jogo.

— Durante essa carreira nos escalões inferiores, o futebol era um passatempo enquanto ainda tentava decidir se iria ser treinador?

— Eu era um jovem que gostava de jogar e tinha a ideia de já olhar para o jogo não só como jogador, essa talvez era a minha diferença para alguns colegas. Eu questionava muito os treinadores porque é que estavam a fazer aquilo. Tenho um livro meu que comecei a escrever com 10 anos sobre futebol e que guardo religiosamente lá em casa da minha mãe.

— Pensa em publicá-lo?

— Ainda não tenho carreira para isso. Quando ganhar mais títulos, que é assim que eu espero, aí sim talvez possamos falar sobre isso.

«Apanhei jogadores como Beto, o guarda-redes, o Nenê e o Jota Silva» 

— É um livro com ideias que foi recolhendo ao longo dos anos?

— De bastantes equipas da altura, da seleção do Brasil, do Barcelona, do Real Madrid, ideias sobre o jogo, sistemas táticos... Portanto, eu já estava no jogo muitas vezes a pensar de outra forma e por isso também, se calhar, fui capitão de muitas equipas. Os meus colegas ouviam-me muito porque era alguém que percebia bem o jogo.

— Como surgiu a oportunidade de ser adjunto no Leixões em 2020?

— Foi o Tiago Fernandes, que foi assumir o cargo de treinador principal do Leixões e que me faz o convite para ir com ele. Na altura estava no Cova da Piedade B e na equipa de sub-23, e achei que era uma boa experiência. Nunca tinha estado do lado do adjunto, falei com o Tiago, nós temos uma boa relação, porque gostava de perceber o treino do outro lado. Foi importante porque o Leixões também é um grande clube, com muita história. Apanhei alguns jogadores muito importantes até no futebol português, como o Beto, o guarda-redes, fazia parte desse plantel, o Nenê, o Jota Silva, que agora está a brilhar na Premier League. Esse tipo de jogadores também te faz pensar e tu próprio crias outras ideias sobre o jogo.

João Nuno foi adjunto da equipa de Matosinhos em 2020, onde conviveu com alguns «jogadores importantes» no futebol português
0 seconds of 1 minute, 32 secondsVolume 90%
Press shift question mark to access a list of keyboard shortcuts
A Seguir
SNTV Amorim
01:36
00:00
01:32
01:32
 

— Ficou quanto tempo no Leixões?

— Alguns meses, apanhámos a altura do Covid-19, a pré-época foi muito mais longa e depois fizemos seis jogos e acabámos por sair no final dessas jornadas. Uma decisão que faz parte do futebol, mas foi uma experiência muito importante para mim.

— Depois vai para o Fabril na mesma época, no Campeonato de Portugal, onde acaba por descer à distrital, mas logo a seguir é lá campeão com 98 pontos.

— Quando vou para o Fabril, o clube estava no último lugar, quase com uma missão impossível de não descer, fui muitas vezes aconselhado a não aceitar.

«Quem só sabe de futebol, nem de futebol sabe» 

— O míster parece gostar desses desafios quase impossíveis.

— Porque acredito no que faço e acredito sempre que posso melhorar as coisas. E olhei e achei que podia melhorar. O que aconteceu foi que a cinco minutos do fim nós estávamos com a permanência garantida. Sofremos um golo nos descontos e acabámos por descer, mas o trabalho foi tão bom que o presidente convidou-me logo para pensarmos no projeto da subida. No ano seguinte fomos campeões sem margem para dúvidas. Batemos quase todos os recordes que existiam no campeonato da Associação de Futebol de Setúbal. Na época seguinte, o Fabril, que tem sido sempre uma equipa com muitas dificuldades, estava em 5º lugar, a cinco pontos do primeiro. Ganhámos ao Atlético, que acabaria por subir, depois empatámos fora e o presidente achou que quem vence o Atlético tinha que estar em 1.º e acabei por sair. Depois sou convidado para o 1.º Dezembro no ano seguinte, também numa situação complicada, e acabámos por conseguir o objetivo [da manutenção].

João Nuno falando com A BOLA (Foto: A BOLA)

— A situação que encontra agora no Belenenses é igualmente complicada?

— É totalmente diferente. Nós estamos aqui a jogar a fase de subida à Liga 2, é diferente de entrares no último classificado. Embora haja aqui a questão de um Belenenses ter poucas vitórias em tantos jogos, mas não tem nada a ver. Era muito mais difícil a missão que tínhamos pela frente no Fabril, por exemplo, do que aqui. Embora aqui, vai ser difícil pela competitividade e pela qualidade dos adversários.

— No Fabril trabalhou com Fabrício Garcia, que agora joga regularmente no Estoril. Na altura já julgava que estava ali um futuro craque? 

— A história do Fabrício... dava para estarmos aqui a tarde toda. Eu acho que sou alguém importante na vida do Fabrício a todos os níveis. Não só como treinador, também como amigo. Eu e a minha família temos uma relação muito especial com ele. A história é muito rápida. Eu vou ver um avançado para o Fabril, numa equipa que disputava a Liga 3, o Oriental Dragon, o Fabrício estava lá à experiência. Fui ver o treino para ir buscar um avançado e quando acabou o treino, disse ao treinador que não queria o avançado, mas queria o Fabrício. Falei com o presidente do Fabril na altura, o Faustino Mestre, e disse: “Presidente, eu sei que o Fabril não tem nenhum contrato profissional, mas vai fazer o primeiro porque este menino é especial. Tem um talento que eu não via há muito tempo, da rua, de futebol que já não existe hoje em dia.” E ele acreditou em mim a 100%. Demos casa ao Fabrício, o Fabril deu todas as condições ao Fabricio para ele viver porque ele é de Cabo Verde e estava cá sem família. Nós ajudámos, o Fabrício ajudou-nos muito também, pegou o futebol dele e acabou por ajudar o Fabril, que ganhou depois com a sua transferência. E ajudou dentro do campo também. É um menino especial e acredito que ainda possa continuar a subir muito mais. 

Treinador do Belenenses contratou o jogador cabo-verdiano quando orientava o Fabril
0 seconds of 2 minutes, 6 secondsVolume 90%
Press shift question mark to access a list of keyboard shortcuts
A Seguir
SNTV Amorim
01:36
00:00
02:06
02:06
 

— Como é que balança o aspeto tático e mental nas suas equipas? 

— Vou recordar outra vez o professor Manuel Sérgio. A primeira vez que eu disse ao professor que eu queria ser treinador ele foi-me buscar uns livros. Eu pensei que ele ia-me dar livros de táticas e não foi nada disso. Deu-me livros sobre a parte humana, porque são pessoas que jogam futebol e primeiro temos de perceber o lado humano e depois sim a parte do jogador. E é isso que eu procuro nas relações com os jogadores. Gosto de ser sincero, direto, como estou a ser aqui. Não gosto de muitos truques. E os jogadores percebem isso. Eu vou dizer-lhes algumas coisas muito boas, mas também vou dizer-lhes algumas coisas más, porque o meu pai também me dizia. E não vou mudar em nada, porque é isso que acredito. Foi isso que o professor Manuel Sérgio me ensinou. Ele não ensina futebol a ninguém, ensina que é muito mais importante o lado humano do que só as táticas ou só saber de futebol. Quem só sabe de futebol, nem de futebol sabe. 

Manuel Sérgio: um livre pensador

21 fevereiro 2025, 11:00

Manuel Sérgio: um livre pensador

Poder-se-ia cair na tentação de dizer que com Manuel Sérgio se encerra um ciclo, mas quem o fizer está a mentir

— Quais são os seus maiores objetivos enquanto treinador? 

— Continuar a ter prazer e a acordar com esta alegria que estou a acordar todos os dias. Vou para o treino e não vou trabalhar, vou fazer o que eu gosto, muito motivado. E quero continuar a subir na carreira. Tenho vindo de baixo, mas vai dar muito prazer chegar lá acima.   

— Chegar lá acima é chegar à Liga ou a UEFA Champions League

— Sim, quero chegar à Liga, é esse o meu objetivo. Para chegarmos à Champions, primeiro temos de chegar ao topo em Portugal. Acredito que vamos chegar e quero chegar aos campeonatos profissionais rapidamente, se possível, daqui a uns meses, com o Belenenses. 

— O Belenenses no ano passado esteve na Liga 2 e ficou no último lugar. O que é que o clube terá de fazer de diferente caso suba agora à Liga 2? 

— Falei disso ao presidente desde a primeira conversa com ele. Disse que, para chegarmos à Liga 2 e conseguirmos ficar lá, temos de ser muito mais constantes na Liga 3. Não podemos deixar que os adversários dominem um jogo na Liga 3 perante o Belenenses, porque ao passarmos para o patamar seguinte, maiores as dificuldades vão ser. Portanto, temos de nos afirmar como uma equipa dominadora nesta Liga 3, para quando chegarmos ao patamar seguinte estarmos preparados. E é isso que estou a procurar fazer em todo o clube, em todos os departamentos, desde o posto médico, de toda a gente pensar de forma cada vez mais profissional e criarmos uma estrutura pronta para, quando chegarmos à Liga 2, não sentirmos dificuldades e estarmos preparados para não só chegar lá, mas ficar lá de forma consistente. Acho que é isso que faltou ao Belenenses quando deu o passo. Não era consistente o suficiente na Liga 3 para ser competitivo na Liga 2, na minha opinião. 

0