‘Fatal’ grita Vitória ou como a ‘borboleta’ está a conquistar a Série B do Brasileirão
A aposta do site de anúncios de acompanhantes começou pelo popular clube de Salvador, na Bahia, que praticamente já garantiu a promoção à Série A, e rapidamente se estendeu a mais sete clubes
A borboleta conquistou, em poucos meses, a Série B do Brasileirão, tendo conseguido resistir a todos os focos de polémica, sobretudo num meio conservador como é o futebol. O que não foi fácil, reconheça-se, tratando-se de um site para adultos, de anúncios de acompanhantes, as conhecidas garotas de programa.
Foi precisa muita perseverança e também muito dinheiro investido, embora neste caso os prémios monetários em cima da mesa sejam tema tabu. Ninguém abre o jogo, limitando-se os clubes a reconhecer, na sua generalidade, estarem perante o maior investimento alguma vez feito por uma marca para promover o seu nome nas mangas do uniforme de jogo.
A verdade, porém, e se é daqueles que gostam de acompanhar o futebol brasileiro, é que muito provavelmente já se deparou com a marca Fatal Model estampada na camisola de alguma equipa, ou então, em placas publicitárias espalhadas pelos estádios, sempre com as palavras de ordem de «Respeito, Segurança, Dignidade».
De início, a parceria entre um site que reúne a mais velha profissão do mundo e o futebol pode ter causado estranheza para quem seguia os jogos, nos estádios ou pela televisão. Com o tempo, a ideia acabou por ser assimilada e do apoio, direto, a um clube, o site passou a promover a sua marca e mensagens em mais sete clubes de competições nacionais (dois da Série C, mas já com presença garantida na Série B em 2024), e ainda apostou no futsal feminino, ao patrocinar, em maio último, o BRFutsal Tour.
Como tudo começou
Criado em 2016, a Fatal Model iniciou uma estratégia de publicidade em 2020, focando-se em conteúdos educativos nas redes sociais, num blogue e num canal no YouTube. Em simultâneo, o site tornou-se patrocinador de podcasts e, em paralelo, as portas do futebol começaram a abrir-se.
Assim, e depois de patrocinar clubes menores e aparecer em algumas placas publicitárias na Copa do Brasil e Brasileirão em 2022, a Fatal Model, maior site de acompanhantes de luxo do Brasil, recorde-se, ganhou destaque e visibilidade ao assumir, em fevereiro, a sponsorização das mangas da camisola do Vitória, clube que estava de regresso à Série B e enfrentava extremas dificuldades de tesouraria.
«O acordo é válido para toda temporada de 2023 e marca um momento histórico no futebol brasileiro. Através do Leão será transmitida uma importante mensagem para mostrar que todos os cidadãos e profissionais são dignos de respeito, segurança e dignidade. Com o objetivo de derrubar tabus relacionados com os acompanhantes, o clube e a empresa afirmam com esta parceria o seu inteiro apoio na construção desses valores, articulando a consciencialização da sociedade», podia ler-se no comunicado conjunto do site e do clube, ainda em fevereiro.
Mas nem toda a gente gostou deste acordo e, desde logo, a parceria tornou-se polémica. Sobretudo junto dos adeptos mais conhecidos e influentes, social e culturalmente, do Vitória. A todos, Fábio Mota, presidente do clube, respondeu, repudiando as críticas e justificando o patrocínio com as urgentes necessidades financeiras do emblema de Salvador.
«Este é o maior valor que o clube já recebeu por um patrocínio numa manga. Vocês conhecem a realidade financeira que encontrámos no Vitória. Dependemos dos patrocinadores para sobreviver e hoje estamos muito felizes por contar com um patrocinador de nível nacional, que escolheu o Vitória. É um motivo de orgulho para nós, ontem pudemos pagar os salários dos jogadores, hoje dos funcionários, graças a este acordo de patrocínio», disse, então, o dirigente.
Patrocínio fora da curva
A Fatal Model tornou-se, assim, um ponto fora da curva no mercado de patrocínio desportivo no Brasil. Num segmento ainda marcado por tabus, a empresa procurou, através de uma presença marcante no futebol, ampliar o seu raio de ação para dignificar a estigmatizada profissão.
«Começámos a investir em patrocínio com podcasts. Em seguida, identificámos que o futebol tem um público grande e ligado ao perfil de consumidores do nosso site. Então, o desporto tornou-se um espaço para atingir cada vez mais pessoas e transmitir os nossos valores de marca», explicou recentemente Nina Sag, sexóloga, acompanhante e diretora de comunicação da Fatal Model, ao Lance! Biz.
Além de patrocínios pontuais e publicidade estática, a Fatal Model ainda patrocina os campeonatos estaduais de estados como Rio de Janeiro, Bahia, Santa Catarina, Ceará e Goiás. Só em fevereiro último, como atrás referimos, surgiu o primeiro patrocínio fixo com um clube tradicional.
De início, o contrato com o Vitória foi assinado até final de 2023 e a marca era exposta, apenas, nas mangas da camisola. Mas os resultados positivos nos primeiros meses de parceria levaram a uma ampliação do vínculo de forma antecipada. Por isso, desde julho, o logo do site Fatal Model figura na frente da camisola e o novo contrato é agora válido até ao fim de 2024.
Assim, e em menos de seis meses, o vínculo do Vitória à Fatal Model foi ampliado e a marca ganhou ainda mais destaque na camisola do clube baiano, tornando-se um dos patrocinadores master, sendo já praticamente certa, nesta altura, a promoção à Série A do histórico clube de Salvador (matematicamente, falta 1 ponto em 3 jornadas), fundado em 1899, e que ostenta no palmarés, orgulhoso, 28 títulos estaduais (o último em 2017), quatro copas do Nordeste, um Supercampeonato Baiano e um Torneio José Américo Almeida Filho (antecedeu a Copa do Nordeste).
Para o anúncio do reforço da união entre a Fatal Model e o Vitória, o clube de Salvador escolheu o ídolo Vampeta, antigo internacional brasileiro, campeão do Mundo em 2002 (Coreia e Japão), o site de acompanhantes fez-se representar por Raquel Pacheco, conhecida pelo pseudónimo de Bruna Surfistinha, a escritora, DJ, roteirista e empresária brasileira que trabalhou como prostituta e atriz de filmes pornográficos. E, para seduzir os adeptos, o site lançou uma promoção de até 90 por cento no acesso aos conteúdos da plataforma.
De uma forma geral, um dos principais objetivos da Fatal Model ao investir no futebol, além da visibilidade e das receitas, «é transmitir valores, educar o público e discutir a questão da regulamentação da profissão de acompanhante, legalizada desde 2002 no Brasil mas que ainda não recebeu segurança jurídica ou social», pode ler-se no blog da startup.
Ainda segundo Nina Sag, na referida entrevista ao Lance! Biz, já é possível ver resultados práticos desta estratégia de comunicação: «Queremos produzir conteúdos educativos sobre a profissão de acompanhante e vemos uma mudança grande de comportamento por parte do público. Algumas pessoas que antes faziam piadas e brincadeiras, agora respeitam e defendem-nos de comentários preconceituosos.»
Oito clubes com a ‘borboleta’
Depois da aposta no Vitória, e esbatidas as iniciais ondas de choque provocadas pela associação de um site de adultos ao futebol, a Fatal Model prosseguiu a ampliação dos seus investimentos nas séries B e C, patrocinando, de momento, mais sete clubes.
O Brusque, de Santa Catarina, que jogou a Série C e garantiu a promoção, é o mais recente aliado da borboleta, tendo o acordo permitido, desde logo, saldar algumas dívidas de tesouraria. Também o Paysandu, de Belém, do Pará, outro dos clubes com lugar reservado na Série B em 2024, tem acordo com a Fatal Model para o próximo ano.
Ainda em competição na Série B, Tombense (Minas Gerais), Ponte Preta (São Paulo), Sampaio Corrêa (Maranhão), ABC (Rio Grande do Norte) e CRB (Alagoas) estabeleceram acordos de patrocínio com a Fatal Model desde o início de setembro.
Um investimento crescente no futebol que, de acordo com Nina Sag, a sexóloga, acompanhante e diretora de comunicação do site, visa romper as barreiras enfrentadas pela profissão. «Temos tentado intensificar a nossa presença no futebol nos últimos meses. Acreditamos que esse é um meio ideal para combater os preconceitos que ainda cercam a profissão. O desporto é uma paixão nacional e traz a visibilidade necessária para que os nossos ideais se propaguem. É muito gratificante ver cada vez mais clubes abertos ao debate e alinhados com a causa. Essas parcerias têm gerado grandes resultados», revelou em outubro, na ocasião do acordo com o Tombense.
Apostas demasiado arrojadas
Muito antes da presença significativa da Fatal Model no Brasileirão série B, já outros sites exclusivamente para adultos tinham tentado reforço de notoriedade através do futebol. Primeiro exemplo, com repercussão mediática e expressão planetárias, a aposta, no Reino Unido, do site da indústria de filmes pornográficos PornHub num clube de futebol universitário, o Rutherford Raiders. A experiência, no entanto, na foi a melhor, já que o clube acabou banido devido ao patrocínio.
Uma contrariedade que não inviabilizou que, em 2015, o PornHub tenha tentado também patrocinar clubes italianos. Chegou mesmo a abrir candidaturas para eventuais clubes interessados.
«Pensamos num modo significativo de envolver a nossa grande comunidade italiana. E esta parece ser a forma mais adequada. Encorajamos todas as equipas a enviarem-nos as suas candidaturas. Analisá-las-emos e estamos ansiosos para trabalhar com a vencedora», afirmou, na ocasião, Corey Price, que era vice-presidente do portal.
Paralelamente, no outro lado do Atlântico, em Boston, Massachussets, um jovem clube amador, fundado apenas em 2014, o Washington Square FC, que joga nas divisões amadoras dos Estados Unidos, tornou-se notícia um pouco por todo o mundo no verão de 2017 graças ao seu então novo patrocinador. O site Redtube tinha decidido avançar para o apoio à equipa norte-americana e as imagens das novas camisolas tornaram-se virais nas redes sociais.