«Estamos fartos de ver o nome do Benfica arrastado pela lama»
No dia em que João Noronha Lopes formaliza a (nova) candidatura à presidência do Benfica, A BOLA publica uma entrevista com o gestor e empresário de 58 anos. Neste excerto da conversa, o candidato fala das suspeitas de corrupção que envolvem o Benfica, revela a intenção de avançar com uma nova auditoria, caso venha a ser eleito presidente, e promete transparência caso venha a assumir a liderança do emblema da águia.
- Nuno Catarino, CFO do Benfica, tem insistido no objetivo de 500 milhões de euros de receita consolidada do grupo. Parece-lhe uma meta razoável?
- Acho que não basta ter o objetivo de atingir receitas, temos de perceber como é que lá vamos chegar. E quando se olha para a situação financeira do Benfica, é preocupante, porque nós vemos que a situação dos capitais próprios e da dívida, nomeadamente a dívida de curto prazo, tem de ser olhada com cuidado. Quando olhamos, por exemplo, para aquilo que são os fornecimentos e serviços externos, o que assistimos desde 2019? Os chamados FSE aumentaram de 54/55 milhões de euros para quase 90 milhões. Muito acima daquilo que é gasto pelos nossos rivais. Durante esse período, as despesas com a operação do estádio triplicaram, e são quase o mesmo do que aquilo que gastam os nossos rivais. E, além disso, continuamos ver que as receitas e as despesas correntes continuam a estar desequilibradas. O Benfica tem de olhar para a questão dos custos e ser muito mais rigoroso na maneira como gasta o seu dinheiro, tem de procurar ser mais eficaz no equilíbrio entre as receitas e as despesas correntes e também deve ir à procura de outras fontes de receitas, que não estão a ser devidamente aproveitadas...
Deixe-me dar-lhe dois ou três exemplos. Acho que há muito que o Benfica pode fazer no aproveitamento daquilo que é a receita de dia de jogo, nomeadamente criando condições comerciais para melhor aproveitamento da zona envolvente do estádio e melhorando a experiência. Acho que o Benfica tem muito a fazer em termos da produção de conteúdos digitais que liguem os adeptos ao clube e em associação com algumas plataformas de streaming, como a Netflix ou a Amazon. Acho que o Benfica pode e deve fazer mais sobre as suas receitas de merchandising. Dou-lhe um exemplo: eu não entendo como é que o Benfica, sendo um parceiro de longo prazo da Adidas, esteja na terceira divisão dos patrocinados pela marca, a par do Leeds. Não consigo entender. E isto tem implicação na relevância que se dá aos produtos do Benfica nas lojas da Adidas de todo o mundo. E depois acho que há um potencial ainda por explorar relativamente ao franchising das escolas de futebol do Benfica, nomeadamente fora de Portugal, e que pode ser uma forma extraordinária de expandir a marca. Eu, dentro da equipa que tenho, vou ter uma pessoa que é das mais qualificadas em termos de crescimento das marcas e com conhecimento digital para o poder fazer. E é uma área que tem, obviamente, que ser muito melhor aproveitada.
- Quem é, já agora?
- Os benfiquistas saberão a seu tempo, mas garanto-lhe que o clube vai ficar muito bem entregue com alguém que sabe muito daquilo que é fazer crescer uma marca e conseguir potencial internacionalmente.
- A propósito de receita, temos também a questão do naming do estádio. A Direção tem referido várias vezes que há propostas em cima da mesa, mas que ainda nenhuma foi ao encontro daquilo que é desejado. Como é que tem acompanhado esse processo e qual a sua posição atual relativamente ao tema?
- Eu não conheço os detalhes dessa negociação, sei que o Benfica tenta há muito tempo um patrocinador para o naming do estádio. É algo que não é para ser cedido por uma quantia que não reflita a grandeza do Benfica. Segundo ponto: temos de ter cuidado com a escolha dos patrocinadores, porque obviamente tem de ser uma marca com uma reputação e com um prestígio que esteja alinhada com aquilo que é a reputação e o prestígio do nosso clube.
- Que valor é esse?
-É uma situação que irei analisar. Circulam por aí alguns valores... Eu acho que mais do que estar a avançar com o valor, é preciso sentarmo-nos com várias pessoas e perceber exatamente aquilo que o Benfica pode conseguir num contexto de mercado e ouvindo várias propostas.
- Como é que olha para as acusações de corrupção que têm caído sobre o Benfica nos últimos anos, chegando à via judicial?
- Eu e todos os benfiquistas estamos fartos de ver o nome do clube ser arrastado pela lama. Até hoje o Benfica ainda não foi condenado em nenhum processo judicial. Aquilo que eu posso garantir aos benfiquistas é que, seja em que circunstância for, eu serei intransigente na defesa dos interesses do clube.
- Considera que a Direcção atual tem sido intransigente na defesa dos direitos do clube?
- Como digo, são processos que estão, muitos deles ainda, a correr. E eu não vou fazer aqui nenhum comentário que possa pôr em causa aquilo que é a defesa dos interesses do Benfica. Eu serei intransigente na defesa daquilo que são os interesses do clube e dos seus associados.
- Ficou satisfeito com a auditoria que esta Direção fez? Se for eleito, fará uma auditoria nova e irá revelá-la aos sócios?
- Não fiquei satisfeito com esta auditoria, não só porque o alcance da mesma é limitado, como também pela forma como ela foi partilhada com os sócios em véspera de uma Assembleia Geral onde a mesma seria discutida. E respondendo à sua pergunta, sim, farei uma auditoria. Acho que é fundamental compreender o passado para construir o futuro. Uma auditoria é um ato normal de gestão em quem vai entrar num novo clube e isso é o que vou fazer e que me comprometo perante os sócios.
- Até quando, já agora?
- Um período que seja suficientemente longo para que a nova administração possa apurar os factos e possa corrigir aquilo que tem de ser corrigido. Deixe-me só acrescentar, relativamente à transparência, dois ou três pontos. Nós temos de ser mais transparentes. E tenho duas ou três medidas que acho que são fundamentais. A primeira é a introdução de um Portal de Transparência em que estejam várias coisas: seja o Relatório e Contas ou o orçamento, mas de uma forma que seja explicada e fácil de entender pelos sócios, onde estejam claramente as remunerações dos órgãos sociais e qual o critério que presidiu às remunerações variáveis ou aos bónus; onde estejam todos os contratos e as comissões que foram pagas a vários agentes durante as épocas desportivas; em que existam regras muito claras, através da aplicação do Código de Ética relativamente à contratação de fornecedores, nomeadamente a obrigatoriedade em que acima de um determinado valor nós tenhamos que envolver vários fornecedores. E depois acho que há aqui um ponto muito importante: em todas as eleições se fazem promessas, e é preciso que os benfiquistas percebam quais as que estão a ser cumpridas e quando. E, portanto, uma das coisas que eu quero ter nesse Portal de Transparência é um relatório sobre a execução do programa eleitoral, para que os benfiquistas possam ir fazendo a sua avaliação até ao final do meu mandato.
Veja a entrevista na íntegra:
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