DÉRBI DOS DÉRBIS Sonhei que havia civismo, mas depois acordei
Há dois tipos de adeptos de futebol: os civilizados e os incivilizados. Estes últimos estão a tomar conta da atualidade e isso é extremamente preocupante para o Grande Dia
Existem dois tipos de adeptos de futebol (estava tentado a dizer dois tipos de seres humanos, mas os meus estudos de antropologia são limitados e receio errar nalgum termo científico). Voltemos aos adeptos de futebol: existem os civilizados e os incivilizados.
Os civilizados sofrem, discutem, defendem as suas verdades. Exaltam-se nalguns casos, noutros roem as unhas e deixam dentro de si o que lhes vai na alma, ou seja lá onde for que está a paixão irracional (não são todas?) pelo seu clube.
Escolhem gostar de picardias saudáveis e amigáveis ou recolher-se no seu canto na hora dos grandes jogos e das grandes decisões. Decidem se querem brincar com um amigo adversário no dia seguinte ou se preferem nunca o fazer porque lhes dói muito quando isso lhes é feito.
Não, não são todos santinhos que vão a correr dar os parabéns ao rival por uma vitória. Durante os jogos enervam-se, dizem asneiras, maldizem o árbitro. Podem até gritar umas palavras de ordem menos bem educadas no meio da rua se forem numa caixa policiada a caminho do estádio do adversário, ou aproveitar o facto de estar em casa para um ou outro excesso de linguagem. Bem estaríamos se tudo ficasse nestas fronteiras.
A um dia do dérbi mais decisivo da história do campeonato português (nunca ambos puderam ser campeões no mesmo jogo), Lisboa e o País estão a transformar-se num barril de pólvora. Os incivilizados estão a tomar conta da atualidade e por mais dispositivos de segurança que se preparem há sempre algo que pode escapar ao controlo das autoridades e tornar-se num caso muito sério.
Quando acordei do meu sonho, onde uns estavam eufóricos e outros absolutamente desolados, algo que faz parte (e ainda bem) daquela paixão irracional, li que havia estátuas de uns pintadas com as cores dos outros. Ao longo do dia houve relatos de casas e núcleos vandalizados. Já mais à noite chegou a notícia de esfaqueamento de pessoas. Esfaqueamento! Pensemos naquilo de que estamos a falar.
Um esfaqueamento é inadmissível em qualquer contexto, mas por causa de um clube de futebol? Por causa de um clube, really? Talvez não seja só isso, mas o facto de o futebol servir de detonador já é extremamente preocupante.
Não sei o que vou sonhar na próxima noite. Pode até ser com Gaza, ou com a Ucrânia. A necessidade de civismo é universal e anda pelas horas da morte. Que tudo corra bem amanhã.