Schmidt não é Guardiola
Roger Schmidt Foto: Sérgio Miguel Santos/ASF

Schmidt não é Guardiola

OPINIÃO28.11.202309:11

Catalão foi contratado pelo Bayern, arranjou professora e falou alemão na apresentação

No fim de abril de 2012, Pep Guardiola comunicou que não seria mais o treinador do Barcelona, depois de ter conquistado duas Ligas dos Campeões, duas Supertaças Europeias e dois Mundiais de Clubes. Em meados de janeiro do ano seguinte chegou a acordo para treinar o Bayern de Munique e, em junho, na conferência de Imprensa de apresentação no novo clube, perante uma multidão de jornalistas, falou em alemão.

Quando deixou o Barcelona Guardiola disse que não tinha nenhuma proposta de outro emblema e que iria tirar um ano sabático para refletir sobre o passado de sucesso e preparar-se para desafios futuros igualmente exigentes. A partir da altura em que chegou a acordo com o Bayern a sua principal preocupação foi aprender a língua alemã, da qual não conhecia uma palavra, como confessou. Foi viver para Nova Iorque, contratou uma professora e a 24 de junho de 2013, na cerimónia de apresentação, perante uma plateia de quase três centenas de representantes de órgãos de comunicação, falou em alemão durante parte da conferência.

Como Pep não é Schmidt, nem Roger é Guardiola, cada qual vê as coisas à sua maneira. O catalão respeitou a identidade do clube bávaro, em que a língua materna é única entre dirigentes e funcionários. O alemão prometeu fazer um esforço quando chegou, mas ano e meio depois chegou-se a uma situação desagradável e que colide com a grandeza do Benfica. A chamada estrutura devia ter-se protegido, de modo a evitar cenários pouco profissionais, e o próprio Roger Schmidt, podendo recusar expressar-se em português, tem a obrigação de, pelo menos, dizer o básico e entender muito mais do que isso. De certeza que ganha o suficiente para contratar uma professora sem afetar o seu orçamento familiar…

Champions a zero

O jornalista Nuno Paralvas assinou a crónica do jogo Benfica-Famalicão, em BOLA, e criou um título que, em cinco palavras, resume de forma feliz a história do jogo e o desempenho da equipa encarnada. «Contas feitas: cinco minutos à Benfica», entre o autogolo de Riccieli e o golo de Rafa com a expulsão de Otávio de permeio.

Tudo espremido, de significativo é o que se destaca do trabalho coletivo de quem lidera a classificação da Liga sem ter ainda a casa arrumada, como este jogo mostrou.

A equipa continua mal arrumada e João Pedro Sousa, um treinador com quem nunca falei mas que muito aprecio, foi bom conselheiro ao suscitar problemas e identificar ruídos na organização encarnada que precisam ser eliminados antes de um jogo de muita responsabilidade, amanhã, frente ao Inter, do Grupo D da Liga dos Campeões, em que o Benfica ocupa o último lugar, sem pontos e um mísero golo marcado, continuando a atormentar os adeptos com a eventual repetição da vergonha de 2017/2018.

Pagar o que se paga a Schmidt só para consumo interno parece-me excessivo, nem acredito que tivesse sido contratado só para isso, porque, em entrevista ao canal do clube, em setembro último, Rui Costa afirmou que este plantel é melhor e não custa mais um euro. Disse também que, na época passada, ficou «o amargo de boca de não termos ultrapassado os quartos de final da Liga dos Campeões». O mesmo Rui Costa que há uma semana, na gala Quinas de Ouro da FPF, teve o cuidado de endereçar a Roger Schmidt muito do mérito pela conquista do título 38. O presidente acredita no seu treinador e este, certamente, sente-se com saber e competência para lhe retribuir essa prova de confiança com mais títulos importantes, intramuros e, principalmente, no espaço da UEFA. São realidades incomparáveis, sem dúvida, mas parece-me que Schmidt, embora conhecendo a história da águia, ainda não foi capaz de avaliar a sua real dimensão.

Moura/Jurásek

Em novembro de 2020, na sétima jornada do campeonato, o SC Braga, treinado por Carlos Carvalhal, venceu o Benfica, por 3-2, com dois dos golos bracarenses apontados por Francisco Moura, um jovem que surpreendeu e deixou a sua marca. Pouco depois, uma lesão grave obrigou-o a prolongada paragem.

Este sábado, na Luz, voltou a destacar-se, por querer ser feliz outra vez no palco em que se projetou. Não deixa de ser intrigante o descuido dos clubes mais abastados em relação às nossas camadas jovens. Neste caso, sendo António Salvador um presidente que vê mais depressa e mais longe do que a maioria, leva-me a acreditar que algum motivo haverá para ter cedido metade do passe de Moura ao Famalicão, a preço de amigos.

Grimaldo saiu e na Luz alguém decidiu gastar catorze milhões em Jurásek, um lateral que ainda não justificou a loucura que se pagou por ele, embora tenha dado sinais de não ser tão mau quanto dizem. Por outro lado, nem sei se Francisco Moura terá estrutura mental para suportar a pressão de um grande clube, como o Benfica. Bizarra é esta discrepância na avaliação de jovens futebolistas, em nítido prejuízo do mercado interno. Porquê ir lá fora quando temos cá dentro igual ou melhor e mais barato? David Carmo foi uma estranha exceção. São os mistérios do futebol…

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