Que não se apague o jornalismo
Mesmo com todas as horas de intermitência, primeiro, e inatividade, mais tarde, A BOLA obteve na segunda-feira excelentes resultados na afluência ao site. O dia do Apagão constituiu-se, aliás, como um dos dois melhores do mês em número de utilizadores que nos procuraram para saber o que queriam saber e a falta de eletricidade não deixou durante tanto tempo. Deduzo, por maioria de razão, que o mesmo se tenha passado com os outros órgãos de Comunicação Social, generalistas ou desportivos, até porque estes também acompanharam a par e passo, dentro do possível, os desenvolvimentos daquelas horas distópicas.
Num período marcado pela maior crise de sempre do jornalismo — económico-financeira, sobretudo, mas não só — este é um sinal de esperança. É a certeza de que muitas pessoas ainda sabem onde procurar informação rigorosa e escrutinada. Confiam no trabalho de mediação e percebem que — ainda que com erros cometidos, por enquanto somos quase todos humanos — podemos ajudar na separação entre o trigo das notícias verdadeiras e o joio das falsas.
Os perigos da desinformação, porém, estiveram bem à vista na maldita segunda-feira. Minutos depois do incidente os criminosos espalharam a informação de que a causa teria sido uma explosão em França; depois passou a ser uma explosão no País Basco; não sei se chegaram a falar de outra, sei lá, na Picheleira ou no Bolhão. Um pouco mais tarde, um ou vários chicos-espertos elaboraram uma história bem estruturada que defendia a teoria de um ciberataque russo, com o Kremlin a negar, Ursula Von der Leyen a comentar e informações sobre embarcações russas avistadas em águas da NATO.
Quando ainda havia umas réstias de comunicação, esta teoria pegou e de que maneira. Cada português terá recebido esse texto — ardilosamente atribuído à CNN — umas três ou quatro vezes, no mínimo. E muita gente acreditou que era verdadeiro, mesmo que a própria CNN se tenha apressado a esclarecer. Sabemos, contudo, que um boato, uma vez lançado, fica difícil de mitigar.
É também para isso que há jornalismo. Que, vá lá perceber-se!, tem de ser feito por jornalistas. E esses estão cada vez menos protegidos e cercados de ameaças, desde as empresas em dificuldades aos consumidores que pirateiam, passando naturalmente pelas fake news.
Tal como com a energia elétrica, só conseguiremos ter noção da falta que o jornalismo faz se um dia ele se apagar.