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A senhora da gadanha é implacável. E estúpida, já agora...
A propósito das mortes de Diogo Jota e de André Silva, revejo-me nas palavras de Abel Ferreira: estamos todos na fila. E nas de Jurgen Klopp: deve haver um propósito maior, mas não consigo vê-lo. De resto, meus caros, de Ronaldo a Messi, de Trump a Putin, de Al Pacino a Madonna, somos apenas moscas a cheirar o cocó do cavalo do servo do rei do Butão.
Que interessa agora se Ronaldo foi ou não foi ao funeral? Que interessa se deu ou não deu as condolências à família? Que interessa se enviou ou não enviou flores? Que interessa se quis ou não quis interromper as férias? Que interessa se foi ou não ao funeral ainda por causa da dor que sentia pela morte do pai há quase 20 anos? Que interessa se ele decidiu não ir a Gondomar para evitar tornar a morte de dois jovens num circo mediático? É Ronaldo (e só Ronaldo) quem tem de gerir a melhor forma para lidar com a morte de Diogo Jota (e André Silva). É ele quem decide qual a maneira ideal para fazer o luto. Que interessa o que cada um de nós pensa sobre o facto de ele não ter ido ao funeral? Nada disso é importante. Nem sequer vagamente importante ou interessante: zero vírgula zero. Somos todos moscas a cheirar o cocó do cavalo do servo do rei do Butão. E estamos todos na fila. Indiana, presume-se. Uns mais na parte da frente da fila, sim, outros mais atrás. Mas todos, um dia, nos encontraremos com a senhora da gadanha.
Mas ela é implacável e, por vezes, atua de forma estranha e parva. Como neste caso. Deve haver um propósito, sim, deve haver. Mas, a não ser para quem é profundamente crente, o que não é o caso da mosca que assina este texto, é difícil vislumbrá-lo. Por vezes, dá sensação de que a senhora é uma espécie de marioneta nas mãos de quem manda nisto tudo. Seja Deus, Buda, Maomé ou Abraão. Tudo é indiferente para a senhora. Dean e Feher morreram aos 24; Pinto da Costa aos 87 e Manuel Sérgio aos 91. Rui Filipe aos 26 e Law aos 84. Senna aos 34 e Foreman aos 76. Diana aos 36 e a Rainha Isabel II aos 96. Aqui entre nós: faz sentido? Não. Talvez as mortes de jovens (famosos ou não) sejam apenas estaladas que a senhora nos dá simplesmente para estarmos alerta na fila indiana. Hoje, tu; amanhã, ele; depois de amanhã, vós, daqui a semanas, eles. E, um dia destes, eu ou nós. É por isso que digo e repito: que interesse tem estarmos a debater as razões pelas quais o homem não foi ao funeral? Acrescentará isso mais um dia a Diogo Jota ou André Silva? Atenuará a dor da família? Tenhamos sempre presente (embora seja difícil): somos apenas moscas a cheirar o cocó do cavalo do servo do rei do Butão.