«Tenho de lutar muito mais do que se tivesse nascido homem»

Para assinalar o Dia da Mulher escolhemos quatro mulheres, de quatro modalidades. Quatro raízes diferentes. Quatro mulheres guerreiras e acima de tudo apaixonadas pelo desporto: Jéssica Silva, Patrícia Sampaio, Bebiana Sabino e Nancy Moreira

Quatro mulheres que enfrentaram (sempre) a barreira do preconceito com uma certeza no olhar: ser feliz e triunfar no desporto como... mulher.

De sorriso no rosto. Todas. Chegaram à redação de A BOLA, em Lisboa, com uma enorme vontade de partilhar o que lhes vai na alma. Jéssica Silva é uma referência do futebol feminino, aqui e além-fronteiras. Bebiana Sabino é o rosto maior do andebol nacional, onde se mantém como capitã da Seleção. Nancy Moreira é uma cabo-verdiana de nascimento e portuguesa de coração que se afirma como pugilista, sendo a número 2 do mundo no boxe, na categoria de 66 kg. Patrícia Sampaio é a menina-mulher de Tomar que ganhou uma dimensão maior após a medalha de bronze conquistada nos Jogos Olímpicos de Paris, no verão passado, no judo, na categoria –78 kg.

Quatro histórias de dimensão maior que se unem para falar de como é ser mulher no desporto. Uma conversa entre mulheres com o pontapé de saída a ser dada por Jéssica Silva. Aos 30 anos, o sorriso contagiante da internacional portuguesa espelha bem o que lhe vai na alma: «Eu sou muito feliz por ser mulher e estou rodeada de mulheres incríveis. Aquilo que eu mais gosto na vida é celebrar os feitos das mulheres.»

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Bebiana Sabino é a face de uma dedicação ímpar ao andebol e já normalizou as dificuldades: «Sou de uma família que tem muitas mulheres, portanto o ser mulher para mim era normal. É igual a ser homem. Eu nunca percebi que pelo facto de ser mulher tinha menos oportunidades», diz-nos. Mas teve. «Só ao entrar no ensino superior, a ter uma maior maturidade, comecei a perceber que realmente eu era uma lutadora. Que era diferente de todas as outras, porque se calhar consegui vingar e o desporto permitiu que mostrasse que poderia alcançar aquilo que queria, independentemente de ser mulher, mas, para isso tenho de lutar muito mais, tenho de dedicar muito mais de mim do que se tivesse nascido homem.»

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Patrícia Sampaio tem menos 13 anos do que Bebiana mas os desafios tocam-se. Mesmo não tendo em Tomar as parceiras em número suficiente para partilhar o tapete, nunca deixou de praticar judo. «Talvez seja uma desvantagem que me deu a vantagem de me saber adaptar e de saber dar a volta com recursos diferentes. Vou ter de treinar com os rapazes e eles estão sempre um passo à minha frente, por questões genéticas, então tenho de me superar. Cresci, por causa do judo, muito habituada a lidar com rapazes. A maior parte das minhas amizades são com rapazes, mas estar ali num grupo mais masculino nunca senti que fosse algo que me tivesse interferido ou que me tivesse dificultado. Acho que também me habituei porque foi a realidade com que sempre vivi.»

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Nancy Moreira chegou a Portugal ainda criança, juntando-se aos pais que já estavam no Norte de Portugal, depois de terem deixado Cabo Verde em busca de uma vida melhor. Habituada a lidar com dificuldades cresceu a saber exprimir o que sente: «Não é só dizer que sou mulher e não tenho os mesmos direitos. Não! Primeiro tenho de provar que mereço a oportunidade, que mereço estar ali e que luto para estar ali.»

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Jéssica Silva não tem dúvidas de que é importante assinalar o Dia da Mulher. «Sinto que tenho muita força dentro de mim. Não sei se é impulsionada pela minha base, pelos meus irmãos, pela minha família, pelas mulheres que tenho na minha vida... Sei que sou um exemplo para outras pessoas e tenho esta responsabilidade de mostrar um bocadinho a minha forma. É uma responsabilidade boa e que aceito. Quando um dia isto acabar, quero que as pessoas olhem para mim como uma jogadora, que conseguiu aquilo que sonhava, mas sobretudo sendo uma pessoa íntegra.»

Apesar dos esforços, estas mulheres não sentem arrependimento. «Se estivesse arrependida, já tinha deixado. Muitas vezes penso que não vou ter força para iniciar uma próxima época, principalmente porque termino as épocas muito exausta mas não me arrependo de nada. Gostava de ter uma vida mais facilitada para poder corresponder do ponto de vista físico, técnico e tático em jogo, mas sou feliz por isso», diz-nos Bebiana Sabino.