Portugal nos Jogos Olímpicos de Inverno: o futuro já começou
A aproximação aos Jogos Olímpicos de Inverno de Milão Cortina-2026 marca um momento decisivo para os desportos de inverno nacionais. Portugal tem já três vagas garantidas (duas no esqui alpino e uma no esqui de fundo), mas continua a lutar pela qualificação na patinagem de velocidade no gelo e no bobsleigh para tentar voltar a estar presente nos Jogos Olímpicos de Inverno nestas modalidades, depois de Calgary-1988 (bobsleigh) e Nagano-1998 (patinagem de velocidade no gelo).
O caminho está também a ser feito no desporto adaptado, onde pela primeira vez Portugal tem hipóteses reais de qualificar um atleta de snowboard para os Jogos Paralímpicos de Inverno.
É o culminar de vários anos de trabalho baseados numa estratégia estruturada e ambiciosa, para transformar modalidades tradicionalmente um pouco mais afastadas da nossa realidade climática e desportiva, em modalidades com representação internacional consistente.
Desde a participação de Duarte Espírito Santo em Oslo-1952 e ao longo de décadas, a presença portuguesa nos Jogos de Inverno foi discreta, mas a partir de Sochi-2014 começou a ganhar novo impulso. Esta mudança não é casual, é fruto de um plano federativo que apostou na deteção de talentos, na criação de condições de treino e na capacitação técnica de atletas que, até há poucos anos, não encontrariam em Portugal estrutura para evoluir.
O exemplo mais atual e transformador é o futuro pavilhão de desportos de inverno, previsto para o Seixal, já com terreno cedido pelo município e com abertura estimada para os próximos anos. Esta infraestrutura, inédita em território nacional, será sem dúvida um ponto de viragem das modalidades de gelo em Portugal, permitindo treinos regulares, captação de atletas e a criação de um ecossistema desportivo próprio, libertando os atletas e treinadores nacionais da dependência permanente de estágios no estrangeiro. Será também um sinal interno de ambição: Portugal quer deixar de ser visitante e passar a ser residente no mapa competitivo dos desportos de inverno internacionais.
Os últimos anos foram marcados por um crescimento consistente. Há hoje mais atletas, mais clubes e mais modalidades. Esta dinâmica surge da vontade de construção de um futuro sustentável para os desportos de inverno em Portugal. Um futuro onde cabem também a inclusão e o impacto social, materializados em projetos como o PAIS – Participar, Aprender, Integrar e Socializar, o Ski4All, o Ice4All, O Learn to Play Hóquei no Gelo ou o Curling@Schools. Iniciativas que mostram como o desporto pode ser um catalisador de desenvolvimento humano e de integração social.
A mesma ambição revela-se também na vontade de ampliar horizontes e criar novas oportunidades competitivas para os nossos atletas, como por exemplo na organização de uma liga ibérica de hóquei no gelo, em colaboração com a nossa congénere espanhola.
É assim que FDI-Portugal tem demonstrado que tem visão estratégica no panorama desportivo português numa estrita relação com o IPDJ, com o Comité Paralímpico e com o Comité Olímpico de Portugal, cujo apoio ao desenvolvimento das modalidades de inverno tem sido fundamental e constante, bem como em articulação com as federações internacionais, no reforço na formação técnica e aposta em atletas das camadas de formação da federação e de atletas lusodescendentes, residentes em comunidades onde os desportos de inverno são desporto nacional. E aqui não se trata de importar talento, mas de acelerar uma cultura desportiva que precisa de exemplos e referências para crescer.
É evidente que o caminho ainda é longo. As condições naturais do país não mudaram, e a massa competitiva interna ainda não é a ideal. Mas o desporto nacional tem vivido tantas décadas a ouvir falar do que falta, que vale a pena sublinhar o que já existe: visão, trabalho e resultados desportivos que começam a aparecer, como o título mundial obtido por Jéssica Rodrigues no Campeonato do Mundo júnior de patinagem de velocidade no gelo, em fevereiro de 2025.
Os desportos de inverno em Portugal deixaram apenas de ser desportos que os portugueses praticam nas férias ou gostam de ver na televisão, para se tornarem projetos concretos, com equipas técnicas, planeamento e atletas que se qualificam para as mais importantes competições mundiais de inverno.
O entusiasmo é reforçado pelo Plano Nacional de Desenvolvimento Desportivo, apresentado pelo Governo no passado dia 20 de novembro e pensado para um horizonte temporal de 12 anos. Pela primeira vez, Portugal olha para este setor não como exceção, mas como um investimento estratégico.
Milão Cortina-2026 será, assim, mais do que um evento desportivo: será um espelho do que Portugal está a tentar construir. Independentemente do número final de atletas apurados ou das classificações obtidas, o país chega a estes Jogos com algo muito mais valioso, uma estratégia bem defendida, uma Federação e um Comité Olímpico mobilizados e uma comunidade que começa a acreditar.
Depois de Milão Cortina, o foco vira-se para os Alpes Franceses-2030, já com jovens atletas de várias modalidades a preparar esse caminho.
E quando um país se permite sonhar com o que antes parecia improvável, a vitória começa muito antes do início dos Jogos.