Chocolate minhoto adoça repasto europeu de luxo (crónica)
Categoria e nota artística na primeira parte, organização e maturidade na etapa complementar. Foram estes os condimentos que fizeram parte da receita triunfal do SC Braga diante do Nice e que valeu aos arsenalistas a primeira vitória da sua história em solo francês — para trás ficaram os empates com PSG (0-0) e Mónaco (1-1), e as duas derrotas frente ao Marselha (0-1 e 0-3).
Os 45 minutos iniciais foram de enorme empolgamento dos bracarenses. À rotatividade habitual promovida por Carlos Vicens — Lagerbielke, João Moutinho, Gabri Martínez e Fran Navarro foram rendidos por Vítor Carvalho, Florian Grillitsch, Leonardo Lelo e El Ouazzani — respondeu a equipa com uma categoria digna de um clube que tem estado na frente da montra internacional.
Ricardo Horta viu Oppong negar-lhe os intentos, aos 13 minutos, e El Ouazzani também tentou a sua sorte, mas Maxime Dupé, primeiro (14'), e a mira ligeiramente descalibrada, depois (18'), impediram a felicidade ao ponta de lança.
O desenrolar dos acontecimentos, com os bracarenses a dominarem, a circularem a toda a largura e a chegarem com relativa facilidade à área de uma equipa que estava completamente à deriva (tantos e tão maus têm sido os acontecimentos nas últimas semanas...), deixavam antever a vantagem e o golo apareceu mesmo. Mas não foi um golo qualquer. Ou melhor, o golo até foi relativamente simples, mas a jogada é para... DVD: envolvimento apaixonante entre vários jogadores numa saída em posse, condução de Gorby pela zona central, fuga de Víctor Gómez pelo corredor direito e consequente cruzamento (com conta, peso e medida), túnel delicioso de El Ouazzani no coração da área e remate certeiro de Pau Victor, de pé direito, a fazer explodir de alegria os cerca de 500 (e bastante ruidosos) adeptos dos guerreiros presentes na Allianz Riviera.
A vantagem fez ainda melhor ao conjunto português e deixou os franceses à beira... de um ataque de nervos. De tal forma que até ao intervalo Lukas Hornicek apenas teve de... assistir a estes 45 minutos.
Muito mudaria, porém, na etapa complementar. De orgulho (compreensivelmente) ferido, os jogadores do Nice foram ao fundo da alma resgatar um grito de revolta que lhes permitisse evitar a oitava (!) derrota consecutiva, e além de passarem a ter mais (e melhor) posse de bola, conseguiram também várias aproximações à baliza dos minhotos. Nesses momentos, saltou à vista o espírito guerreiro de Lukas Hornicek e a qualidade do número 1 fez o resto. Que o digam Kevin Carlos (53') e Isak Jansson (58'). Em duas situações claras de golo, o internacional sub-21 pela Chéquia demonstrou o que é ser guarda-redes de equipa grande, agigantou-se e realizou duas intervenções de nível superlativo e que prolongaram a agonia dos franceses.
Ainda que Carlos Vicens tenha mexido bem na equipa, com as entradas de Lagerbielke, João Moutinho e Gabri Martínez (todos a cerca de meia hora do final), bem como, pouco depois, de Fran Navarro — Gabriel Moscardo foi lançado aos 86' e para fechar a porta, uma vez que rendeu Pau Victor e a ideia foi juntar mais um elemento ao setor intermediário do que propriamente outra coisa qualquer —, os bracarenses baixaram demasiado as linhas, deixaram de ter capacidade de pressão, mas nunca perderam a solidez e cerraram fileiras quanto tiveram de o fazer.
O play-off está garantido e o sonho do apuramento direto está mais vivo do que nunca. Que bela história do senhor Braga europeu!