A prioridade
1 - Faltam dez jornadas para o final desta Liga. Para aqueles que jogaram na sexta ou já ontem faltarão, tão só, nove jogos, ou seja, vinte e sete pontos. E a conquista da Liga significa o acesso direto à Liga dos Campeões e, por excelência, a muitos, largos, milhões de euros. Seja para o Benfica seja para o Futebol Clube do Porto que alcançou, com muito mérito, o acesso, muito bem recompensado, aos quartos de final da milionária Liga. Importa delimitar então as prioridades. O Benfica, este Benfica, nas suas atuais e concretas circunstâncias, tem de se concentrar na reconquista da nossa Liga. O foco terá de ser, tão só, a Liga NOS. É indiscutível que com a vitória no Dragão o Benfica alcançou a liderança da Liga e suplantou a equipa de Sérgio Conceição. Assumindo Bruno Lage que é treino a treino e jogo a jogo o Benfica, este concreto Benfica e nas atuais circunstâncias, sabe bem que o seu foco, a sua prioridade só deve ser esta Liga. A Liga nossa e não, assumo-o com ousadia e frontalidade, a Liga Europa. A Liga Nos, digo-o e não, digo-o também a Taça de Portugal. É inequívoco que tudo devemos fazer para suplantar o Dínamo de Zagreb - uma equipa competente e sagaz - e para ultrapassar, em Alvalade, o Sporting na segunda mão da meia final da Taça de Portugal em que estamos em vantagem no marcador. Mas o que sei é que a essência é a Liga. Para já, amanhã, a primeira das dez finais frente ao subtil Belenenses, que nos venceu na primeira volta no seu estádio emprestado, o Jamor. Depois no próximo domingo - e antes da pausa para as seleções - a segunda final face ao Moreirense que nos tirou três pontos no Estádio da Luz numa noite que foi bem dolorosa para muitos de nós que assistimos, ao vivo, a uma vitória clara da equipa bem orientada pelo Ivo Vieira. O que assumimos é a prioridade da conquista da Liga. Sabendo nós desde Maquiavel - ou seja desde o século dezasseis - que «há três classes de pessoas: as que sabem; as que não sabem, mas sabem que não sabem; e as que não sabem mas acham que sabem. Estas últimas são as mais perigosas». Pela minha parte sei bem que não sei. Mas pressinto que o foco do Benfica deve ser a Liga NOS. Alguns poderão dizer que não sei mas acho que sei. Mas admito, concedendo, que ser perigoso, aqui, é um sentimento de reconquista. Sabendo nós, desde Carl Sagan, que «o primeiro pecado da humanidade foi a fé; a primeira virtude foi a dúvida»! Mas, insisto, e perante aqueles que duvidem, que a prioridade tem de ser a reconquista da Liga. E, aqui, a sintonia entre Luís Filipe Vieira e Bruno Lage será total. E aqui estamos nós, militantes conscientes, para o assumir em pleno. Com este concreto Benfica e nas suas atuais circunstâncias.
2 - A Liga Europa é importante, diga-se, mas tem de ser encarada nas suas especificidades. Bem sabemos que na Liga dos Campeões estão as grandes equipas da Europa. Com a singularidade do Ajax - que não foi campeão - ter eliminado um Real de Madrid que precisa, com urgência, de uma efetiva reconstrução. Como, em outra perspetiva, o PSG ameaçado, de verdade, com as regras do fair play financeiro e as particularidades, bem pessoais, de Neymar. Mas na Liga Europa só três equipas envolvidas nesta fase da competição lideram as respetivas ligas: Benfica, Zenit e Dínamo de Zagreb. E este último, em razão da singularidade do futebol croata, lidera com larga vantagem a competição interna e prepara-se para conquistar, uma vez mais, a sua Liga. Mas se analisarmos o ranking da UEFA, e antes dos quatro últimos jogos dos oitavos de final da Liga dos Campeões e dos derradeiros oito da Liga Europa, constamos a reiterada preponderância as grandes Ligas - inglesa, espanhola, alemã e italiana - mas com a intromissão, por ora, de Ajax e Futebol Clube do Porto nos quartos de final da competição que proporciona largas alegrias às diferentes tesourarias … mesmo que àquelas das grandes marcas . E na fase seguinte da Liga Europa parecem já estar Nápoles e Chelsea, ambos já sem hipóteses de conquistarem a respetiva liga interna! Ou seja, para estes clubes - como para o Inter de Milão, o Rennes, o Arsenal, o Valência ou o Sevilha, por exemplo - a Liga Europa será a salvação da época. O que implica que, nas suas concretas e especificas circunstâncias, a Liga Europa é prioridade para aqueles clubes que já não podem acreditar na Liga interna. E, por vezes, já nem acreditando no acesso direto à próxima Liga dos Campeões. Também nesta sede são verdadeiras as palavras do explorador americano Vilhjalmur Stefansson: «A aventura é um sinal de incompetência.»
E, na vida e também no futebol, importa limitar a aventura. Ou as aventuras. Importa, sim, concretizar as prioridades!
3 - Morreu na passada sexta-feira uma das referências de Coimbra e da sua Académica, o Doutor Vítor Campos. A sua Académica joga hoje em Viseu frente ao Académico. Será, para ambos os clubes, quase que uma verdadeira final e com a singular presença, ao que sei - e que vivamente saúdo e referencio -, do Presidente da Liga, Pedro Proença. O Doutor Vítor Campos, licenciado em Medicina e com a especialidade de anestesista, realizou, entre 1963 e 1976, 345 jogos. É o sexto jogador com mais jogos na Académica e viveu tempos gloriosos e outros bem dolorosos nesse clube de referência do futebol português. Viveu a extinção da Secção de Futebol da Associação Académica de Coimbra e, depois, a criação do Clube Académico de Coimbra que se transformou, mais tarde, no Organismo Autónomo de Futebol (OAF). Com muitas questões jurídicas suscitadas e apreciadas e numa delas participou o Professor Marcelo Rebelo de Sousa! Há alguns anos comprei um interessante livro, A Académica, editado pela Casa da Académica de Lisboa - em que também participou o nosso Diretor Vítor Serpa-, e nele está um interessante artigo dos Professor Mário Campos e do Doutor Vítor Campos. Nesse artigo aprendi que José Maria Pedroto iniciou, em 1962, na Académica a sua «brilhante carreira de treinador» e, assim, treinou «jogadores do nível de Maló, Rocha, Vítor Campos, Gervásio, Rui Rodrigues, Crispim e Oliveira Duarte». E, depois, «o futebol da Académica inicia novo período de fulgor, que se prolonga pelos anos seguintes, já sob o comando técnico de Mário Wilson». No ano passado, a convite do nosso querido Toni - que regressa agora a Portugal, já com o emblema de 50 anos de associado do Benfica, e após mais uma vitoriosa presença, com seu amado Filho, no futebol do Koweit - participámos - eu e o Paulo - num delicioso convívio em terras da Anadia. O privilégio de escutar do Toni e do Professor Mário Campos a história vivida e estórias do futebol da Académica mostrou-nos que a vida é variedade e existe para ser aproveitada. Neste momento em que Coimbra - e também Torres Vedras - perde uma referência de cidadania e do futebol, do envolvimento cívico e do compromisso desportivo, da Academia e da Académica, permitam-me que aqui deixe palavras de sentidas condolências a toda a Família do Doutor Vítor Campos. E que as enderece a seu querido Irmão, o Professor Mário Campos.