Sporting: o dia em que Rui Borges chega aos 44
Rui Borges faz esta segunda-feira 44 anos. Capicua, portanto. Aos 11 estava nos benjamins do Mirandela; aos 22 jogava no SC Braga B; aos 33, voltara ao Bragança; aos 44, hoje, portanto, está a lançar a tentativa do tricampeonato. Não será fácil, claro. Quase parafraseando José Cid: 7 de julho de 2025, o dia em que o Rui faz anos.
1952, 1953, 1954. A última vez que o Sporting ganhou três Ligas seguidas foi há 71 anos. Com Randolph Galloway nos dois primeiros anos e Joseph Szabo no terceiro. Ainda havia Azevedo, Jesus Correia, Vasques, Travassos e Albano. Mas já não havia Peyroteo, o homem dos golos.
Mais ou menos como agora. Ruben Amorim no primeiro ano, Ruben Amorim+João Pereira+Rui Borges no segundo e Rui Borges a arrancar o terceiro. Ainda há Rui Silva, Pedro Gonçalves, Trincão, Quenda e Catamo. Mas dificilmente haverá Gyokeres, o homem dos golos. Porém, se Milorad Pavic foi campeão no Benfica em 1974/75 já sem Eusébio; se Artur Jorge foi campeão no FC Porto em 1989/90 já sem Fernando Gomes, Rui Borges, o senhor capicua, pode sonhar em chegar ao tricampeonato já sem Gyokeres. E tornar-se, ainda com 44, no quarto treinador português mais novo de sempre a ganhar dois campeonatos de enfiada, depois de Artur Jorge (1984 e 1985: 38 e 39 anos), José Mourinho (2003 e 2004: 40 e 41 anos) e Ruben Amorim (2024 e 2025: 39 e 40 anos).
Recuemos 44 anos: 7 de julho de 1981. Portugal, nesse verão, apaixonava-se, mais uma vez, por Joaquim Agostinho. O mítico ciclista terminara a dura etapa Paris–Roubaix do Tour no 3.º lugar e dizia a Carlos Miranda, em A BOLA, com aquela teimosia que só os grandes têm: «Isto é para que vejam que o jaquim ainda cá está!»
Nesse mesmo dia, o enormíssimo Carlos Lopes disparava em entrevista a Rebelo Carvalheira, igualmente em A BOLA: «Já me enterraram por duas ou três vezes, mas serei eu a decidir o meu fim no atletismo». O fim seria apenas em 1987 e, pelo meio, foi campeão olímpico, bicampeão do Mundo de corta-mato e recordista da Europa, olímpico e do Mundo dos 42 quilómetros.
Enquanto Portugal idolatrava Lopes e Agostinho, o Sporting celebrava 75 anos de vida e chorava a morte de João Cruz, avançado dos anos 30 e 40 e homem de 145 golos e 279 jogos com a camisola verde e branca. Cruz partia no dia em que Borges nascia: 7 de julho de 1981.
No arranque dessa época de 1981/82, os bancos da I Divisão estavam recheados de nomes sonantes: Manuel José (Espinho), José Maria Pedroto (V. Guimarães), Artur Jorge (Belenenses), Lajos Baróti (Benfica), Jimmy Hagan (Estoril), Quinito (SC Braga), Mário Lino (Boavista), Manuel de Oliveira (Portimonense), Fernando Cabrita (Académico Viseu), Rodrigues Dias (V. Setúbal), Hermann Stessl (FC Porto) e, claro, Malcolm Allison no Sporting, campeão nacional dez meses depois.
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Sensivelmente uma década mais tarde, no início de 1991/92, Rui Borges estava a jogar nos benjamins do Mirandela. No clube transmontano ficou até 1999/00, curiosamente a época em que o Sporting colocou fim, sob o comando de Augusto Inácio, a longo jejum de 18 anos sem ganhar o campeonato. No ano seguinte, com 19 anos, Rui Borges dava o primeiro salto. De Mirandela para Bragança. De júnior para sénior.
Estreou-se a 4 de março de 2001, frente ao Pevidém, na jornada 23 da II Divisão B. O Bragança perde por 2-4, mas Rui dá nas vistas: entra ao intervalo para o lugar de José Gomes e, aos 57 minutos, estreia-se a marcar. Pela primeira vez, o seu nome aparece em A BOLA. Ou melhor, o apelido: Borges.
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Seguem-se, de 2001 a 2007, passagens por diversos clubes: Paredes, SC Braga B, regresso a Mirandela e Bragança e experiência no Trofense. A meio de 2007/08 é emprestado ao Moreirense, então no terceiro escalão do futebol português. E a 28 de fevereiro de 2008, tem o primeiro contacto com o futebol ao mais alto nível, quando o Moreirense se desloca ao Estádio da Luz, para defrontar, nos quartos de final da Taça de Portugal, o Benfica treinado por José Antonio Camacho e com jogadores como Maxi Pereira, Nuno Assis, Di María, Cardozo, Rui Costa e Mantorras.
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Daniel Ramos, treinador dos cónegos, entrega-lhe a titularidade, ao lado, por exemplo, de Bino, campeão nacional pelo FC Porto e pelo Sporting. Um lance fica na retina, ao minuto 55: Rui Borges escapa-se pela direita e, já dentro da área, dispara forte mas Butt defende com segurança. Recebeu, em A BOLA, a nota 5 de Jorge Pessoa e Silva. Com a seguinte descrição: «Conseguiu fixar Sepsi na defesa encarnada, mas foram poucos foram os lances em que desequilibrou. Ainda assim, teve uma boa oportunidade, mas o remate foi à figura de Butt».
A 19 de agosto de 2017, com 36 anos, termina a carreira de jogador e começa a aventura como treinador. No Mirandela. Muito do que sabia quando começou a treinar aprendeu com os treinadores com quem se cruzou: João Eusébio, Rui Vieira, Fernando Valente, António Caldas, Lopes da Silva, Toni Conceição, Daniel Ramos, Nicolau Vaqueiro, Pedro Monteiro, Jorge Baptista, Luís Teixeira, Carlos Pinto, Rui Vilarinho, André David, Nuno Barbosa e Ricardo Chaves. Talvez também com companheiros que, mais tarde, seriam treinadores: Ricardo Soares, Marco Silva ou Bino, por exemplo. Estreia-se no Vimioso com o Minas Argozelo e ganha por 2-1.
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Os oito anos seguintes seriam um turbilhão de emoções. Primeiro, passos curtos: Mirandela, Académico de Viseu, Académica, Nacional, Vilafranquense e Mafra Defronta o FC Porto na meia-final da Taça de Portugal em fevereiro de 2020 pelo Académico de Viseu. Empata em casa (1-1) e perde no Dragão (0-3). Em Viseu, em conferência de imprensa no final do jogo da primeira-mão, tem frase que mostra o que seria o seu futuro: «Vamos para o Dragão a sonhar e não se paga por sonhar.»
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Depois, passos maiores: Moreirense e V. Guimarães. A estreia na Liga é com o FC Porto, em Moreira de Cónegos, a 14 de agosto de 2024 (1-2). Há menos de dois anos. Até final da época, perde com SC Braga (2-3 e 0-1), Sporting (0-3 e 0-2) e FC Porto (0-5) e empata e perde com Benfica (0-0 e 0-3).
O Moreirense termina no sexto lugar e dá o salto para o V. Guimarães. Onde fica 25 jogos. Até final de dezembro de 2024. Dez vitórias e um empate na Liga Conferência e seis vitórias, cinco empates e quatro derrotas na Liga.
Por fim, passo de gigante: Sporting. Ganha a Benfica, Rio Ave, Nacional, Farense Estoril, Casa Pia, Famalicão, Estrela da Amadora, Santa Clara, Moreirense, Boavista, Gil Vicente e V. Guimarães para a Liga e sagra-se campeão nacional. Bate Gil Vicente, Rio Ave e Benfica e ganha a Taça de Portugal. O senhor capicua fechou a sétima dobradinha do Sporting e o primeiro bicampeonato dos últimos 71 anos. Esta segunda-feira, aos 44, haverá bolo e um foco: tricampeonato para o Sporting e bicampeonato para ele próprio.
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