José Mota: «Foi uma assobiadela forte, adeptos do Benfica são exigentes»
José Mota, técnico do Farense. Foto: IMAGO/Maciej Rogowski

José Mota: «Foi uma assobiadela forte, adeptos do Benfica são exigentes»

NACIONAL08.12.202321:18

Treinador do Farense fez a análise ao encontro após o final do jogo

O Benfica empatou 1-1 contra o Vizela, no Estádio da Luz, na 13.ª jornada da Liga Portugal. Na habitual conferência de imprensa após o final do jogo, José Mota partilhou algumas opiniões sobre o encontro, a sua equipa, o Benfica e a assobiadela que marcou a segunda parte da partida. Confira abaixo, na íntegra, tudo o que o técnico do Farense disse.

— Como faz para combater as limitações da equipa, e trazer ao de cima um bom futebol e qualidade individual? Farense é uma equipa sóbria, algo que já tinha mostrado contra outros candidatos.

— Em primeiro lugar, respondendo à sua questão, esta equipa acredita muito. Se repararem no que foi a época passada, a forma como muitas vezes acreditou que podia alterar os resultados negativos, hoje confirmou-se que realmente temos um grupo que acredita. Claro que muitos deles estão a fazer a estrear-se na primeira liga, mas têm talento, e se têm talento merecem jogar. 

É uma equipa que é humilde, são jogadores com ambição, que acreditam no processo, na estratégia que definimos. Eles acreditam no treinador e no processo. Sei o que pensam, que o Farense com os grandes fez sempre bons jogos, disputou os jogos, o resultado foi sempre uma incógnita e isso é sempre bom para o processo, e para que os jogadores acreditem. Eu acho que eles estão a acreditar cada vez mais, e nós vamos continuar a tentar proporcionar estes espetáculos, estes jogos que para nós, Farense, nos faz acreditar muito. Ter esta massa associativa faz-nos acreditar, adeptos que vieram de faro, e isto é o melhor que um treinado pode ter, adeptos que acreditam em nós e que, embora percamos jogos, nos apoiam. Temos sempre os pés bem assentes no chão, e caminhamos para atingir os nossos objetivos.

— Conseguiu o objetivo que queria? Ficou surpreendido com o resultado?

— Não, não fico surpreendido. Eu não sou mentiroso, até dizem que sou demasiado frontal, mas eu acreditava que os jogos que temos feito demonstram muito isso [jogar bem], e penso que os responsáveis do Benfica, nomeadamente a equipa técnica, também sabiam o que era o Farense. Nós perdemos o primeiro jogo contra o Casa Pia por três golos, todos os outros jogos que perdemos foram pela diferença de um golo, e sempre jogos disputadíssimos. 

Claro que os adversários estão atentos. Portanto, quem pensava que aquilo que eu disse – que vínhamos tentar enervar, ter bola e muitas vezes dividir o jogo –, se pensavam que eu estava a falar por falar, ficou provado que não. A nossa equipa é isto: é humilde, sabe sofrer. Os jogadores do Benfica são melhores que os nossos, o treinador do Benfica é melhor que o do Farense, mas disputamos todos os jogos de uma forma que eu gosto. Trabalhamos durante a semana para que o jogo resulte, e isso para mim é uma satisfação muito grande, embora também perdendo claro: perdemos a semana passada contra o Vitória de Guimarães, mas gostei do procedimento da equipa, e do ADN do Farense, e quando é assim, estamos sempre mais próximos de conseguir bons resultados.

— Como se prepara a equipa contra um adversário como o Benfica? O que fazer em relação à fragilidade emocional dos jogadores?

— Nós sabemos perfeitamente que todos os fatores em relação ao Benfica são importantíssimos. Claro que o Benfica criou várias oportunidades de golo, e se tivessem ganho provavelmente era merecido, mas a verdade é que não conseguiu finalizar. Nós tivemos dificuldades, mas atenção que jogámos contra o Benfica, um Benfica que está ferido, mas que, por outro lado, também percebeu que havia uma equipa que os estava a contrariar. Eu costumo dizer, vamos tirar a força anímica do adversário. Como? Tendo bola – que muitas vezes não é possível –, ou então jogar muitas vezes onde as equipas grandes não gostam: na profundidade. Os jogadores de equipas grandes não gostam de fazer 50 metros para trás, detestam, e nós jogamos muito isso. Eles desgastaram-se imenso a correr para trás. Para um jogador de equipa grande, psicologicamente, é difícil. Nós fizemo-lo várias vezes e temos esse mérito. 

Neste jogo, é claro que o Benfica teve oportunidades, se tivesse finalizado provavelmente teria ganho, teve mais oportunidades que nós, mas o futebol é isto, tivemos uma alma muito grande, a estratégia surtiu efeito e temos um ponto extremamente saboroso. Atenção que também acho que os meus jogadores merecem este ponto, por tudo o que fizeram. Foram de uma alma, entrega, determinação e crença que merecem este ponto.

— Exibições de Ricardo Velho, homem do jogo, e Mattheus Oliveira.

— Eu gostava de lhes contar uma história: o Ricardo não jogava nem era titular, o Mattheus não jogava nem era titular, o Gonçalo Silva, o Talocha, nenhum era titular. Ou seja, tenho aqui sete ou oito jogadores que não eram titulares. Sabemos que temos ali jogadores com muito potencial, o que nos faz perguntar, porque é que não jogavam? O jogador é que tem de perceber que tem de fazer ‘isto e aquilo’. 

Nós traçamos objetivos para os jogadores. Se fizeres isto, vais ajudar e ser uma mais-valia. Se achares que basta ter um bom pé esquerdo, esquece. Há que haver exigência. Muito simples, joga quem merece. Eu costumo de dizer, ‘dá ao chinelo, faz o que o treinador pretende, e está próximo de ser titular. Não faz, não joga. Isto foram convicções que eu sempre tive, mas sei perfeitamente que esses atletas, que vieram da segunda liga, têm muito talento. Por vezes desprezamos a segunda liga, mas há jogadores muito bons. Há pelo menos uma componente onde são melhores que na primeira, a convicção com que fazem as coisas. O jogador da segunda liga, quando é bom, chega à primeira, e se acha que é mais interessante e melhor para ele, acaba por melhorar em muitos aspetos.

— Pensou em mudar a estratégia da equipa depois da assobiadela?

— Não, não temos uma varinha para chegar ali e dizer ‘agora vamos mudar’, não é assim que funciona. O processo está lá, os jogadores têm de perceber ao que se têm de agarrar. Uma das coisas que eu peço aos jogadores é, não ouçam, tentem não ouvir. Porque isto pode ser contraproducente. Claro que pode desassossegar os jogadores do Benfica, mas eles estão habituados a este ambiente, os meus não. 

A assobiadela foi forte, e se calhar desassossegou um pouco e galvanizou os do Benfica. Acho que essa exigência que os adeptos do Benfica colocam em todos os jogos e nesse momento também fez com que possamos dizer que se a equipa estava adormecida, aquela assobiadela acordou-os. Mas enfim, acho que os meus jogadores estavam convictos e conscientes das dificuldades e que conseguíamos ter um resultado positivo.