Viktor Gyokeres, de joelhos, queixa-se de um problema físico perante o olhar atento do capitão dos leões, Morten Hjulmand, é do árbitro
Viktor Gyokeres é um dos jogadores do Sporting que tem sido afetado por lesões
Foto: IMAGO

OPINIÃO DE DIOGO LUÍS Sporting e a estratégia nas lesões: certa ou errada?

OPINIÃO16.02.202509:00

Mercado de valores é o espaço de opinião semanal de Diogo Luís, antigo jogador de futebol e atual economista

O calendário competitivo está cada vez mais denso. O futebol evoluiu de um simples desporto para uma indústria exigente a todos os níveis. O poder de quem decide é influenciado por interesses económicos, o que faz com que se criem cada vez mais competições com o objetivo de gerar mais jogos e, indiretamente, mais e mais receitas. A forma como se desenvolve o futebol, sobretudo fora das quatro linhas, faz com que o que se passa fora dos relvados se torne cada vez mais atrativo, sobretudo para aqueles que não são grandes fãs de futebol. Já dentro do relvado a realidade é diferente.

Os jogadores não são máquinas. A exigência que se lhes impõe é enorme. A ausência de férias ou períodos de descanso torna tudo mais complicado. A pressão sobre clubes ou seleções é gigante, o que faz com que estes não prescindam dos seus melhores intérpretes. Quais as consequências deste caminho que tem vindo a ser seguido? Numa primeira análise, quando chegamos aos momentos de decisões, os grandes jogadores, por norma, apresentam-se muito desgastados, o que faz com que os espetáculos tenham menos qualidade. A segunda consequência tem a ver com o aumento de lesões nos atletas em virtude do desgaste físico e emocional.

Sporting e as lesões

Os jogadores do Sporting têm vindo a ser perseguidos por constantes lesões. Um dos motivos para que isto aconteça é o que referi anteriormente, ou seja, o exigente calendário competitivo. Podemos até dizer que o Sporting tem tido azar na forma como tem ficado privado do contributo de jogadores importantes. De uma forma racional, uma coisa é perder um jogador como Nuno Santos, com uma lesão no joelho, outra são as constantes lesões musculares. Neste campo, são vários os jogadores que têm sido afetados por este tipo de lesão, o que pode colocar em causa três departamentos diferentes: o departamento médico, de performance e a equipa técnica, uma vez que estas três áreas são as responsáveis pela gestão da capacidade física dos atletas. Adicionalmente, os dois primeiros departamentos (médico e de performance) também podem ser colocados em causa na forma como os jogadores recuperam e se voltam a lesionar (exemplo mais claro é Morita), ou mesmo pela forma como alguns jogadores tardam em recuperar (Pedro Gonçalves é o melhor exemplo).

Estratégia

Todos percebemos que existe aqui um problema com o qual o Sporting tem tido dificuldade em lidar. Por um lado, o elevado número de jogadores lesionados faz com que, desportivamente, a equipa fique com menos opções. É bem evidente a dificuldade em recuperar e fazer com que os jogadores estejam a 100%. Com jogadores essenciais a serem geridos em vários jogos, as questões começaram a aparecer: o que se passa com Gyokeres? E com Pedro Gonçalves? E Morita? Com toda a pressão competitiva e mediática o Sporting tomou a opção de não dar informação sobre as lesões dos seus jogadores, alegando ética médica.

Objetivo

Qual o objetivo de não divulgar as lesões dos seus atletas? Vejo três ideias que podem justificar esta opção. A primeira é a de não querer dar trunfos aos adversários; a segunda pode passar por tentar minimizar o impacto do valor de mercado dos jogadores, uma vez que certas lesões podem criar a dúvida em possíveis interessados e reduzir o valor de uma futura transferência; O terceiro ponto pode ser o de proteger algumas áreas internas, o departamento médico, de performance ou de área técnica, tentando evitar expor falhas internas.

Risco desta estratégia

Esta forma de estar tem logo à partida um senão, aumenta a especulação e pode fazer com que se perca credibilidade, uma vez que o silêncio ou a ausência de informação geram desconfiança nos adeptos, stakeholders ou imprensa, fazendo com a pressão sobre todos aumente.

Há aqui outro ponto que considero muito relevante. Sendo a Sporting SAD uma empresa cotada, a transparência é um princípio que tem de estar sempre presente. Os jogadores de futebol são os principais ativos das SADs desportivas e têm um contributo fundamental para a cotação bolsista, uma vez que ajudam na obtenção de resultados desportivos e financeiros. Ora, se isto acontece, o Sporting não tem a obrigação de informar o mercado sobre o que se passa com os seus principais ativos? Poderá a CMVM solicitar informações relevantes que são fundamentais para a performance da cotação bolsista?

Ética médica

É pelo ponto anterior que o argumento da ética médica perde força. Numa empresa que está cotada no mercado de capitais, a ausência prolongada de jogadores-chave (Pote — 3 meses) ou Gyokeres podem ter impacto nos resultados desportivos e financeiros do clube. A ética médica protege a privacidade dos atletas, mas não pode fazer com que seja negada informação relevante aos mercados financeiros.

A evolução do futebol

A profissionalização da gestão nos clubes de futebol é uma exigência de um setor cada vez mais evoluído. Isto faz com que práticas que antigamente se tinham, hoje deixem de fazer sentido. Antigamente existiam presidentes que iam à bruxa para poderem tomar decisões, hoje isto não pode acontecer. Todas as decisões devem estar fundamentadas. As práticas de outrora, como fazer blackout ou não prestar todas as informações relevantes com total transparência, deixam de fazer sentido numa sociedade onde a exigência e o foco nas boas práticas estão cada vez mais presentes.

A ESG (Environment, Social and Governance) são três pilares fundamentais, que todas as instituições devem privilegiar, de forma a não ficarem para trás no desenvolvimento económico e social que se está a imprimir. De uma forma muito direta, é por estes motivos que as SADs dos clubes devem ser compostas por profissionais com competências que se complementem entre si e que tenham a capacidade de perceber que as estratégias do passado deixaram de fazer sentido. A responsabilidade e a pressão das decisões não devem fazer com que o caminho da transparência, credibilidade e das boas práticas seja colocado em causa. Por fim, é fundamental que quem gere perceba que uma SAD tem responsabilidades adicionais, não só para com os adeptos, mas também para todos os stakeholders e investidores.

A valorizar: Bruno Lage

Muitas mudanças num jogo (Santa Clara) de grau de dificuldade elevado. Geriu jogadores com desgaste físico, evitou lesões, ganhou opções (e o jogo com mérito).

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