Sobrevivente da Chapecoense lembra tragédia: «Ninguém gritou, não houve pânico»
Passaram nove anos desde o trágico acidente de viação que vitimou a comitiva da Chapecoense, mas algumas memórias continuam vivas entre os que sobreviveram ao desastre, incluindo o jogador Alan Rushel, uma das seis pessoas que escaparam com vida, depois de o avião se ter despenhado na Colômbia, na madrugada de 29 de novembro de 2016.
«Lembro-me de tudo até ao momento do impacto. O piloto avisou que íamos aterrar, demos uma volta, outra volta e nada... não aterrávamos. De repente, numa dessas voltas, apagaram-se todas as luzes do avião, ficou tudo em silêncio. Ninguém gritou, não houve pânico, apenas aquela sensação de 'o que está a acontecer?' Depois veio uma turbulência muito forte, o alarme dentro do avião tocou... e aí já não me lembro de mais nada. Suponho que tenha sido o momento do impacto», contou em entrevista à Marca.
«Sabia que seria uma viagem longa e queria viajar sozinho, deitar-me numa fila de assentos atrás. Entrámos todos e quando chegou um dos últimos, um jornalista, sentou-se ao meu lado. Então pensei 'não vou conseguir deitar-me'. Nesse momento, Follmann olhou para mim e chamou-me para me sentar com ele. O avião não tinha nenhum problema», recordou.
«As pessoas que me resgataram disseram-me que eu estava em estado de choque, que pedi para ligarem ao meu pai, que entreguei os meus documentos, a minha aliança... mas não me lembro de nada disso. Contaram-me que estava sempre a dizer que estava com frio, que me doíam as costas e o braço. Tinha um pedaço de madeira cravado no braço, por isso tenho uma cicatriz enorme ali e doíam-me muito as costas. Tive de ser operado porque tinha várias vértebras fraturadas», lembrou.
E prosseguiu a história: «Quando o médico da Chapecoense viu as imagens, pensou que eu tinha perdido a mobilidade para sempre, que não voltaria a andar. Disse que a lesão na coluna era tão grave que provavelmente tinha afetado a medula. Quando cheguei ao hospital, fez-me um teste: pegou numa agulha e começou a picar-me o pé para ver se eu sentia alguma coisa. Senti. E então disse-me: 'Ok, então há uma grande possibilidade de voltar a andar'.»
«No final, foi incrível, porque uma lesão destas normalmente exige 50 ou 60 dias antes de começar a andar novamente. Numa semana, dez dias, eu já estava de pé. Eu não fazia ideia do que tinha acontecido. Quando acordei, perguntei pelas pessoas, pelos meus colegas, e ninguém me dizia nada. Os médicos tinham essa indicação, de não me contarem, até o psicólogo chegar. Quando finalmente me contaram o que tinha acontecido, fiquei bloqueado, sem reagir. Foi um choque muito grande», sublinhou.
O avião que transportava a comitiva da Chapecoense despenhou-se em Medellín, Colômbia, na madrugada de 29 de novembro de 2016. Setenta e pessoas seguiam a bordo, entre jogadores, equipa técnica, staff, jornalistas e tripulantes, tendo apenas sobrevivido seis.