Opinião de Rogério Azevedo, que lembra as declarações de Frederico Varandas sobre o antigo presidente do FC Porto

E então, já tinham saudades do futebolzinho português?

Bem-vindos de volta ao mundo das conspirações e das inimizades no lugar das rivalidades. Um joga, os outros mandam comunicados. Gostamos disto assim, não é?

E então olhei à minha volta
Vi tanta mentira andar à solta
Que me perguntei
Se os hinos que cantei
Eram só promessas e ilusões
Que nunca passaram de canções

José Mário Branco, 1982

E pronto: numa semana, pouco mais de uma semana, está de volta o futebolzinho português. Tinham saudades? Eu não, embora seja fácil culpar a Comunicação Social pelo ruído constante em torno de arbitragens, benefícios, conluios, conspirações, arranjinhos, compadrios, influências e outros que tais.

Lamento, mas no final do dia o que a Comunicação Social faz — porque tem de ser lida, vista e ouvida sob pena de ser silenciada de vez — é corresponder ao que as pessoas querem ler, ver e ouvir. E os portugueses, convenhamos, gostam mesmo é destas tricas.

Vivemos quase um ano numa ilusão (utopia?) bonita: Rui Costa tinha substituído Filipe Vieira; Frederico Varandas tinha sucedido a Bruno de Carvalho; e, finalmente, André Villas-Boas tinha destronado Pinto da Costa. O futebolzinho ia ter um upgrade. Estava reunido um grupo de gente jovem, capaz de unir-se em torno do negócio e saber distinguir rivalidades de inimizades.

A morte de Pinto da Costa precipitou o que afinal, se calhar, era inevitável. Benfica e Sporting não deram os pêsames. O FC Porto levou a mal. Duas ou três entrevistas depois, três ou quatro jogos depois, tudo voltou a ser como dantes.

Voltou o espetro de cortes de relações entre clubes. Voltaram as críticas às arbitragens e as acusações mútuas de tentativa de controlo, quando não de alegados benefícios de uma máquina talhada para beneficiar um dos outros dois grandes em detrimento do nosso (a propósito, fico sempre com curiosidade de saber o que diz das arbitragens e do famigerado sistema, no fim de cada época, o clube que é campeão).

Um joga, os outros mandam comunicados. Se o que joga não ganha fala de conspirações. Se ganha lêem-se os comunicados dos outros. Amanhã, depois, para a semana, tudo será tristemente igual. E tende a agravar-se com a reta final do campeonato.

Como também escrevia José Mário Branco na canção citada no início deste texto, «foi um sonho lindo que acabou; houve aqui alguém que se enganou».

Toma hoje posse uma nova direção da Federação Portuguesa de Futebol. Era bom que o fizesse no clima utópico de há duas semanas, mas tal não é possível.

Afinal, somos todos portugueses e pelos vistos gostamos de viver assim as emoções.