O Esperança Atlético Clube regressou ao futebol sénior em 2022/2023 e já chegou à Dvisão de Elite da AF Coimbra Foto: Esperança Atlético Clube

Neste distrital não há «copo e bucha»: jogadores-estudantes levam o Esperança até à Elite

Regressaram ao futebol em 2022 e já conseguiram duas subidas consecutivas até à Divisão de Elite da AF Coimbra; um projeto que ressurgiu em parceria com o Instituto Politécnico de Coimbra e que quer mostrar aos jovens da formação que é possível conciliar o futebol com os estudos; «profissionalizar o amador» foi uma das chaves do sucesso

Regressou ao futebol sénior em 2022/2023 e já conta com duas promoções consecutivas, estando agora a caminho da Divisão de Elite da AF Coimbra. Curiosos com está história? Pois bem, vamos falar do Esperança Atlético Clube.

Fundado a 15 de fevereiro de 1962, alguns problemas financeiros nos últimos anos obrigaram à retirada do futebol sénior de uma equipa que se mostrou ao futebol português na 3.º divisão, durante seis épocas entre os anos 70 e 80.  Festejada mais uma promoção e já em preparação para próxima temporada, A BOLA esteve à conversa com o presidente do clube, Carlos Neves, e com o treinador principal, Rúben Ventura, para sabermos os segredos por trás do sucesso do Esperança Atlético Clube.

«Não foi uma surpresa, o objetivo era subir nestes dois anos. O segundo objetivo que tínhamos em mente era o de sermos campeões, mas não o conseguimos atingir. Logicamente que, agora que estamos na Divisão de Elite, há que reformular a forma como olhamos para o futebol já que esta competição assim o exige», começou por dizer o atual presidente do clube, sendo completado pelo técnico, Rúben Ventura, que realçou que a desconfiança inicial no projeto acabou por se tornar em elogios de várias partes, apesar do título ter fugido por apenas um ponto.

A equipa do Esperança a celebrar a sua segunda promoção consecutiva. Foto: Esperança Atlético Clube

«O feedback que os outros clubes davam era que éramos de uma equipa jovem, não ganhavam jogos, não eram regulares ou não tínhamos compromisso. No início, começámos a ganhar e essas ideias pré-concebidas diluíram-se, passando nós a ser caracterizados como uma equipa que corria muito, com muita qualidade. No primeiro ano, a subida era mais apetecível e conseguimos cedo. No segundo, deixámos de ser a equipa sem compromisso e os adversários tinham de dar tudo para ganhar. Olhavam para nós como uma equipa profissionalizada, com elevados índices físicos, o que foi algo que nos causou mais dificuldades e boas responsabilidades. Se ficou a faltar o título? Talvez tenha faltado, talvez tenha faltado alguma maturidade, pois estivemos cerca de 18 ou 19 jornadas em primeiro lugar, e o nosso adversário, o Pedrulhense, só esteve no topo da classificação na última jornada e acabou por ser campeão», reforçou.

Do regresso ao futebol até à primeira divisão distrital da AF Coimbra

Apareceu como pai de um jovem da formação, passou pela vice-presidência, mas foi como presidente do clube que Carlos Neves deu início a um processo, a caminhar para os seis anos, de reconstrução desportiva e financeira que, não só garantiu que o clube se mantivesse vivo, como também impulsou este sucesso recente no futebol distrital após anos de ausência «para recuperar as contas».

«Eu entro no clube há cerca de seis anos, primeiro como pai, depois como vice-presidente, até que, há cinco anos, candidatei-me, de modo a manter o clube vivo e já estou como presidente há um mandato e meio. Entretanto, peguei numa situação difícil a nível financeiro e a ideia inicial foi recuperar o clube financeiramente para depois começarmos a pensar em outros voos. O primeiro mandato foi nesse sentido e agora estamos a tentar dar um passo em frente, tendo em conta que houve uns anos que o clube não teve futebol sénior para recuperar as contas», salientou.

Carlos Neves é o presidente do Esperança Atlético Clube. Foto: Esperança Atlético Clube

O desejo do futebol sénior acabou por se concretizar graças a um protocolo estabelecido com o Instituto Politécnico de Coimbra, tendo como base o desejo da parte destes em ter os seus atletas e equipa técnica a competir além da liga universitária. Do lado do clube, além de formar uma equipa com base na juventude- a média de idades do plantel é de 22 anos - o objetivo era comprovar aos jovens da academia que seria possível aliar o sucesso desportivo com o escolar.

«Fizemos um protocolo com o Instituto Politécnico de Coimbra, com a ideia de formar uma equipa sénior com base nos estudantes que jogavam nos clubes das suas terras e que, pela distância que era das suas casas, tiveram de abandonar o futebol. Então demos essa possibilidade no nosso clube, formámos o futebol sénior. Com a pandemia procurámos o politécnico para estabelecer esta parceria, mas não tivemos sucesso. Depois tivemos em dúvida se íamos avançar com uma equipa sénior ou não, até que surgiu uma reunião com o responsável pelo desporto do politécnico, que tinha a ambição de colocar os seus atletas a competir durante todo o ano. Tendo este protocolo com o IPC e com uma equipa que a base são os estudantes, queríamos também passar uma imagem aos nossos jovens que estudar e jogar futebol é possível e a um nível mais ou menos elevado. Isso é a imagem que passamos aos nossos jovens, que jogar e estudar é compatível e o resultado é a nossa equipa sénior que são 25 jogadores estudantes que conseguem estudar e jogar futebol com sucesso», confessou-nos o presidente do clube conimbricense.

A mistura entre juventude o «profissionalizar o amador» são um dos fatores para o sucesso do clube. Foto: Esperança Atlético Clube

Formada a primeira equipa do novo Esperança a partir do zero, o técnico Rúben Ventura enfatizou que a profissionalização implementada desde o primeiro momento dentro do clube e no seio do grupo de trabalho foi muito importante para este ascendente.

«Estruturámos uma equipa técnica diferente das restantes, já que a minha é composta por dois adjuntos, um preparador físico e um treinador de guarda-redes, algo bastante incomum para a realidade em que estamos e para a própria realidade de muitas equipas do Campeonato de Portugal, que não têm este tipo de condições. A ideia sempre foi profissionalizar o amador. Se nós conseguirmos profissionalizar dentro daquilo que é o distrital estamos um passo à frente para ganhar e isso motivou o presidente», destacou o jovem de 27 anos, sendo esta uma ideia lembrada pelo presidente, salientando que, apesar de se tratar de futebol amador, não existe espaço para aqueles que querem vir para o «copo e bucha».

«Apesar de sermos amadores, trabalhamos a um nível elevado. Existe alguns jogadores que, às vezes, chegam ao nosso clube a pensar que vêm para, como costumo dizer, o copo e bucha, mas que acabam por sair porque a exigência é muito grande», destacou.

Neste período de sucesso recente do clube, as boas exibições trouxeram consigo os adeptos de novo ao estádio e os elogios ao estilo de jogo do Esperança acabaram por se suceder… até mesmo vindo das equipas de arbitragem.  

Rúben Ventura é um dos obreiros das duas promoções consecutivas para o Esperança Atlético Clube. Foto: Rúben Ventura

«O nosso futebol foi muito falado a nível de distrito. Somos uma equipa de futebol apoiado, com boas dinâmicas, de pressão alta e isso, num primeiro passo, levou ao passa a palavra, porque ganhávamos a jogar bem. Tivemos inclusive árbitros que diziam que dava prazer ver a nossa equipa a jogar, dava prazer ver o nosso futebol puro. Quem acompanha o futebol distrital sabe que existe sempre, aqueles jogadores mais velhos, com algumas manias, já não querem correr, os processos são o mais simples possível, e nós fazíamos exatamente o contrário. Os adeptos, um por um, foram aparecendo, os próprios país dos meninos da formação foram aparecendo quando a equipa ganhou uma maior dinâmica vencedora, outros foram vendo e gostaram, mas, num contexto geral, aquilo que o adepto de futebol gosta do que o Esperança apresentou e começaram a chegar mais pessoas. Embora não esteja satisfeito, pois temos de ter ainda mais pessoas na próxima época, mas, para aquilo que eram jogos quase sem adeptos, não nos podemos queixar. Para quem teve 50/60 no começo, ter 700 pessoas no jogo da subida de divisão é muito bom», destacou Rúben Ventura.

O futuro em parceria com o FC Porto e o desejo do Campeonato de Portugal

Chegados à Divisão de Elite do futebol de Coimbra é hora abordar o futuro, com este a ser feito em ligação ao FC Porto. O Esperança e os azuis e brancos assinaram um acordo de cooperação para a criação de uma Dragon Force, em Coimbra, até ao escalão de sub-15, algo que é visto pelo presidente Carlos Neves como importante para o «crescimento sustentado» de todos os que estão ligados ao clube.

«Assinámos para a próxima época um contrato com o FC Porto, para sermos um parceiro da Dragon Force oficial em Coimbra. Na próxima temporada, até aos sub-15, teremos esta ligação ao FC Porto. Nos restantes escalões, vamos aproveitar aquilo que é o know-how da formação do FC Porto e da metodologia usada por eles, para desenvolvermos ainda mais a nossa formação, aliado ao facto de poderem vir a recrutar alguns jogadores da região. Acresce a isto, termos treinadores com muita qualidade, que, com esta parceria, podem aspirar a outros voos. Até mesmo para a equipa sénior, é uma possibilidade de promover um crescimento sustentado, com alicerces fortes», perspetiva.  

Num pensamento a médio e longo prazo, a ideia é clara: o projeto pode ir longe. Contudo, este tem de ser realizado com base na estabilidade e não «com pés de barro», sublinha o presidente.

«Agora o nosso objetivo é trabalhar o clube do ponto de vista estrutural, de modo que exista possibilidade de lutar por outros voos. A ideia do Esperança com esta equipa é dar oportunidade aos juniores e aos restantes escalões da formação em prosseguir a carreira no clube. É um projeto de longo alcance, para se ir desenvolvendo aos poucos e não com pés de barro. Vemos muitos clubes a crescer muito depressa e o nosso tem de ter um crescimento sustentado e a médio ou longo prazo, sempre coerente», exprimiu. 

Apesar do sucesso recente, o desejo do Esperança é ter um crescimento sustentado e não com «pés de barro». Foto: Esperança Atlético Clube

Esta é uma ideia partilhada pelo técnico Rúben Ventura, que não descura o «sonho» em levar o clube ao Campeonato de Portugal.

«Acredito que vamos fazer uma época de estabilidade, a lutar para ficar a meio da tabela, mas acredito que, num curto médio prazo, podemos ir disputar o Campeonato de Portugal, porque trabalhamos para isso. Podem pensar que será um passo maior que a perna, mas se o sonho foi o nos trouxe até aqui e será o sonho que nos poderá levar a grandes palcos», concluiu.