OPINIÃO Sporting com tabus

OPINIÃO14.02.202509:15

Comunicar de forma clara o que se passa com Gyokeres, e outros lesionados, não levaria mal ao mundo, pelo menos ficava-se com a certeza de que não se está a esconder alguma coisa. Este é o 'Nunca mais é sábado', espaço de opinião de Nuno Raposo

Quando Rui Borges chegou ao Sporting sentou-se numa cadeira de sonho, a de treinador de um dos grandes de Portugal, na condição de campeão nacional e de olhos num bicampeonato inédito em 70 anos. Mas quando chegou ao Sporting, Rui Borges passou a ter de sentar-se nas cadeiras das salas de imprensa da Academia Cristiano Ronaldo, onde por norma faz as antevisões aos jogos, do Auditório Artur Agostinho no Estádio José Alvalade, onde fala após os encontros em casa e nas salas de imprensa dos adversários, onde é questionado no final dos encontros fora. Quando Rui Borges chegou ao Sporting, sabia que na memória coletiva estavam ainda as conferências de Ruben Amorim, que além de treinador foi também a voz do Sporting sobre a maioria dos temas. Quando Rui Borges chegou ao Sporting viu-se também a contas com lesões, muitas lesões, e um plantel desgastado e por isso também propício a mais lesões. Quando Rui Borges chegou ao Sporting, e neste contexto, apercebeu-se também que era por ele que iriam recair as questões mais difíceis, que Amorim também teve e tão bem soube responder.

Quando Rui Borges se senta para responder às perguntas dos jornalistas — e não o faz pela curiosidade de cada um dos elementos da comunicação social, fá-lo para comunicar com os adeptos, tendo os jornalistas como interlocutores —, sabe agora que vai ser bombardeado com o tema das lesões, sobretudo de Viktor Gyokeres, mas tal acontece por um simples motivo: tanto silêncio, oficial e até oficioso, leva a especulações muitas vezes contrafeitas. E é Rui Borges que tem de levar connosco — sobra para o treinador…

Desde que se sentou na cadeira verde e branca a 26 de dezembro de 2024, ou seja, há pouco mais de mês e meio, Rui Borges já falou em 11 conferências de imprensa de antevisão de jogos, outras 11 depois dos jogos e ainda outras 11 entrevistas rápidas para a TV. 33 vezes! Some-se também as antevisões extra nos jogos europeus, para a Sporting TV e para o canal que tem os direitos de transmissão da prova, as explicações de Rui Borges são já mais de 40 em tão curto espaço de tempo. E como já se viu, o treinador é obrigado a falar não apenas sobre o jogo: com o tema das lesões tão na ordem do dia, fala sobretudo sobre isso e menos sobre as questões técnicas e táticas. E será natural não se sentir à-vontade sobre o tema, não apenas por não ser médico mas sobretudo porque está obrigado, como funcionário, a não se desviar da linha do clube, que é mudo sobre lesões.

«O Sporting não faz comentários sobre o boletim clínico dos jogadores, a menos que se trate de uma situação grave ou de longa duração. É política do clube e uma questão de ética médica», conta fonte oficial dos verdes e brancos.

«Os clubes não dizem as lesões dos jogadores todos. Dizem quando são lesões de grande tempo de paragem, como nos joelhos. Lesões que são a longo prazo. Mas nós não podemos estar a especificar a lesão de Gyokeres», defende-se Rui Borges.

Mas o treinador é, quanto a mim, o menos culpado neste cenário que abre espaço a muita palavra solta e sem conhecimento de causa. Porque ao contrário do que se fez passar, o Sporting até nos casos de lesões mais graves e de longas paragens também chegou já a não dar explicações — foi assim na intervenção cirúrgica ao joelho direito de Gyokeres em maio do ano passado, que se tentou esconder; foi assim na intervenção nunca reconhecida que St. Juste também fez no verão; tem sido assim com a situação de Pedro Gonçalves que já dura há mais de três meses sem que os sportinguistas saibam o que realmente se passa com o talentoso avançado.

Sim, os jogadores podem não querer que se divulgue a situação clínica, pode haver pedido de sigilo, mas custa-me a acreditar que sejam eles a pedir silêncio, a pedir que não se explique aos adeptos o que estão a passar e quando podem voltar a entusiasmá-los nos relvados. É que ainda sou do tempo em que estas questões se respondiam com um simples telefonema para o médico do clube que nos explicava tudo sem tabus, isto quando não era dia de boletim clínico que era divulgado pelo menos uma vez por semana. E não havia problema algum, antes pelo contrário, porque por norma ficava-se com a certeza de que não se estava a esconder alguma coisa.