O presidente André Villas-Boas e o treinador Martín Anselmi
O presidente André Villas-Boas e o (ainda) treinador Martín Anselmi

O FC Porto e o seu irmão esquizofrénico

OPINIÃO24.06.202509:00

Temos uma SAD que no arrojo e transparência na gestão se alinhou com as exigências deste século e uma equipa que, no plano desportivo, aspira reviver o nível de excelência alcançado desde meados da década de 1980, mas que nem lá perto anda. 'Estádio do Bolhão' é o espaço de opinião semanal do jornalista Pascoal Sousa

O FC Porto é, desportivamente, um enigma difícil de decifrar. Como ninguém sabe ao certo o que tem ou teve mais peso na quebra do ADN Porto, lançam-se várias teses e todas elas são, diga-se, válidas: da fragilidade do plantel à estagnação do modelo tático de Anselmi, até à mudança de era, com o fim de Pinto da Costa e a entrada de André Villas-Boas. As viúvas, tão ativas nas redes sociais, preferem essa última explicação, esquecendo-se, por exemplo, que quando Pinto da Costa foi eleito presidente, o FC Porto demorou três anos a ser campeão nacional (ganhara uma Supertaça e uma Taça de Portugal) e a tornar-se, então, sim, de forma indiscutível, o presidente dos presidentes. Antes dos 69 troféus de PC, sete deles internacionais, os azuis e brancos tinham vencido oito Campeonatos de Portugal/Liga, três Taças de Portugal e três Supertaças.

A pressão à volta do PC foi a que ele próprio criou contra o conformismo que asfixiava um clube que, ganhando ou perdendo, seguia a sua vida como se nada fosse. Isto mudou e mudou para sempre e essa foi a herança que Villas-Boas recebeu, com 80 por cento dos portistas a confiarem no seu projeto nas eleições de 27 de abril de 2024. Independentemente de ser em 2024 ou em 1982, ano em que PC foi eleito, há sempre elementos que se renovam e dinâmicas que se transformam quando um ciclo termina e outro se inicia. O que AVB prometeu ao nível da transparência, da bilhética, da construção de um centro de alto rendimento no Olival, do fim dos privilégios Super Dragões (muitos deles nem sócios eram), da renegociação da colossal dívida da SAD, da convergência com a UEFA devido ao incumprimento que herdou (e que ainda obriga a controlos trimestrais rigorosos), de devolver o clube aos sócios (hoje são mais de 150 mil) e pagar os ordenados em atraso ao plantel e funcionários, tudo foi cumprido.

Aqui chegados, a conclusão é óbvia: há dois FC Portos. Por um lado, temos um clube que, no que diz respeito ao arrojo e transparência na gestão, se alinhou com as exigências deste século. Por outro, encontramos um FC Porto que, no plano desportivo, aspira reviver o nível de excelência alcançado desde meados da década de 1980, mas que, na prática, se entrega a exercícios de autoflagelação. Recuperar esse ADN leva tempo, mas pode começar-se pela mais simples das conclusões: não houve um único jogo dos 20 orientados por Anselmi (escrevo este texto antes do Al Ahly) em que o portista saísse verdadeiramente satisfeito, de barriga cheia ou com a convicção de que existe um caminho claro e lógico para alcançar os títulos. A ausência de uma identidade consistente e de um futebol que entusiasme tem sido notória, o que nos leva a questionar os passos necessários para reverter esta situação. Um murro na mesa pode não chegar...

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