Diogo Jota e André Silva

Diogo Silva e André Silva

'Para lá da linha' é um espaço de opinião semanal

Ando há quatro dias a escrever Diogo Jota e André Silva, mas no fundo sei que está errado. Desde quinta-feira de manhã, quando se confirmou a notícia que os dois tinham perdido a vida num acidente de carro de madrugada, numa autoestrada espanhola, ele passou a ser Diogo Silva. 

Porque deixou de ser um pouco de todos nós, e passou a ser mais da família. Diogo José Teixeira da Silva e André Filipe Teixeira da Silva, assim é que está bem. É da família a dor maior de perder dois filhos, um pai, um tio, um marido, um namorado, ainda que todos nós tenhamos também sido primeiro impactados pela incredulidade.

Adotou o Jota – do seu segundo nome, José - para se distinguir, e a aposta compensou, condensando em si a maravilha de jogar tão bem com os pés como com as mãos - afinal a PlayStation e os eSports eram outra área em que se destacou. Quem não se lembra quando teve de deixar um torneio online de FIFA 22 a meio porque ia ter jogo? Foi daí que surgiu a celebração sentado, no sábado replicada por Dembélé ou Diogo Gonçalves.

Ser unanimemente considerado uma pessoa excecional não está ao alcance de muitos, e ele era-o mesmo antes de sair para aquela autoestrada com o irmão ao lado. 

Só isso justifica o empenho de Rúben Neves e João Cancelo, que depois de jogarem pelo Al Hilal contra o Fluminense, em claro esforço mental, encetaram uma viagem de mais de 6 mil quilómetros de avião, de cerca de 10 horas, toda a noite, entre Orlando, nos Estados Unidos, e o Porto, para estar em Gondomar no funeral. No caso de Rúben, para estar literamente ao lado de Rute.

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A curiosa cultura desportiva em Inglaterra, que vai dos cânticos mais ofensivos aos maiores gestos de fairplay, inclinou-se para este último, e, porque os rivais devem reger-se sobretudo por respeito, o Everton teve grande classe ao enviar Beto e Chermiti ao memorial expontâneo que se começou a criar junto a Anfield logo nas primeiras horas de quinta-feira, onde os adeptos deixaram balões, flores, fotos, cachecóis e comandos de consola. Claro. 

Poucas figuras públicas são mais ferrenhas pelo Manchester City do que os irmãos Noel e Liam Gallagher, que mesmo assim usaram o concerto de regresso aos palcos, 16 anos depois, em Cardiff, para lembrar o Diogo. Que também esteve em Birminghham, no Villa Park, sábado, no concerto de despedida dos Black Sabbath. 

Oasis lembram Diogo Jota em concerto (Jamie Talbot/X)

Nos próximos dias, as coisas vão acalmar para os que estão de fora e intensificar-se em dor para a família. Que se possam agarrar um bocadinho a isto quando tudo falhar.