André Villas-Boas deverá ter de assumir em breve a contratação do terceiro treinador da sua ainda curta presidência
André Villas-Boas deverá ter de assumir em breve a contratação do terceiro treinador da sua ainda curta presidência

Villas-Boas e a terceira encruzilhada no FC Porto

Serão Farioli ou Jesus nomes que fazem sentido, na atual conjuntura, para o banco do FC Porto? Mais do que uma ideia de futuro, o presidente azul e branco tem de comprar uma para o presente

Ainda há pouco partiu na sua viagem de sonho enquanto presidente do FC Porto e já André Villas-Boas chegou a uma nova encruzilhada. O Mundial de Clubes ter-lhe-á provado, em definitivo, que Martín Anselmi não é o presente, quanto mais o futuro, e o argentino, mais tarde ou mais cedo, arrumará os objetos pessoais da secretária em caixas de cartão e partirá para outras paragens, talvez do outro lado do Atlântico. Será apenas uma questão de tempo. Talvez já seja tarde, como escrevi antes, pelo que significa na preparação para a nova época, e sem justificação aparente, já que este grupo com estas ideias dificilmente conseguiria fazer um milagre nos Estados Unidos e mudar todo o paradigma.

Mesmo o grande rival Benfica com o apuramento para os oitavos de final do Mundial de Clubes, e pelas dúvidas que não dissipa — sobretudo em contextos diferentes do que aquele em que se apresentou diante do Bayern, ao entregar com naturalidade a bola aos alemães, preparando-se para atacar o espaço disponível —, dificilmente o alterará. Bruno Lage não é hoje um treinador mais indicado para o Benfica do que era antes do encontro de Charlotte, tal como Rui Costa não se tornou melhor presidente — apesar dos esforços do técnico no seu discurso pós-jogo, com os elogios — ou sequer um líder para o clube que tenho a certeza que adora.

Villas-Boas partiu para a decisão sem aparentemente ter um plano concreto, ainda que transpire uma ou outra ideia, o que faz do próximo treinador do FC Porto grande incógnita. Que não haja dúvidas! A terceira escolha, e não é por ser ditado, convém mesmo que seja de vez.

O presidente dos dragões não precisa de acertar num técnico campeão, mas sim num adequado ao contexto, que torne a equipa competitiva numa conjuntura de vacas magras, herdada dos últimos anos de gestão de Pinto da Costa. Terá de fazê-lo ainda que possa não passar de ideia a curto prazo, apenas para a convalescença do Dragão, ganhando tempo para aposta de maior impacto e, essa sim, responsável pela criação de uma identidade futebolística ganhadora, com a massa crítica necessária. Entretanto, o discurso tem de ser ajustado à realidade, algo que também peca por tardio, sob o risco de se tornar desculpa esfarrapada.

São poucos os que fazem muito com pouco e o FC Porto até tinha um deles. Sérgio Conceição conseguiu impedir que uma crise latente há muitos anos se tornasse profunda, defendendo com resultados e alguns títulos — contando também, algumas vezes, com a incompetência dos rivais — a vigência do amigo Pinto da Costa. Entretanto, a decadência do plantel encontrou finalmente ponto de não retorno, tanto que os dragões, quando Villas-Boas tomou posse, já não eram campeões há duas temporadas. Mesmo que tivesse continuado o técnico que conquistou três títulos, nenhum consecutivo, quatro Taças de Portugal, três Supertaças e uma Taça da Liga em sete épocas não podem existir certezas de que as coisas pudessem ter corrido melhor.

Benfica e Sporting têm plantéis mais profundos e, sem dúvida, mais talento. Até o SC Braga se pode equiparar aos portistas. Villas-Boas não tem escapatória: está obrigado a reconhecer que não pode competir nos mesmos termos. Porque não tem dinheiro. Porque herdou problemas que vão demorar a resolver. Porque cada contratação errada se paga com juros elevados, uma vez que não tem a margem que outros tiveram. E isso muda tudo.

A promoção de Vítor Bruno tornou-se um erro porque lhe foi exigido mais do que era possível e ele próprio, iludido pelo papel principal, aceitou tão elevada fasquia. Hoje, olha-se para os resultados e estes até eram melhores com o antigo adjunto de Conceição quando comparados com Anselmi, que chegou portador de uma ideia de jogo moderna e sedutora: futebol de autor, progressivo, com bola e grande dinâmica. E é exatamente por o plantel não ter intérpretes para tal partitura mais exigente que os resultados pioraram. Onde o modelo exige alas velozes, criativos e também sólidos defensivamente, o FC Porto treme. Onde o sistema pede centrais capazes de promover saída limpa sobre pressão, seja em certeza de passe ou em transporte de bola, há desconforto. Onde se espera criatividade entre linhas, existe bloqueio, à exceção de um jovem prodígio, que sem essa obrigação, é a única luz ao fundo do túnel: Rodrigo Mora. Onde o plano pede tempo, as bancadas clamam por resultados, mas, sobretudo, evolução. E é das teias dessa falta de evolução que o jovem argentino não encontra forma de se libertar. Acabará devorado como presa da própria ideia.

Regressa-se ao ponto de partida: a escolha de um novo treinador. O terceiro da curta era Villas-Boas. E, por muito que custe ao adepto ouvi-lo, o FC Porto não pode, para já, competir nos mesmos termos com Benfica e Sporting. Pior será fingir que sim e continuar a falhar. A prioridade, neste momento, não pode ser um novo projeto de autor. Não pode ser a construção de um novo estilo, nem a prossecução de uma ideia para o futuro. No Dragão, precisa-se de alguém que camufle as debilidades evidentes, que reduza o número de vulnerabilidades, que simplifique processos e que torne a equipa mais competitiva, com os jogadores nas posições certas. Alguém que reorganize, proteja, motive e saiba como sobreviver.

O próximo treinador não tem de ser uma revolução. Tem de ser competente e possuir capacidade para se adaptar ao difícil contexto e ao plantel que lhe derem, ser empático e possuir inteligência emocional. Se for também uma ideia de futuro tanto melhor, todavia, tem de ser sim o técnico que ajudará a lá chegar. Que permita ao FC Porto ganhar tempo, proteger-se e criar uma estrutura forte. A médio prazo serão preciso ideias, um novo elevar da exigência, a redefinição da política desportiva, contudo, até lá, o Dragão precisa rapidamente de um presente: um treinador com bússola e não um que domine a ciência de construir foguetões. Alguém que saiba passar entre as gotas da chuva. Porque a tempestade está longe de ter acabado.

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