O verdadeiro significado de NÓS!
Temos jogadores com experiência, qualidade, mentalidade, inteligência emocional e capacidade intelectual para o perceberem
F RASE: «A única palavra que está escrita na sala de palestras e no balneário é NÓS:» Foi proferida por Fernando Santos na conferência de imprensa de antevisão do jogo com o Gana. Para quem já esteve dentro dos relvados e de um balneário, esta afirmação tem um grande significado. O NÓS que Fernando Santos abordou ganha várias dimensões, todas fundamentais para se alcançar a vitória. Pressupõe que a equipa, o coletivo, esteja sempre acima do individual e tem de ser o líder a garantir esta premissa. A união, o sacrifício, a solidariedade, a determinação, a crença ou a entreajuda estão presentes nesta palavra e são fundamentais para qualquer seleção atingir o ponto máximo. Mas o NÓS ganha uma dimensão especial quando olhamos para os 26 jogadores eleitos (e aqueles que ficaram de fora). Abordando apenas factos, estamos na presença de um conjunto de atletas que têm todos os condimentos para nos permitir sonhar. Experiência, qualidade, mentalidade, inteligência emocional e capacidade intelectual para perceberem tudo isto que referi. Todos com ambição de fazer história e, sobretudo, com a noção de que podem jogar olhos nos olhos com qualquer adversário, até porque este é o seu dia-a-dia. E é aqui que o NÓS ganha um significado especial. O NÓS tem de estar alicerçado nas nossas características, em assumir o jogo sem receios, em ter bola, em criar espaços e momentos para que os nossos virtuosos possam desequilibrar o jogo. O NÓS pressupõe respeito, preparação mas também alegria. Os nossos jogadores têm de sentir que este é o caminho para o sucesso. Todos eles têm a perceção de que quem controla a bola, quem está confortável em campo, tem muito mais hipóteses de ser feliz e de alcançar o sucesso.
DAS PALAVRAS AOS ATOS
F ALAR é sempre muito mais fácil do que executar. Todos nós no pós-jogo, tomaríamos as decisões que se justificavam dentro do relvado porque já conhecemos o filme do jogo. No caso dos treinadores ou selecionadores a dificuldade aumenta. A comunicação, nos dias de hoje, é uma ferramenta muito poderosa que pode agregar, unir e motivar. Mas não basta ter uma boa comunicação. Um bom líder é aquele que entra na cabeça dos jogadores, que os faz acreditar numa ideia. Já um excelente líder é o que consegue mexer com a mente dos jogadores e o que lhes propicia condições e mecanismos para poderem demonstrar as suas capacidades ou competências. Dito isto, quando analisamos as declarações de Fernando Santos e o significado de NÓS, concluímos que o que o nosso selecionador nos quer dizer é que temos a capacidade para controlar o jogo, a bola e os adversários. Mas quando olhamos para o que se passa dentro do relvado, percebemos que essa ideia está assente na imaginação e inspiração dos jogadores e não numa ideia de jogo bem definida, com movimentos padronizados ou automatismos que permitem aos jogadores jogar de olhos fechados.
COMO AJUDAR OS JOGADORES
O papel de um selecionador é ajudar os jogadores, dentro do relvado, a ultrapassarem os obstáculos que vão surgindo. Percebemos claramente que não será pela dinâmica coletiva trabalhada que iremos atingir o sucesso. Assim sendo, o selecionador deverá tentar utilizar outros recursos que estão à sua disposição. Para quem tem um plantel com tanta qualidade, fica percetível que um dos pressupostos para poder obter sucesso é colocar os jogadores nos sítios certos, de forma a que estes estejam confortáveis em campo. Ora, se analisarmos o jogo com o Gana, verificamos que Bruno Fernandes jogou no lado direito do ataque, que Bernardo andou por zonas que não favorecem as suas qualidades ou que Otávio a jogar no meio não atuou na posição onde rende mais e pode ser mais útil.
Outro argumento que pode ser utilizado por Fernando Santos são as características diferenciadas dos jogadores. Neste caso, percebemos que não tivemos (durante muito tempo) nenhum jogador com capacidade para ganhar a profundidade ou para acelerar o jogo com bola. A entrada de Rafael Leão mudou o jogo e fez a diferença, por dois fatores distintos. O primeiro porque obrigou Fernando Santos a colocar os jogadores nas posições em que rendem mais (Bruno Fernandes deslocou-se para o meio). O segundo, porque o próprio Rafael tem características diferenciadas, de agressividade ofensiva, de ataque à profundidade ou de aceleração de jogo. Ficámos mais imprevisíveis e mais perigosos.
Sabemos que o principal era conquistar os 3 pontos, mas não podemos correr o risco de nos sentirmos satisfeitos. Todos temos a noção que, dificilmente, seremos um coletivo entusiasmante como é a Espanha. Mas podemos fazer muito melhor do que fizemos contra o Gana, bastando para isso que Fernando Santos mexa com a cabeça dos jogadores (motivação), que os coloque nos sítios certos (sentirem-se confortáveis), que utilize jogadores que se complementem e com características diferenciadoras, de forma a podermos ser mais imprevisíveis e resolver o jogo pela via da inspiração individual.
A ESPANHA DE LUÍS ENRIQUE
A Espanha é a seleção que melhor personifica a palavra NÓS. Tem um selecionador com uma ideia de jogo bem vincada, mas acima de tudo muito bem trabalhada. Escolhe os jogadores em função das características que pretende implementar na sua seleção. Não olha a nomes. Prepara a equipa para controlar o jogo em termos coletivos, mas também convoca jogadores com competências diferentes, de forma a poder abanar os adversários pela via individual, dentro de um coletivo com movimentos bem definidos ou padronizados. Consegue encontrar um equilíbrio entre experiência e irreverência, com o critério qualidade a sobrepor-se sempre. Exige compromisso e quer que os jogadores joguem no risco. Procura anular os pontos fortes do adversário, retirando-lhe aquilo que é fundamental no jogo, a bola, tentando desgastá-lo física e mentalmente. Assume as suas opções, dá o peito às balas, mas gera uma convicção muito forte nos seus atletas e nos seus adeptos. Luís Enrique, por tudo o que foi mencionado, consegue ainda outro fator. Normalmente diz-se que o trabalho de um selecionador é muito mental, de motivação e não de trabalho no campo. O selecionador de Espanha contraria esse chavão, conseguindo complementar estas duas capacidades. Entra na cabeça dos jogadores e faz com que se sintam confortáveis e alegres em campo. Claro que o selecionador de Espanha tem esta abordagem porque sabe que tem qualidade para o fazer. Espanha não vai ganhar sempre, mas estará sempre mais perto da vitória pela forma como, independentemente do adversário ou do resultado, procura impor as suas ideias ou o ADN Luís Enrique.
MOMENTOS MARCANTES
O Mundial é fértil em acontecimentos. Na última semana, tivemos alguns momentos únicos e que tornam o futebol tão apaixonante. Dentro dos relvados, o segundo golo de Richarlison contra a Sérvia é uma verdadeira obra de arte. O gesto ganha ainda maior dimensão por se tratar de um jogador que demonstra a paixão e emoção com que joga pelo escrete.
Fora dos relvados, o Gana deu-nos uma grande lição. O mundial é um evento único, especial e que deve ser vivido com alegria por todos aqueles que têm hipótese de participar. A chegada ao balneário para o jogo com Portugal foi um momento delicioso. Com os mais experientes à frente, todos foram cantando e dançando, libertando-se da pressão e desfrutando de um momento único. Chegados ao balneário, a música terminou e a concentração imperou.
A VALORIZAR
BRASIL
O jogo com a Sérvia, mostrou-nos um Brasil alegre, organizado, com os jogadores nos sítios certos. Com Neymar (que saiu lesionado) como grande referência a ser complementado por jogadores de características diferentes, que permitem um jogo dinâmico, imprevisível e agressivo na procura pela baliza do adversário.
RONALDO
Mais um recorde. Primeiro jogador a marcar em 5 mundiais diferentes. É incrível o que CR7 tem alcançado e conquistado. Muitos só irão entender a real dimensão de Ronaldo ou Messi, quando estes se retirarem e perceberem que dificilmente surgirão outros jogadores com a capacidade de marcarem 40/50 golos ao ano, durante 15 anos.
IRÃO
Uma seleção que joga com emoção, compromisso e união. Jogadores que são ídolos no seu país e que são a voz de muitos que estão a sofrer em silêncio. Uma boa exibição frente ao País de Gales sob a batuta de Taremi e o comando do nosso Carlos Queiroz.
ENZO FERNÁNDEZ
No seguimento da grande época que está a fazer no Benfica, começa a afirmar-se na seleção argentina. O golaço contra o México poderá dar-lhe a titularidade no duelo decisivo frente À Polónia.
A DESVALORIZAR
ALEMANHA
Apesar de não ter feito uma má exibição, a derrota frente ao Japão coloca a Alemanha numa situação complicada. O jogo de hoje contra a Espanha será uma verdadeira final para as ambições germânicas.