Ricardo Vasconcelos: «A Seleção nunca serão os 12 melhores jogadores de Portugal»
— Tem aqui uma equipa veterana, onde muitas delas estão em final de carreira. Apanhando ainda alguma dessa veterania e misturando com a juventude que já começou a entrar, tem receio que não se repita a qualificação para o próximo Europeu com essa mudança?
— Não tenho receio, tenho é essa ambição, ou seja, na minha vida enquanto selecionador tive sempre muita preocupação de ter três grupos de jogadoras: dos 30 anos, dos 27 e dos 23 ou pouco mais. Temos que ter gente que sabe exatamente o que tem que fazer, outras que estão no seu momento máximo, onde a experiência já é boa, mas a força física ainda é top. E também quem está a começar a entender, mas começou a perder o contacto com o [jogo] internacional porque as sub-20 terminaram há dois/três anos e necessitam de incorporar este grupo.
Toda a preocupação quando faço uma Seleção são essas três gerações. Caso contrário, se todas as jogadoras que aqui estiverem forem de 30 anos, quando cair uma, caem todas, quando sair uma, saem todas. E quem vier a seguir tem que começar do zero. Pegarem em basquetebolistas com 24, 26/27 anos, que nunca disputaram este tipo de provas, é muito difícil conseguir resultados. Mais do que o papel para a idade, não é essa a ideia, é ter um confronto de idades, de momentos diferentes na vida desportiva, que possam dar um bom equilíbrio. E um bom equilíbrio é uma boa equipa, e uma boa equipa é uma boa seleção. A Seleção nunca serão os 12 melhores jogadores de Portugal. Nunca. Porque se os 12 melhores forem todos da mesma posição, desde logo não se faz equipa nenhuma.
— E é mais complicado, diferente, ter uma Seleção onde não há uma estrela, alguém que lhe garanta 30 pontos por jogo?
— É mais difícil, porque a orquestra tem que estar bastante mais afinada. É tudo uma ideia de detalhes táticos, para que o melhor de cada uma possa vir ao de cima. Mas o melhor de cada uma só pode vir ao de cima se a colega fizer o trabalho correto e adequado. Um mau passe, porque foi demasiado alto, tira-me o lançamento. E se me tira já não consigo construí-lo porque não tenho essa capacidade. Se estamos a falar de qualquer detalhe técnico ou tático, muda a performance desta equipa. É mais difícil? É diferente. Não quero dizer que é mais difícil, senão parece que estou a afirmar que o nosso trabalho é o melhor do mundo. É diferente saber que se tem um jogador que resolve problemas, que cria os seus próprios tiros e que cria muitos desequilíbrios. Em momentos em que a equipa tem baixos ou não é sólida o suficiente para se manter à tona, ter alguém que puxa o barco para cima, é ótimo. Aqui não temos. Temos outras coisas, vamos à procura do que temos.
— Que basquetebol é que pretende que esta equipa jogue no europeu?
— Não podemos perder a nossa identidade, que é um ADN defensivo. Somos uma equipa que defensivamente cria muitas dificuldades. Somos chatos! Somos uma equipa chata de jogar. Às vezes isso faz com que o nosso baquete não seja muito atrativo porque precisamos mais de destruir do que construir. Custa-nos construir. Não nos sai fluido o nosso trabalho.
— E não é uma equipa muito alta.
— Nada. Então, temos que subir no campo inteiro, criar muitos desgastes, de contar com várias pessoas a poderem entrar no campo e trazerem essa energia, que tantas e tantas vezes é o que faz a diferença. Esse é o primeiro ponto. A partir daí, que drible pouco, corra muito. E muitas das jogadoras que temos têm o hábito contrário: bater muita a bola, driblar demasiado, correr menos. Porque nos seus clubes, os jogadores estáticos são melhores que os dos rivais, mas essa não é a nossa realidade. Quanto mais estático for o jogo, maior é a dificuldade de fazer chegar a bola perto do cesto. Na Seleção, pomos a bola perto do cesto quanto mais dinâmicos formos.
— República Checa, Bélgica e Montenegro são os adversários. Que objetivo consegue traçar para esta fase de grupos?
— O nosso objetivo é, claramente, ganhar o primeiro jogo, porque qualificados já estamos...
— Contra as campeãs da Europa?
— É o primeiro jogo, não é? A Bélgica é o primeiro e quanto antes melhor. O basquete tem uma coisa maravilhosa, não se pode jogar para o empate, para o anti-jogo. Temos que jogar para ganhar. Vamos disputar três jogos para vencer. Se ganharmos um, penso que fizemos um ótimo campeonato. Será bastante positivo. Até porque, com um sistema de empate, às vezes pode ser possível sonhar. Se vencermos dois, será brilhante. Mas o que queremos ganhar é o primeiro. Até para acreditarmos que somos capazes. O que vai realmente mudar a mentalidade é a primeira vitória. Precisamos dela e vamos trabalhar tudo para conseguirmos.
— Frente à Bélgica, não tem receio que lhe chamem irrealista, sonhador…?
— Ao não poder jogar para empatar, só posso fazê-lo para vencer. Joguei bastantes vezes para ganhar e perdi, muitas vezes. Mas noutras ganhámos. Vão-me chamar de tudo na mesma. Não me importo.