Miguel Cardoso acredita que o Shakhtar seria das melhores equipas da Europa se não fosse a guerra

A dura realidade da Ucrânia

Emoção e sofrimento quando fala de uma guerra que considera que nasceu de uma manipulação da Rússia

Quando a pergunta é feita, Miguel Cardoso engole em seco, espera uma fração de segundo e fala depois de um profundo sofrimento. «Luís, confesso que até fiquei com pele de galinha e um bocado emocionado porque tentei desligar-me ao longo dos últimos meses de tudo aquilo que se passa por lá. Isto porque, como o Luís sentiu provavelmente quando conversámos, eu sofri bastante, muito mesmo no início da guerra. Eu estava em Donetsk em 2014 quando tudo começou. Eu sei que aquela guerra foi manipulada desde o início pela Rússia. Eu vivi, sou testemunha disso por tudo aquilo que foi vivido, (7:30) não interessa estar aqui a detalhar», começou por relatar. 

A avaliação continua com o mesmo prisma: «Foi toda uma cabala, toda uma estratégia montada para atingir aquilo que hoje em dia o mundo está a assistir. 

Naturalmente que a posição dos Estados Unidos e do seu presidente transporta para todo este contexto um nível de agressividade superior, mas eu não me relaciono com isso, eu relaciono-me com aqueles que vivem lá na Ucrânia.

Com aqueles que me deram tanto amor durante quatro anos e meio que lá vivi. E que são um povo tão bom, gente tão simples, tão próxima, que apenas queria viver, construiu um país, desenvolveu um país, um país pobre, mas um país de gente saudável, em crescimento, uma nova geração que estava ávida de se libertar de tudo aquilo que ainda carregava do passado, de fazer o país desenvolver.» 

Uma ferida que não se fecha: «Ver pessoas permanentemente a sofrer, famílias a serem destruídas, jovens com sonhos destruídos e idosos que também têm direito de viver até ao fim. Cidades a serem destruídas, é dilacerante, é absolutamente dilacerante. Eu sei que o mundo não vive só a guerra da Ucrânia, há outras que são tão duras e tão impactantes quanto a guerra na Ucrânia, mas eu tenho naturalmente que me relacionar com os contextos que vivi, com as pessoas que conheci, com aqueles que hoje em dia vejo sofrer e com aqueles que viram destruído tudo o que construíram.» O treinador sente que não fosse o conflito armado e o Shaktar era hoje uma potência. 

«Aquele foi um clube ímpar, porque o Shakhtar era uma estrutura das mais profissionais que eu conheci, o clube mais bem estruturado que eu conheci, que estava a preparar-se para ser claramente um tubarão a nível europeu. Com um estádio extraordinário, com condições extraordinárias, com jogadores de uma qualidade incrível. Hoje em dia continua a ser uma equipa bonita, mas naturalmente com todos esses sonhos focaram condicionados.»