«A minha mulher até me disse: 'Tu nunca choras!'»

Benfica «A minha mulher até me disse: 'Tu nunca choras!'»

NACIONAL31.05.202322:51

Após sete temporadas e meia de ligação ao Benfica, Grimaldo despediu-se com uma entrevista à Benfica TV, deixando para trás 303 jogos oficiais, 27 golos marcados e nove títulos conquistados (4 Campeonatos Nacionais, 3 Supertaças, 1 Taça de Portugal e 1 Taça da Liga).

Golo ao Santa Clara

«A verdade é que foi um momento muito especial, muito bonito. Os momentos após marcar o golo foram de uma grande emoção, porque passei aqui muitos anos. Praticamente toda a minha carreira desportiva foi feita aqui e acabou por ser um momento muito emocionante para mim. Vieram-me à memória as recordações de todos estes anos com os meus companheiros, com os adeptos e com o clube. Estou muito triste por partir. Estávamos a disputar o campeonato e tentei concentrar-me, apenas, na necessidade de vencer. Não podia desconcentrar-me do jogo e do foco de conquistar o título. Mas, justamente com o meu golo, que valeu o 3-0, o campeonato estava na mão. Marcar nesse momento foi uma explosão de emoção, sentimentos e vim-me um bocado abaixo. Tentei recompor-me, porque o jogo ainda não tinha acabado, mas não foi fácil. Desde o último penálti que tinha sido assinalado ao Benfica, que até fui eu a marcar, o mister decidiu que os marcadores eram eu e o João Mário e que, no campo, podíamos decidir quem avançava para a cobrança. Quando o penálti foi assinalado, eu e o João Mário falámos alguns segundos e ele disse 'marca tu'. É complicado porque eu não sou uma pessoa que se emociona facilmente e que muito menos chora. Inclusive, a minha mulher, quando terminou o jogo, estava surpreendida e disse-me 'nunca gostas de te emocionar e nunca choras'. Mas são muitos anos e cerca de 64 mil pessoas, não sei exatamente quantas estavam, a gritarem o teu nome no último jogo. Marcar um golo e saber que depois desse jogo não vais jogar ali no próximo ano não é fácil. São muitas emoções. É uma sensação de alegria pelo golo e por tudo o que se passava, mas também de tristeza porque vou deixar o clube. Toda a gente já me enviou as imagens várias vezes e vão ficar gravadas na minha memória para sempre. É um momento que vai ficar na minha história. Foi algo incrível.»

O percurso no Benfica

«Sinto-me muito orgulhoso porque quando cheguei era muito novo e não sabia como iam correr as coisas noutro país e numa equipa desta dimensão. Mas, depois, com trabalho, com a confiança dos treinadores e dos adeptos fui crescendo. Nunca imaginei que ia jogar mais de 300 jogos por este clube. É incrível porque entras na história do clube e isso deixa-te orgulhoso.»

A melhor despedida

«Desde o momento em que surgiu a possibilidade de sair já sabia que tinha de sair com este título, porque não vencíamos o campeonato há três anos. Estávamos tristes e tínhamos de mudar a dinâmica para voltar aos títulos e devolver o clube ao patamar onde tem de estar. Saio da melhor forma, após despedir-me de todos no Marquês de Pombal, como aconteceu.»

Campeão justo

«Penso que vencemos tranquilamente. Fomos muito superiores aos adversários. Observando a tabela classificativa só vemos dois pontos, mas cada jogo e cada exibição foram muito superiores ao que a classificação final demonstra. Somos a melhor equipa e mostrámos isso, tanto marcando golos como não os sofrendo. No final, merecemos este título.»

A festa do título

«Foi muito especial, porque sabia que era a última vez. Tinha de aproveitar ao máximo, ver cada detalhe no Estádio e no Marquês de Pombal. Há dois momentos a destacar. A saída do Estádio da Luz no autocarro foi algo incrível. É algo que tem de ser vivido, porque não se pode explicar. E, depois, na chegada ao Marquês de Pombal, quando vês a quantidade de pessoas que ali estão... É incrível! São duas imagens que ficam gravadas na memória e que nos motivam a lutar para que se repitam. Eu não vou ter essa possibilidade, mas os meus companheiros que viveram esses momentos vão desejar viver tudo isto outra vez com o 39.»

Longevidade no clube

«Quando cá cheguei não sabia se ia, ou não, ficar muito tempo. Na verdade, só quando se chega aqui, se vê o clube e se sente tudo o que há em torno dele é que começas a amar o clube. Durante estes anos comecei a gostar muito desde clube. Comecei a amar este clube. Já na última renovação decidi ficar aqui porque amava este clube e queria continuar a usar esta camisola. E, chegados ao dia de hoje, depois destes anos, é o momento de dizer adeus. Mas, como disse há uns dias, não é por não amar este clube, mas sim por desafios pessoais.»

Braçadeira de capitão

«Claro que fico orgulhoso. Sempre me senti, durante estes últimos anos, um capitão dentro do balneário. Não é só quem traz a braçadeira que é o capitão. A equipa precisa de vários líderes e eu senti-me um deles. É um orgulho para mim ter essa fotografia com a braçadeira, porque é algo que vai ficar para sempre comigo e que me enche de orgulho.»

Mais de 300 jogos pelas águias

«Creio que fiz história no clube, porque é difícil chegar a esses números, sobretudo quando não se nasceu aqui, se vem de outro país e se passa metade da vida praticamente aqui a jogar por um clube. Isso deixa-me muito feliz e orgulhoso por tudo o que consegui, e quem sabe se no futuro poderei a voltar a ajudar outra vez, seja dentro ou fora das quatro linhas. Vou acompanhar sempre o Benfica, porque é o clube da minha vida, da minha carreira desportiva. Realmente, nunca estarei em outro clube tantos anos como estive aqui. E a verdade é que nunca se sabe o que poderá acontecer no futuro.»

Porta aberta ao regresso

«Claro que sim. Saio daqui muito feliz com tudo o que atingi, mas nunca se sabe se depois se pode ajudar o clube, dentro ou fora do campo. Certamente que vou continuar a apoiar o mister, o presidente, todos os meus companheiros, todo o staff, os fisioterapeutas... São muitos anos com cada um, com cada pessoa, e depois não partimos de um dia para o outro como se nada tivesse acontecido. Mas aconteceu... e muito. E irei recordá-lo.»

As saudades

«De muita coisa! Acaba por ser o dia a dia, o que mais se sente. Vamos treinar todos os dias e temos os nossos companheiros, os preparadores, os fisioterapeutas, estou com eles há quase oito anos. Saudades de todos, de cada pormenor. Ir ao Estádio, estar neste Estádio incrível, com 60 mil pessoas em todos os jogos, de tudo. Vou ter saudades de tudo. E, quando tomei a decisão, já sabia que ia ter saudades de tudo isto. Porque é impossível esquecer tudo isto e não sentir saudades. Mas ao fim e ao cabo, tal como já disse, tinha de procurar outro desafio e ir em busca de algo novo na minha carreira.»

A grandeza do Benfica

«Lembro-me de quando cheguei aqui, não sabia da grandeza do clube... Lembro-me que, na primeira vez que fui ao Marquês [de Pombal], apercebi-me de tudo o que envolvia o clube. E, com o passar dos anos, apercebi-me que não pára de crescer, e que cada vez é maior. E isso é incrível, porque não é fácil gerir um clube com esta dimensão e que cresce dia após dia. É incrível.»

A afirmação

«Quando se chega a um clube há sempre um período de adaptação. Vens de outro país, és jovem e a equipa está a jogar bem. Sabia que ia ser difícil e que, pouco a pouco, teria de me ir adaptando ao resto da equipa nos treinos. E na realidade, por acaso, vivi, por assim dizer, os melhores momentos da temporada. Foram o último jogo da Liga para vencer o título e a final da Taça [da Liga]. E isso é incrível, porque acaba por parecer que se jogou o ano todo, e, quando chegam os momentos de felicidade, está-se em campo e vive-se de outra forma. Foi incrível, porque eu era apenas um miúdo e, ao viver tudo isso, fiquei entusiasmado.»

Chegar, ver e vencer

«Não é fácil, porque era um miúdo. Mas sempre tive muita personalidade, e, quando estava em campo, nesses momentos, nesses primeiros jogos, que eram os últimos da temporada, estava tranquilo. Apesar de tudo o que significa jogar num estádio como este. Mas esses sentimentos também ficam connosco o resto dos anos. Certamente que recordarei sempre. Não teria feito nada de diferente, penso que tudo o que fiz foi porque o sentia a cada momento. Dei tudo pelo clube, e o clube deu-me tudo a mim. Sou uma pessoa com personalidade. Quando tive de dar a cara, nas derrotas, apesar de não ser capitão, fi-lo, porque penso que os adeptos o mereciam, que alguém desse a cara. E quando tive de me zangar, zanguei-me, e quando tive de liderar a equipa, também o fiz. Penso que sou um jogador com personalidade, com coisas boas e más, mas penso que, da minha passagem pelo Benfica, fico com o positivo e tudo o que de bonito fiz.»

Um troféu especial

«Este último acaba por ser o mais especial, pela forma como foi, depois de três anos difíceis, sem títulos, sendo o meu último ano, o 38 que tanto se pedia... Para mim, o 38 é o mais especial. Mas, naturalmente, cada um teve os seus momentos incríveis, incluindo o primeiro ano em que cheguei, em que joguei pouco. Foi muito especial viver tudo isto pela primeira vez, mas cada um tem as suas emoções e recordações.»

O jogo dos jogos

«Em primeiro lugar, este último por todas as razões, como ocorreu, foi incrível. Estádio cheio, último jogo, o resultado que nos dava o título, para mim foi o jogo mais incrível que tive. E depois também o primeiro título em que joguei, pois era apenas um miúdo. Quase não tinha jogado aqui e calhou-me jogar nesse último jogo da Liga para vencer o título [2015/16]. Esse jogo foi incrível, também, pela forma como aconteceu. Quando entrámos em campo e sabendo que estávamos a jogar pelo título, com os adeptos a apoiar, quando marcámos o primeiro golo, sabíamos que dificilmente nos ia escapar o objetivo.»