Vítor Matos assume desejo de ser técnico principal depois de uma experiência menos feliz na Áustria
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Entrevista a Vítor Matos «Quero que os adeptos queiram ver sempre o meu próximo jogo»

NACIONAL19.02.202510:00

Ex-adjunto de Jürgen Klopp, de 36 anos, assume a A BOLA que é o momento de ser treinador principal

Após muitos anos em Liverpool e uma experiência menos feliz em Salzburgo ainda como adjunto, Vítor Matos apresenta-se como um treinador de ataque e de ideias claras, e propõe-se a criar uma ligação emocional com os adeptos e os clubes que acabar por treinar.

A BOLA Depois da Áustria, tens uma encruzilhada à frente, não é? Qual é a resposta aos teus desejos para o futuro? Ou está tudo claro na tua cabeça?

VÍTOR MATOS Encruzilhada não. Sinto-me preparado e quero ser treinador principal. Acima de tudo, estou muito motivado e com muita ambição para o que é a função de treinador. Foi um processo natural, é algo que fui construindo ao longo do tempo, através de vivências, experiências e também me conhecendo a mim próprio. E isso faz-me chegar a este momento e estar confortável com o que é a função de treinador. Portanto, estou muito determinado e com muita ambição nesse projeto. Agora, é fazer com que as coisas resultem, não é? E, para que isso aconteça, também acho importante sentir uma conexão com o clube. Qual o clube, não sei, mas sentir esta conexão é muito importante.

Sendo que no Liverpool, não queria catalogar-te assim, mas eras mais ou menos o número 3. Estava o Pep [Lijnders] com uma ligação mais direta ao Jürgen [Klopp]. Ele é que era o número 2, se o quisermos chamar assim. No Salzburgo, foste tu o número 2 do Pep, mas foi um período curto. Isso, de certa forma, não te faz ponderar a decisão?

Não, porque não se limita só a isso, não é?

É muito claro que quero muito atacar. Quero muito ter a iniciativa e, para isso, tens de ter a bola. E para teres a bola, tens de ter a bola com qualidade.

Também porque não sei que tipo de relação vocês tinham em termos de tomada de decisão...

Tanto o Jürgen como o Pep são pessoas completamente abertas sobretudo àquilo que é decisão. Ou seja, é uma decisão conjunta. Não só para mim, mas para o resto do staff também. Agora, quando falo de vivências e experiências, não se circunscreve só nisso, não é? É algo que desde muito cedo quis ser, desde cedo tive a paixão de ser treinador. E fui, aos poucos, alimentando-a. Em diversas funções, em diversos clubes. Também em diversos contextos em termos de país. Fui aos poucos retirando pequenas coisas. Também olhava como as decisões das pessoas com quem trabalhava eram tomadas. Obviamente, com uma grande influência naquilo que foi e é o Jürgen. Também acho que não seria muito inteligente da minha parte se não o fizesse. Mas fui aprendendo, fui estando muito consciente disso. E, aos poucos, fui criando uma ideia clara daquilo que quero ser enquanto treinador. Não pode haver copy-paste. Tens de criar a tua própria personalidade e a tua própria identidade enquanto treinador. É isso que me leva a estar aqui hoje sentado a falar contigo.

Que ideia clara é essa? Consegues transportar para as pessoas que nos estão a ler?

Sim, a primeira ideia é que, acima de tudo, quero criar aquela sensação de que tu quereres ver sempre o próximo jogo. Aquela sensação de que quando sais do estádio estás já a pensar quando é o próximo jogo. E essa sensação, esse sentimento...

Uma ligação emocional, não é?

Exatamente, essa ligação emocional entre o clube, o treinador, os adeptos, a estrutura de todo o clube! Isso, para mim, é muito importante. Esta alegria que tu consegues transmitir... Porque eu costumo dizer que só a possibilidade de tu criares numa pessoa a frase «eu ganhei» é algo único do futebol. E, muitas vezes, não é possível a muitas pessoas dizer isso durante a vida, sobretudo na sociedade em que vivemos. O poder construir esse momento e o poder ajudar nesse momento é algo fantástico do futebol, que consegue criar este tipo de emoções. Agora, se quisermos falar em termos táticos. Ou se quisermos falar em termos mais...

Vítor Matos sente que é o momento para ser responsável por uma equipa e lembra vivências e a participação na tomada de decisão ao lado de Klopp e Lijnders
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Isso já está definido na tua cabeça, não é? Mais ou menos a estratégia...

Sim, não faria sentido se não estivesse. Agora, o futebol tem muito não só de tático, mas também de intuição. É muito claro que quero muito atacar. Quero muito ter a iniciativa e, para isso, tens de ter a bola. E para teres a bola, tens de ter a bola com qualidade. Tudo isso liga-se a esta ideia, não é? A de que forma é que queremos ter a bola. De que forma queremos construir passo a passo o ataque. De que forma queremos atrair a pressão do adversário. De que forma queremos provocar a pressão do adversário e utilizar essa pressão para iniciar o nosso ataque. De que forma queremos mexer o adversário. De que forma queremos criar oportunidades. De que forma, com estabilidade, conseguimos depois acelerar e criar situações de finalização diversas. E, tudo isso, dependendo de como o adversário também defende. A forma de nós conseguirmos ter a iniciativa está muito também ligado àquilo que é a tua forma de defender. E a tua forma de defender, a forma como eu a vejo, é com pressão. Esta possibilidade de ganharmos a bola o mais à frente possível porque nos vai permitir também ter a bola o mais à frente possível e ter mais tempo a bola. Independentemente de a termos com maior ou menor qualidade. E claro que aqui tenho muito daquilo que é...

Mas aí serás mais Guardiola ou mais Klopp? Ou seja, será mais para atacar logo diretamente a baliza ou é para guardar a bola e tentar atacar de forma mais segura?

Acima de tudo, quero que seja mais Vitor Matos.

Era uma provocação...

Sim, sim, sim. É óbvio que muito da minha vivência com o Jürgen está aqui, não é? Porque esta ideia da pressão após a perda de bola ou, se quisermos em inglês, do counter-pressing, eu vivi com ela. Vivi os bons momentos, os momentos menos bons, mas vivi o que isso te consegue dar em termos de fluidez ao jogo. De que forma é que isso, como o Jürgen diz, se torna o teu melhor jogador...

O teu número 10...

O teu número 10. Isso é, sem dúvida, muito importante. Revejo-me, obviamente, nesse tipo de impulso. Porque é esse impulso que também se treina e te consegue dar estabilidade e fluidez para os outros momentos. E, como disse, se queres dominar, se queres ter dominância, se queres atacar e se queres ter a bola, é muito importante também isso, como é óbvio.

Tenho uma vontade enorme de criar jogos memoráveis! E se os crias constantemente tens sucesso.

Desculpa-me voltar um bocadinho ao Klopp, mas o Klopp teve dois casamentos perfeitos. O primeiro não acabou muito bem, mas Dortmund e Liverpool, acho que encaixam...

Três casamentos. O Mainz, não é?

Sim, mas no Mainz ele já lá jogava antes...

Com todo o respeito pela esposa...

Sim, com todo o respeito pela esposa (risos) Pronto, ok. Quatro, então. Quatro casamentos perfeitos. Dortmund e Liverpool e a esposa, sobretudo. Mas achas que há um clube perfeito para ti? Falo do Klopp por causa do sentimento e estes são clubes muito emocionais. E tu falaste também um bocadinho de emoção...

Sim, acho que é um bocadinho isso, não é? Essa conexão deve existir. Entre mim, o clube e as pessoas do clube. Era um pouco o que dizia. Fui tendo já algumas abordagens. Algumas mais no passado, outras mais recentes. Mas nessas do passado senti que me queria preparar melhor. Senti que era necessário preparar-me. Que era necessário continuar a crescer. E isso leva a que... A que sinta que agora é esse momento. E, claro, quando tens essa conexão, é mais fácil conseguires fazer com que as coisas resultem. Agora, a minha determinação com o que quero é muito clara. E isso depois, obviamente, irá criar uma conexão com aquilo que são também as ambições e as expectativas dos clubes.

Esta ideia da pressão após a perda de bola ou, se quisermos em inglês, do counter-pressing, eu vivi com ela. Vivi os bons momentos, os momentos menos bons, mas vivi o que isso te consegue dar em termos de fluidez ao jogo.

Mas não tens um clube em que aches que poderias criar, talvez, a tempestade perfeita?

Não, tenho claro aquilo que quero enquanto treinador. E, depois, se isso for suficiente para as pessoas apostarem, para terem a coragem de apostar num treinador jovem, fantástico. Acredito muito que é sempre possível criarmos momentos especiais. E isso também é parte daquilo que quero enquanto treinador. Esta vontade de criar jogos memoráveis... E quando tu crias jogos memoráveis consistentemente, tens sucesso. É esse sentimento que quero e é esse sentimento que quero passar. Portanto, essa conexão emocional, a meu ver, tem de acontecer, mas de parte a parte, como um casamento, como é óbvio.

Certo. E isso implica que comeces um projeto de início e não pegues numa equipa a meio da época...

Sim, permite-nos a todos conhecermo-nos melhor. Acredito muito que o ponto de partida tem de ser o ser humano que está à tua frente. Neste caso, o jogador que está à tua frente enquanto ser humano. E isso precisa de tempo, carece de tempo. É óbvio que quando começas um projeto no início de uma época, isso te permite conhecer, te permite construir as coisas, te permite criar um conjunto de...

Ligações...

Sim, e um sentimento comum que vai ser importante para aquilo que é o início da época, que é o futuro. Agora, com a volatilidade que vivemos no futebol, e como eu olho para o futebol atual, é muito difícil conseguir dizer-te qual é o momento perfeito. Ou qual o timing perfeito para entrar num clube. Mais do que esse timing vai ser importante esta conexão. Porque podes criar impacto a entrar a meio da época, podes criar impacto a entrar mais no fim, ou seja, após o início da época também. No entanto, se me perguntares, é óbvio que quando começas no início de uma pré-época, ou no início de uma época, como quisermos chamar, tens mais tempo para, sobretudo, construir, criar um sentimento e uma ideia comuns e, a partir daí, começares a crescer enquanto clube e ideia.

E há um campeonato perfeito para a tua ideia?

Não, não digo que haja um campeonato perfeito para a minha ideia. A minha ideia é partir do contexto. Nós temos de partir do contexto. Isso foi a sensibilidade que ganhei por trabalhar em diferentes países. E é diferente estares em Portugal, na Áustria, em Inglaterra ou na China. Esse partir do contexto é aquilo que me vai permitir depois construir também a minha ideia. Portanto, se há uma liga perfeita, acho que não. É óbvio que se me perguntares se gostava de um dia chegar à Premier League, obviamente que sim. Isso é uma ambição, pelo menos minha. É óbvio que é uma ambição, mas também sei que quero ter o meu tempo para poder chegar a esse nível outra vez. Quero ter o meu tempo e fazer as coisas com calma e com sustentabilidade, porque isso é mais importante.