Uma ‘nova’ SAD!...
O que os dirigentes dos clubes não querem não é a perda da maioria ou de parte do capital, mas sim a perda de poder na gestão da sociedade
EM teoria, as sociedades anónimas desportivas nasceram com a Lei de Bases 1/90, de 13 de Janeiro, que, no número dois do artigo 20.º, anunciava que «legislação especial definirá as condições em que os clubes desportivos, sem quebra da sua natureza e estatuto jurídico, titulam e promovem a constituição de sociedades com fins desportivos, para o efeito de proverem a necessidades específicas da organização e do funcionamento de sectores da respectiva actividade desportiva».
Mais de cinco anos depois surgiu a tal legislação especial - Decreto-Lei 146/95, de 21 de Junho - que veio estabelecer o regime jurídico das sociedades desportivas, mas em termos considerados inadequados, na medida em que não permitia às sociedades desportivas a distribuição de lucros, retirando-lhes, desta forma, um dos principais, senão mesmo o principal, atractivo para a sua constituição.
E é por este motivo que eu disse que só teoricamente elas nasceram em 1990, pois ao abrigo do Decreto-Lei 146/95 não foi constituída nenhuma sociedade desportiva. Na prática, as sociedades anónimas desportivas só se constituíram após a entrada em vigor do Decreto-Lei 67/97, de 3 de Abril.
E vale a pena meditar sobre a razão desta alteração: a não captação de investimento externo, nacional ou estrangeiro.
Contudo, os clubes portugueses continuam com muita relutância em tentar aceder ao investimento externo e quase consideram criminosa a venda de acções da sociedade, mesmo que isso não implique a perda da maioria do capital. Alguns nem querem debater o tema, designadamente, com os associados dos clubes, quando, na realidade, esse debate é essencial para o futuro dos clubes e do próprio futebol português.
Sei que vou chocar muita gente coma minha visão do assunto, que não é de agora, mas de há mais de dez anos: o que os dirigentes dos clubes não querem não é a perda da maioria ou de parte do capital, mas sim a perda de poder que tal representa na gestão da sociedade, ou seja, não querem é elementos externos, representantes de outros acionistas, a controlar a gestão. Pelo contrário, numa atitude demagógica e hipócrita metem medo aos associados, dando maus exemplos e omitindo os bons, só para deitar poeira para os olhos de quem, por inocência ou ignorância, pensa que o investimento externo retira alma ao clube e aos seus adeptos.
Só pode pensar isso quem nunca teve o mais pequeno contacto com o futebol inglês, onde, por mais árabes, tailandeses, russos ou chineses que sejam donos dos clubes, a paixão dos adeptos não deixa de crescer, dando as boas vindas a esse capital externo, porque percebem que sem ele não há competividade suficiente. Basta recordar o facto recente do júbilo dos adeptos do Newcastle com a compra do clube por uma entidade estrangeira.
Os clubes portugueses não querem debater o problema, mas não deixam de se queixar da necessidade de vender os melhores jogadores, e mesmo os apenas bons jogadores, para equilibrar os orçamentos, mesmo que as comissões que pagam sejam manifestamente desequilibradas.
Ora, não deixo de me interrogar se este será o objectivo dos clubes: vender jogadores para sobreviver ou, na melhor das hipóteses, para ser grande em Portugal. O que os outros pensam não me tira o sono. No que respeita ao meu, sei que foi desígnio dos seus fundadores que o Sporting fosse grande, entre os maiores da Europa.
Nas restantes modalidades já mostrámos que estamos à altura desse desígnio. No futebol, porém, temos que ter essa ambição, mas, para isso, quer se queira ou não, há que ser realista: para competir na Europa é preciso dinheiro e não chega, antes pelo contrário, vender jogadores para ter essa competividade.
Presidida por Frederico Varandas, «a SAD do Sporting Clube de Portugal parece que entrou no rumo certo na política desportiva»
A SAD do Sporting Clube de Portugal parece que entrou no rumo certo na política desportiva, mais depressa do que era admissível no início dos anos 20, tendo conseguido, na época de 2020/2021, diminuir, para não dizer, tapar, o fosso que o separava dos seus rivais. E ao manter a política desportiva na presente época mostra que o quer tapar, em Portugal, de forma duradoura.
Mas para manter esta política desportiva com sucesso efectivo é necessário dinheiro e mais dinheiro ainda para se afirmar na Europa entre os maiores e ser um deles. Não tenhamos ilusões de que nos podemos manter a um determinado nível, e muito menos elevá-lo, sem uma política económica e financeira sólida que possa sustentar os activos que nos permitam um sucesso desportivo cada vez maior e mais alargado no espaço europeu.
No momento actual, as acções da categoria A, ou seja, as acções do Sporting Clube de Portugal, representam 26% do capital social da SAD e as da SGPS - detida quase a 100 por cento pelo Sporting Clube de Portugal - cerca de 37%, o que significa que, directa e indirectamente, o Sporting tem uma participação no capital social de cerca de 65%. Serão os outros 35% de algum investidor que traga capital fresco para sustentar a política desportiva?
Infelizmente, a resposta é não, porque, para além da participação de pouco mais de 3% da Olivedesportos, a participação mais relevante é a da Holdimo com cerca de 30%, isto é, superior à percentagem das acções da categoria A.
Mas então o grande investidor é a Holdimo? Parece-me óbvia a resposta quando sabemos que tal participação é resultado de um empréstimo para suprir défices de tesouraria que foi pago com aquele volume de acções.
E não vou falar das VMOC cuja resolução parece, segundo creio, iminente!... Que seja bem aproveitada é o que desejo, porque passa por aí também uma nova SAD, ou uma SAD nova, na sua mentalidade.
Eu não tenho o entendimento que só a via que preconizo é que está certa. Nada disso. Mas acho que eu e muitos como eu têm o direito a duas coisas simples: que nos expliquem quais os inconvenientes e os receios que nos impedem de alienar capital, independentemente da percentagem a alienar e, a não ser assim, quais as vias alternativas. Só assim o debate poderá ser sério e frutuoso, e não deverá ser inquinado, pela existência de investidores que não sérios nesta área, como não o são em outras áreas da sociedade. Estamos a discutir princípios e ideias. Os investidores em concreto serão outro ponto da discussão, necessariamente posterior.
Para já, o que precisamos é de uma nova mentalidade nos dirigentes, para que possamos ter novas sociedades anónimas desportivas, onde imperem os superiores interesses dos clubes fundadores. No Sporting Clube de Portugal, para uma nova SAD, basta apenas que repristine a mentalidade e o desígnio do Visconde Alvalade!...
RUI OLIVEIRA COSTA
CONHECI o Oliveira Costa não no Sporting, mas na criação da UGT, onde ele foi um dos protagonistas e eu um simples auxiliar que, ainda assim, acabou por ser membro suplente do Conselho de Jurisdição da UGT, o que muito me orgulha. Foi o tempo do Oliveira Costa e do Dias Ferreira.
Muitos anos mais tarde voltámos a estar juntos: no Sporting, o clube da nossa paixão. E agora o Rui e o José Eugénio.
Concordámos e discordámos, falámos e discutimos, na política, como no futebol, mas sempre com o respeito próprio de quem respeita a democracia e a liberdade.
Há muito que não estava com ele pessoalmente. Apenas o vi na televisão por ocasião da vitória no campeonato. Na televisão em que à sua maneira defendeu o Sporting, como eu o procurei defender à minha.
Voltaremos a encontrar-nos onde não há televisão, mas nós continuaremos a ser o Rui e o José Eugénio!