Uma certa forma de estar e de parecer

OPINIÃO07.12.202003:00

Calimero é um personagem de uma animação ítalo-japonesa criada em 1963 por Nino Pagot, Toni Pagot e Ignazio Colnaghi. O protagonista é um meigo, mas infeliz pintainho, que usa metade da sua casca de ovo na cabeça. As histórias onde entra terminam sempre mal para ele e Calimero acaba a queixar-se: «Isto é uma injustiça, uma injustiça...»


O futebol português está povoado de Calimeros seletivos, que nunca perdem qualquer oportunidade de se queixarem das injustiças do mundo, sempre que se sentem prejudicados, mas que são lestos a olvidar os benefícios que recolhem. Esta prática não é de hoje nem de ontem e quem se der ao trabalho de alguma pesquisa no tempo concluirá, facilmente, que faz parte da cultura do nosso futebol, que sempre preferiu as desculpas viradas para o alheio do que as culpas próprias, fomentadoras da autocrítica que redunda em regeneração e maior qualificação. No fim do dia, trata-se apenas de um caso de preguiça, já que dá menos trabalho imputar as causas do insucesso a terceiros do que ir à procura das insuficiências próprias que, realmente, na maior parte dos casos, explicam os desaires.

Esta forma de estar no futebol nacional toca a todos, os grandes porque os concorrentes engendram manigâncias que lhes tramam a vida, os pequenos porque ninguém lhes vale e os que não são nem grandes nem pequenos porque são geralmente apanhados no fogo cruzado de guerras que não são suas.

Ao fim de algumas décadas a ver o mesmo filme, onde apenas se alteram os protagonistas, nunca o enredo, o sentimento de cansaço é tremendo. E a paciência cada vez menor.
Infelizmente, a única conclusão a que podemos chegar é de que quem continua a perpetuar esta forma menor de estar na vida acredita piamente que assim defende melhor os interesses do seu clube, perante a complacência acéfala de adeptos que numa semana desvalorizam o benefício arbitral recebido e na semana seguinte são os primeiros a participar na ofensiva contra  os roubos de que alegadamente são vítimas.

Francamente, já não há pachorra para aprendizes de feiticeiro verdes, vermelhos ou azuis, Calimeros de trazer por casa, que mais não fazem do que procurar, pela pressão externa, angariar benefícios internos.