Querem ver que eu percebo imenso de futebol?
1 Com aquele remate absolutamente fantástico nos últimos segundos do jogo, Otávio estragou a fotocópia perfeita do jogo de Moscovo, que ia ser tirada no Dragão, frente ao Lokomotiv. De facto, tirando esse golo a mais, foi quase tudo igual: os mesmos marcadores dos três primeiros golos portistas, e o FC Porto sempre por cima no resultado, graças a uma tremenda eficácia ofensiva compensando uma inabitual atrapalhação defensiva (Alex Telles, por exemplo, abrindo uma escancarada avenida, durante toda a primeira parte). O jogo 200 do FC Porto na Champions (fantástico registo, mais do que o somatório de todas as equipas portuguesas juntas!), não podia ter começado melhor, com um golo logo ao primeiro minuto. Mas a sorte é muito merecida por um homem que merece todos os elogios: Sérgio Conceição, que, mais uma vez, soube montar a equipa adequada para o jogo e mexer nela com critério e na altura certa. A ele se deve, entre outras coisas, a incrível ressurreição de Óliver Torres, de novo o melhor em campo, um feito em que só o treinador portista terá acreditado.
2 Para trás, tinham ficado, ao longo da semana, duas saborosas vitórias do FC Porto: no Dragão e para a malfadada Taça da Liga, frente ao Varzim, e no Funchal, para o campeonato, no sempre ameaçador desafio dos Barreiros. Em ambos os jogos, as coisas só se resolveram quando Sérgio Conceição foi ao banco e lançou mão de dois trunfos que desbloquearam o jogo: Corona, contra o Varzim, e Otávio, contra o Marítimo. Por coincidência, certamente, dois jogadores que eu vivo a reclamar que merecem mais tempo e mais importância na equipa: querem ver que eu até percebo de futebol? Uma fantástica jogada individual de Corona, libertando-se de três adversários dentro de uma cabina telefónica e servindo um cruzamento de morte para André Pereira, desbloqueou o jogo frente ao Varzim. E uma soberba jogada colectiva, terminada de forma superior por Otávio (que ainda assistiria para o segundo golo), quebraria de vez a resistência de um Marítimo que montara uma estratégia ultra-defensiva (uma só defesa de Casillas em todo o jogo!) e que o seu treinador, por desespero, cegueira ou para se tentar enganar a si mesmo, achou merecedora de um empate. E assim, já lá vão seis vitórias consecutivas, desde a mal digerida derrota na Luz.
Foram, como disse, duas saborosas vitórias, embora a da Taça da Liga, não me faça acalentar muitas esperanças, de tal forma essa competição me parece definitivamente amaldiçoada para os portistas. Já os três pontos ganhos nos Barreiros, conjugados com a sensacional vitória do Moreirense na Luz, permitiram cavar um fosso de 4 pontos de vantagem sobre o Benfica - verdadeiramente impensável quando, ainda há três jornadas atrás fomos perder à Luz, num jogo que, hoje, mais ainda, constatamos que foi mal perdido, por um défice de audácia, que o actual momento do adversário não justificava. E por pouco, nesta nona jornada não tínhamos também ganho pontos ao Braga e ao Sporting - a quem só um generoso penalty, seguido de uma daquelas expulsões que fica estritamente entre o árbitro e os seus ouvidos, permitiram ultrapassar um obstáculo que, em jogo jogado, nunca justificou vencer.
Para terminar este ciclo bem apertado, temos sábado (e porque não domingo?) o jogo pelo primeiro lugar contra o Braga, no Dragão. Um FC Porto saturado de jogos de exigência total e inevitavelmente desgastado pelo jogo de exigência física tremenda frente ao Lokomotiv, face a um Sporting de Braga repousadíssimo. Ultrapassar mais esse obstáculo será uma imensa proeza, digna de um grupo de grandes profissionais.
3 Um pequeno-grande pormenor, de que me tenho ocupado bastas vezes - tantas, quantas são as vezes que o FC Porto desperdiça aquilo que no futebol corresponde quase a um xeque-mate: as grandes penalidades. No ano passado, caímos assim na Taça da Liga e na Taça de Portugal, sacrificando no desempate das grandes penalidades o esforço feito durante jogos em que merecíamos ter vencido. No ano passado, o FC Porto tinha dois, e apenas dois marcadores eficazes de grandes penalidades: Marcano e Alex Telles. Já aqui expliquei o que entendo por uma grande penalidade eficaz ou bem marcada: é aquela que é batida pelo chão e em que o guarda-redes é enganado e se lança para o lado contrário da bola. Esta, nem precisa de ir muito colocada nem em força, basta que vá rasteira e para o lado oposto do balanço do guarda-redes, e não tem defesa. É uma questão de técnica, calma e inteligência: nada mais do que isso. Com a saída de Marcano, e não tendo visto mais experiências, sei que resta, pelo menos, Alex Telles para o fazer. Por isso, quando em Moscovo, vi Marega partir para marcar o penalty contra o Lokomotiv, tremi de medo - eu e creio que todos os portistas. Bem, ele lá marcou golo, batendo com o pé direito, em força e para o lado mais óbvio - o lado direito do guarda-redes, sem sequer se preocupar em olhar para ver para que lado este se inclinava. Valeu que o a bola saiu muito colocada, mas, mesmo assim, foi por um palmo que o guarda-redes russo não chegou lá. «Muito bem batido!», comentou o relator da Sport TV. Não, muito mal batido, comentei eu com os meus botões. E a prova veio logo no jogo do Funchal, quando Marega foi chamado a cobrar novo penalty. Fê-lo exactamente da mesma forma, só que desta vez com menos jeito e menos sorte, pois a bola subiu e saiu menos colocada, permitindo uma defesa que só aparentemente foi difícil - sobretudo, se o guarda-redes adversário, como lhe competia, viu o jogo de Moscovo. Certas coisas parecem-me tão evidentes que eu chego a pensar que até percebo imenso de futebol...
4 A semana passada, escrevi aqui sobre três treinadores portugueses que me pareciam em perigo iminente de receberem guia de marcha: José Peseiro, Rui Vitória e José Mourinho. No dia seguinte, o Sporting perdeu com o Estoril para a Taça da Liga e Peseiro foi despedido, nem 24 horas depois. 72 horas depois, aconteceu a lição de futebol do Moreirense na Luz e, apesar de todos os esforços dos jornalistas da BTV para tudo ocultarem, foram visíveis os lenços brancos e a contestação a Rui Vitória, agora obrigado a ganhar hoje ao Ajax e domingo ao Tondela. Quanto a Mourinho, no imediato, salvou-se com uma milagrosa vitória sobre o modesto Bournemouth e está seguro pela tradição inglesa avessa às chicotadas psicológicas e pelos milhões que o seu despedimento custaria aos donos do United. Mas não é preciso ser bruxo para adivinhar que, a médio prazo, não vai chegar passar a vida a queixar-se tudo e de todos para se manter no lugar. Querem ver que eu até percebo de futebol?
Voltando a Rui Vitória, tem sido muito curioso assistir às várias manobras em curso à volta da sua manutenção ou saída, e todas com origem no Benfica. Como, por exemplo, a revelação daquele telefonema entre Vieira e um agente desportivo, tratando ambos de o despachar para Inglaterra, e cuja revelação, o tal agente quis atribuir, de forma patética, ao FC Porto - como se fosse o FC Porto que tivesse algum interesse na saída de Rui Vitória do Benfica. Tem pai que é cego! E tem pai que nos toma por parvos!
5 O hóquei em patins joga-se só com cinco jogadores de cada lado. Mas parece que o polvo dos oito braços também já lá chegou. E, entre outras coisas, consegue fazer com que uma equipe passe a maior parte do tempo a jogar contra o ‘Glorioso’ apenas com quatro jogadores em campo.