Nem bonito nem bem

OPINIÃO17.11.202106:00

A jogar com este espírito de ‘equipa pequena’, curta de mando e de ambição, Portugal estará sempre à mercê de um adversário mais autoritário e corajoso

ASeleção abordou os minutos finais com a Sérvia a defender com oito (além de Rui Patrício, dois laterais, três centrais e dois médios defensivos!) numa tentativa desesperada de assegurar o pontinho que Santos procurava garantir desde o início e que a cabeça de Aleksandar Mitrovic, de forma justa, lhe negou no último minuto. Justa porque a Sérvia foi sempre muito melhor que Portugal - na realidade, a única equipa assertiva, mandona e corajosa que pisou o relvado da Luz. O pontinho que chegava em Dublin e que chegava em Lisboa trouxe ao de cima o pior de Fernando Santos, que se comportou mais uma vez como treinador de equipa pequena: sempre mais preocupado em tentar neutralizar os pontos fortes do adversário (e atenção que este não se chamava Alemanha) do que tentar impor os seus próprios argumentos, que, no caso da Seleção Portuguesa, não são tão poucos assim.
A sorte não dura para sempre e cremos que o miserável desempenho com a Sérvia, independentemente do que vier a acontecer no play-off de março, marca o fim da era Santos, marcada pela conquista fantástica e surpreendente do Euro-2016. Desde então, sem esquecer o meritório triunfo na Liga das Nações, a ideia que fica é que o futebol da Seleção não evoluiu como se esperava - bem pelo contrário - apesar de o campo de recrutamento de Santos ser cada vez mais vasto e rico. Os fracos desempenhos no Mundial de 2018 e no Europeu de 2021, onde Portugal jogou como equipa pequena e não como orgulhoso e confiante campeão da Europa, só vieram confirmar a singularidade - e irrepetibilidade - da campanha de 2016. À estagnação seguiu-se algo pior: a insistência numa ideia de jogo condenada ao fracasso, dada a inadequação ao perfil (e rotina competitiva) da esmagadora maioria dos jogadores da Seleção, habituados a jogar em grandes equipas europeias de futebol impositivo e ambicioso. Quando penso no futebol que eles jogam na Premier inglesa e aquilo a que estão habituados, não consigo deixar de imaginar o que pensarão do esquema cauteloso e trancado da Seleção. Para vos dar uma ideia: os empregados da loja do sr. Klopp vendem canhões, bombardas, catapultas e cilindros. Na loja do nosso engenheiro vendem cadeados, trincos, ferrolhos e travões.
Portugal não joga bonito e agora nem sequer «bem». Os desempenhos medíocres no grupo de qualificação para o Catar, quase sempre maquilhados pelos golos de Ronaldo, confirmam o processo degenerativo que Santos não soube travar e que a Sérvia expôs com naturalidade.   
Percebe-se, aqui e ali, que o selecionador perdeu a confiança dos adeptos, (pelo que vejo e leio) da crítica, e tenho muitas dúvidas de que os jogadores da Seleção se revejam nesta maneira - para mim pequena - de pensar o futebol. Falta saber a opinião de Fernando Gomes. No que toda a gente parece concordar é na necessidade de uma mudança e rápida: assim não vamos a lado nenhum. Qualquer Sérvia desta vida pode dar cabo de nós em março. O engenheiro nunca deixará de ser o homem dos títulos (foi com ele que a Seleção passou das vitórias morais às reais), mas há que reconhecer, sem dramas, que o perfil cauteloso e excessivamente conservador de Fernando Santos  já não serve o perfil e potencial de um grupo a quem toda a gente reconhece capacidade para muito, muito mais. A jogar com este espírito de equipa pequena, curta de mando e de ambição, a Seleção não mete medo a ninguém e estará sempre à mercê de um adversário mais autoritário e corajoso. A era Santos acabou e não será a presença no Mundial (quase uma obrigação, não era?) que maquilhará as deceções destes últimos anos.

PS - Sigo a Seleção desde 1972. Vi jogos e campanhas de 15 selecionadores: José Augusto, José Maria Pedroto, Juca (três passagens), Mário Wilson, Otto Glória, Fernando Cabrita, José Torres, Ruy Seabra, Artur Jorge (duas), Carlos Queiroz (duas), António Oliveira (duas), Humberto Coelho, Luiz Felipe Scolari, Paulo Bento e Fernando Santos. Destes todos, só dois conseguiram levar Portugal a uma final: Scolari e Santos. E só um ganhou títulos - duas vezes. Grato para sempre, engenheiro. 
 

Fernando Santos terá perdido a empatia com os adeptos portugueses e viu lenços brancos no final do encontro com a Sérvia  


TRÊS PORTA-AVIÕES À VISTA 

COM todo o respeito pela Taça de Portugal, a competição mais aberta e democrática do futebol português, os jogos dos três grandes (Sporting-Varzim, amanhã; Benfica-Paços de Ferreira, sexta; FC Porto-Feirense, sábado) servem de aperitivo para o esplêndido cartaz Champions da próxima semana - Barcelona-Benfica (terça-feira), Sporting-Dortmund e Liverpool-FC Porto (quarta). Três duelos decisivos para cinco envolvidos (só o Liverpool está apurado), três pesos pesados do futebol europeu no caminho dos três grandes domésticos. O FC Porto terá a missão mais complicada em Anfield (Klopp é capaz de rodar alguns jogadores) contra um verdugo que já o goleou várias vezes, mas também é, entre os nossos, o melhor preparado para a exigência desta prova. Quem viu os desempenhos portistas em Madrid e Milão tem de encarar a deslocação a Inglaterra (onde o FCP nunca ganhou) com alguma esperança. O mesmo se diga do Benfica relativamente a Camp Nou, mas por razões que têm mais a ver com o momento do adversário. Em condições normais, o Barcelona seria hiperfavorito à vitória (e consequente qualificação). Mas este não é um Barça normal e custa-me a acreditar que o novo treinador, o carismático Xavi, tenha conseguido em semana e meia (são os mesmos jogadores…) transformar aquele onze errático e inseguro num bloco forte, confiante e competitivo. Jesus tem uma chance única de eliminar o colosso catalão na fase de grupos, o que não acontece desde 2000. Quanto ao Sporting, é, dos três, aquele que está mais perto da qualificação. Basta-lhe (entre aspas, claro) ganhar ao Dortmund por 2-0 para chegar automaticamente aos oitavos - seria uma proeza incrível depois daquele início (a vitória por um golo deixa  Amorim igualmente bem posicionado). Os alemães chegam a Lisboa sem Halaand e Hummels, mas não deixam de ser alemães. Os portugueses sabem muito bem o que isso significa.