Fórmula Mourinho
Não é por acaso que nas cinco finais europeias que o treinador português ganhou, chegou ao intervalo a vencer por 1-0
HAVERÁ quem tente apoucar a conquista de ontem de José Mourinho, mas o que a história do futebol irá dizer é que são poucos os treinadores que têm uma relação tão estreita com o verbo ganhar. Goste-se mais ou menos do estilo, os factos falam por si: nas cinco finais europeias que disputou, venceu-as todas (descontando as três Supertaças europeias em que participou e perdeu), ao serviço de quatro clubes de três países. Desta vez foi a Liga Conferência, a mais recente competição criada pela UEFA e terceira na hierarquia das provas europeias (com potencial para equivaler-se à antiga Taça das Taças), mas o suficiente para o português manter a aura de ganhador e tornar-se um ícone no país da bota - é bom recordar que a última conquista europeia de uma equipa italiana tinha sido com ele, quando venceu a Liga dos Campeões pelo Inter, em 2010, em Madrid.
Há uma máxima no futebol de que as finais são para ganhar. Perguntem aos milhares de adeptos da Roma que se deslocaram a Tirana ou aos milhares que estiveram no Olímpico se ficaram aborrecidos por terem assistido a períodos de sufoco criado pelo Feyenoord. Para eles, tal como para Mourinho, o importante era vencer e começar a criar uma cultura de vitória que praticamente não existia num clube que premeia a estética mas que passa os anos a ver os outros a celebrar no fim - a mesma Roma onde cintilou um dos jogadores mais carismáticos de sempre do futebol italiano mas que nada venceu a nível internacional (pelos giallorossi, bem entendido, pois que foi campeão do mundo em 2006).
José Mourinho festejou em Tirana
Dirão os mais puristas que foi uma final demasiado pragmática, com momentos de pouca dignidade de uma equipa que teoricamente seria superior e por consequência deveria ser dominadora. Com aquelas defesas e liderando uma linha a jogar em bloco baixo, Rui Patrício fez lembrar Paris em 2016, fechando a baliza com a mesma destreza que se fecha uma discussão: todos sabemos que só assim Portugal poderia ganhar um Europeu, só assim a Roma poderia acreditar que conquistaria uma competição europeia.
Há um pormenor comum nas cinco finais europeias que Mourinho ganhou: as suas equipas foram para o intervalo a vencer por 1-0. Foi assim pelo FC Porto, pelo Inter, pelo Manchester United e, ontem, pela Roma. Não será por acaso: independentemente do estilo, a fórmula do português sempre foi a de dominar primeiro e controlar depois, mesmo que sob formas diferentes de domínio e controlo. Mas os princípios estão lá. E o processo também.
Por culpa própria, Mourinho tem agregado uma onda de contestatários, mas são noites como a de ontem que lhe dão razão. E os comparativos também. Recordar, por exemplo, o que fez no Manchester United e o que fizeram os seus sucessores em contexto semelhante (plantel, concorrência, etc) ou como o Tottenham piorou com a sua saída é um atestado incontestável de competência do melhor treinador português de sempre. O problema reside, apenas, no facto de o setubalense precisar que o tempo lhe dê razão, quando o que mais precisa é provar que ele é a pessoa certa para o presente e que entre os defeitos e as virtudes a balança pende claramente para o lado bom. Talvez consiga ter esse estatuto na Roma, onde parece ter recuperado o papel de treinador-estrutura que sempre assumiu ser. Quem está acima dele percebeu isso, outros no passado e noutras latitudes não o perceberam. E deram-se mal.